Bancada feminina da Câmara espera que mobilização freie a votação
O desgaste que os protestos representam a Cunha podem ajudar a adiar a medida
Do lado de dentro, elas são apenas 52 a ocupar as 513 cadeiras da Câmara dos Deputados. Mas, do lado de fora, ganharam o reforço de milhares de mulheres, cujo objetivo é barrar nas ruas a aprovação do PL 5069, que dificultará o acesso ao aborto em casos de estupro. Para a enfraquecida bancada feminina da Câmara, a mobilização feminista, que volta a protestar nesta quinta-feira, é a última esperança para evitar que o projeto seja colocado em votação no Plenário, possibilidade que a articulação delas não conseguiu afastar até o momento.
A tarefa é difícil. O projeto, de autoria do presidente da Casa, Eduardo Cunha, tem o apoio e o lobby das bancadas religiosas do Congresso. Juntos são cerca de 170 os parlamentares evangélicos e os católicos ligados à Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). O número alto desses parlamentares, que também recebem apoio de outras bancadas conservadoras, como a da Bala (segurança pública), dá a Cunha a garantia de um apoio político importante neste momento em que ele está enfraquecido e ameaçado de perder o mandato por conta das denúncias de envolvimento com a corrupção da Petrobras.
Mas é justamente esse enfraquecimento de Cunha que pode trazer uma esperança para as mulheres em marcha, afirmam algumas parlamentares ouvidas pelo EL PAÍS. Como o foco dos protestos tem sido também o “Fora Cunha”, o presidente da Câmara pode querer evitar todo esse holofote, que aumentará quando o projeto de lei for colocado em votação.
O PL 5069, que tramitava desde 2013 e não teve nenhuma movimentação na Casa em 2014, foi apreciado de forma relâmpago neste ano na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. O projeto prevê penas para quem “vende ou entrega, ainda que de forma gratuita, substância ou objeto destinado a provocar o aborto”. Caso o responsável seja médico, farmacêutico ou enfermeiro, a pena aumenta. Ele ganhou um substitutivo do relator Evandro Gucci, ligado à CNBB, que incluiu ainda que o aborto só será autorizado quando o estupro for constatado em exame de corpo de delito e comunicado à autoridade policial. E mais: nenhum profissional de saúde poderá ser obrigado a aconselhar, receitar ou administrar procedimento ou medicamento que considere abortivo. Os religiosos acreditam que a pílula do dia seguinte se enquadra nesta categoria, o que dificultaria a sua distribuição caso a lei seja aprovada. A própria CNBB já deu declarações afirmando que o medicamento é abortivo e, por isso, “moralmente inaceitável".
Aprovado na comissão em 23 de outubro, o PL deverá ser votado pelos 513 parlamentares do Plenário, onde precisa de uma maioria simples (257) para ser aprovado. Eduardo Cunha é quem decide quando isso acontece porque como presidente da Câmara tem a prerrogativa de definir o que entra em votação e em qual momento. A avaliação da bancada feminina é que o projeto poderá ser colocado em votação já na semana que vem, caso as manifestações não mudem o cenário. “Cunha mexeu com um setor da sociedade que se mobilizou rapidamente, pois as mulheres serão diretamente afetadas por essa política retrógrada”, afirma a deputada Maria do Rosário (PT-RS).
“Os protestos estão conseguindo virar votos de deputados que naquele momento não entenderam a gravidade do que se estava discutindo”, afirma a deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ). A deputada Renata Abreu (PTN-SP), que votou a favor do projeto na comissão, é um exemplo: deu declarações na imprensa afirmando que considera mudar seu posicionamento. “Sinceramente, tenho repensando os pontos relativos ao B.O. [Boletim de Ocorrência] e ao corpo de delito. Inicialmente, pensava que a obrigatoriedade para a realização deles seria positiva para evitar a banalização do aborto. Mas, depois da votação, passei a conversar com mulheres que foram vítimas de estupro e percebi que a questão não é tão simples assim", afirmou ela ao portal iG.
As parlamentares preveem que, se ganhar a batalha neste momento, o avanço conservador contra os direitos femininos só irá aumentar rapidamente. O próximo projeto que deverá começar a andar com celeridade é o PL 478 de 2007, conhecido como Estatuto do Nascituro (termo que se refere ao "ser humano concebido, mas ainda não nascido"), que dificulta ainda mais o aborto legal. Em setembro, a tramitação até então morosa do projeto ganhou nova movimentação: o deputado evangélico Marcos Rogério (PDT-RO) conseguiu aprovar o pedido de audiência pública, a primeira etapa para iniciar a discussão. A data, entretanto, ainda não foi marcada.
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