Alckmin pede “rito especial” para licenciamento de obras da crise hídrica
Carta ao Conselho Estadual do Meio Ambiente solicita encurtar prazos para assegurar abastecimento
O governador Geraldo Alckmin, por meio do secretário de Recursos Hídricos Benedito Braga, solicitou através de uma carta ao Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema) a adoção de um "rito especial" para o licenciamento de cinco obras emergenciais prometidas para garantir o abastecimento público em São Paulo. Na prática, pretende-se abandonar o processo convencional de licenciamento ambiental de obras e se admite um cenário de crise hídrica, agravado pela falta de chuvas, que tem levado os dois maiores reservatórios de São Paulo à beira do colapso.
O documento está assinado no mesmo dia em que o Departamento Estadual de Águas e Energia (Daee) declarava no Diário Oficial a "criticidade" da bacia do Alto Tietê, simples burocracia, segundo o governador, mas onde já afirmava-se que “ações de caráter especial deverão ser adotadas visando a assegurar a disponibilidade hídrica”. A solicitação parece pretender efeitos retroativos pois inclui obras que já foram concluídas como a reversão do Rio Guaió, e outras já iniciadas – e questionadas pelo Ministério Público – como a interligação do Rio Grande para o Alto Tietê, projetos considerados essenciais pelo Governo Alckmin para o fornecimento de água potável para a população.
O conceito de "rito ambiental" não é novo no vocabulário da crise hídrica. O próprio Benedito Braga, em entrevista à Folha de S. Paulo em março, afirmou que "se fossem respeitados os ritos [ambientais], não teríamos condições de prover essa água à população em julho [de 2015]". O secretário disse também que, ainda conforme a lei, deveriam ser usados "atalhos" para cumprir as exigências de licenciamento e questionou: "o que vocês preferem: seguir o rito ambiental ou trazer água para a população?". O presidente da Sabesp Jerson Kelman também tem sido crítico, desde quando era diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) em 2005, com os "gargalos" do licenciamento ambiental brasileiro.
O Ministério Público de Contas Estadual, no entanto, vê os atalhos de uma maneira muito mais crítica. Os promotores investigam a concessão sem licitação de cerca de 400 milhões de reais em obras sob a justificativa de uma situação de emergência que ainda não foi declarada. Promotores do Grupo de Atuação Especial do Meio Ambiente (Gaema) e do Patrimônio Público e Social também apontaram irregularidades na principal obra emergencial para evitar o rodízio em São Paulo, a transposição do Rio Grande da Billings para o Alto Tietê. Entre elas está, precisamente, a falta de Estudo de Impacto Ambiental prévio. A obra, segundo os promotores, pode poluir o reservatório do Alto Tietê e ameaça a vegetação nativa. "O documento está buscando uma regularização posterior, porque três das cinco obras já estão licenciadas sem estudo de impacto ambiental, está tentando consertar algo que já foi feito errado", defende o promotor Ricardo Castro.
Castro afirma que "não existe justificativa para evitar estudos de impacto ambiental" e que o Ministério Público já está estudando como evitar que esse pedido seja concedido "sob pena de responsabilização pessoal dos membros do Conselho Estadual de Meio Ambiente". Se eles autorizarem esse "rito especial", diz Castro, "podem estar cometendo um crime ambiental e um ato de improbidade administrativa [contrário aos princípios básicos da Administração Pública]".
A Secretaria de Recursos Hídricos afirma que a solicitação não pretende "abrandamento de exigências" dos órgãos ambientais. "O pedido ao Consema é que analise a possibilidade de adotar procedimentos mais céleres, previstos pela legislação ambiental vigente, com o objetivo de encurtar os prazos de licenciamento, diante do caráter emergencial das intervenções", disse a Secretaria em nota.
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