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Contagem final dos votos mostra um perigo para Biden e um mito sobre Trump

Uma diferença de apenas 43.000 votos em três Estados poderia ter dado a presidência ao republicano. Este, apesar da grande mobilização, conseguiu um porcentual de apoio menor do que Romney em 2012

Amanda Mars
O presidente eleito dos Estados Unidos, Joe Biden, dirige-se à imprensa em Wilmington, Delaware, na última quarta-feira, com a imagem da vice-presidente eleita, Kamala Harris, atrás.
O presidente eleito dos Estados Unidos, Joe Biden, dirige-se à imprensa em Wilmington, Delaware, na última quarta-feira, com a imagem da vice-presidente eleita, Kamala Harris, atrás.KEVIN LAMARQUE (AFP)
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Colégio Eleitoral confirma a vitória de Joe Biden nas presidenciais dos Estados Unidos

Só há poucos dias os Estados Unidos terminaram de contar ―e, em alguns casos, de recontar― os votos da eleição de 3 de novembro. O ponto crucial ―quem vence e graças a quais Estados― ficou claro em 7 de novembro, mas o retrato completo deu trabalho. Em parte, pelo tamanho do país (330 milhões de habitantes e estimativa de 239 milhões de eleitores); mas também pela enxurrada de votos este ano (cerca de 158 milhões, o que significou uma taxa de participação de 66%, a maior em 120 anos) e, para acrescentar outra complicação, pelo arsenal de ações judiciais promovidas pelo republicano Donald Trump em meio a acusações de fraude. Com os resultados certificados por cada Estado e os votos depositados nesta segunda-feira no Colégio Eleitoral, a lupa pode ser aproximada da salada de números. Estes mostram um mito sobre Trump e um perigo para o vencedor, o democrata Joe Biden.

Com apenas mais 43.000 votos em três Estados, Trump poderia ter ganhado. Biden será o presidente dos Estados Unidos amparado por uma vantagem sólida de sete milhões de votos populares, ou seja, votos de cada cidadão. Ele obteve 81,2 milhões (representando uma maioria de 51,3%), em comparação com 74,2 milhões de Trump (46,8%). No entanto, se apenas 42.918 desses eleitores, distribuídos entre Arizona, Geórgia e Wisconsin, tivessem votado no Republicano, o mundo hoje estaria falando sobre a reeleição do magnata de Nova York. Uma diferença de três décimos e 10.457 votos pintou o Arizona de azul democrata pela primeira vez desde 1996; e outra de dois décimos e 11.779 cédulas fez o mesmo com a Geórgia, republicana desde 1992; e sete décimos e 20.682 votos devolveram Wisconsin ao partido de Biden.

Então, o vice-presidente da era Obama venceu por um triz? Pelo contrário, mas esses dados refletem até que ponto o sistema norte-americano torna os democratas vulneráveis. Apesar de Trump ter perdido por 4.5 pontos percentuais, menos de 50.000 votos poderiam ter dado a Casa Branca ao atual presidente. Os norte-americanos elegem seu presidente indiretamente: nas urnas, com votos populares, escolhem 538 delegados ou membros do Colégio Eleitoral, cuja distribuição pelos Estados é decidida a partir de sua representação no Senado (100, dois por Estado) e na Câmara dos Representantes, mais três do Distrito de Columbia (a cidade de Washington). O modelo acaba beneficiando Estados com menos população. Além disso, a maioria deles (exceto Maine e Nebraska) usa o procedimento de maioria (conhecido, em inglês, como winner-takes-all: quem ganha por votos populares, mesmo que seja pelo mínimo, leva todos os delegados). Não importa se Biden venceu na Califórnia por cinco milhões de votos; isso lhe dará os mesmos votos eleitorais (55) do que se ganhasse por 500 votos. Este sistema explica o paradoxo de 2016: 80.000 votos distribuídos entre Pensilvânia, Michigan e Wisconsin fizeram de Trump presidente, apesar de ter recebido um total de quase três milhões de votos a menos do que Hillary Clinton. Para ganhar são necessários 270 votos eleitorais. Biden obteve 306, o mesmo que Trump em 2016.

Trump, o grande herói popular? O atual inquilino da Casa Branca chegou no cômputo final com 74,2 milhões de votos, o que o coloca como o segundo candidato mais votado da história, mas em um contexto em que Biden é o primeiro, graças ao nível histórico de participação. Em porcentagem, o construtor nova-iorquino perdeu com 46,8% do total de votos, três décimos a menos do que Mitt Romney obteve (47,1%) contra Barack Obama em 2012 e apenas 1,2 ponto acima da famosa derrota de John McCain em 2008 (45,6%). O primeiro presidente afro-americano da história dos Estados Unidos venceu com 52,9% e, quatro anos depois, caiu para 51%. Em relação às eleições perdidas por republicanos anteriormente, as de 1992 e 1996, a comparação é enganosa porque entrou em cena um terceiro candidato independente, o empresário texano H. Ross Perot, falecido em 2019. Os dados de apoio a Trump incluem um último paradoxo: que os 46,8% alcançados em 2020 é quase um ponto superior aos 45,9% colhidos em 2016, com os quais chegou à Casa Branca.

Os democratas conservam a Câmara. A vitória de Biden e a subsequente expulsão de Trump da Casa Branca permite ao Partido Democrata superar o trauma de 2016, quando um candidato aparentemente impossível derrotou uma candidata de manual. No entanto, as urnas enviaram sinais muito preocupantes aos democratas. Na Câmara dos Deputados, que controlavam com 232 cadeiras (em comparação aos 197 republicanos), eles conservam a maioria, com 222, mas perderam uma dezena de deputados. Até agora, os republicanos subiram para 211, e ainda há duas cadeiras que estão para ser definidas. O sonho de recuperar o Senado se tornou difícil, com um segundo turno a ser realizado na Geórgia que os obrigaria a ganhar as duas cadeiras em jogo nesse Estado tradicionalmente conservador. E essa votação decisiva, em 5 de janeiro, marcará o mandato do novo presidente democrata, já que uma câmara alta controlada pelos republicanos pode limitar boa parte de suas iniciativas se ele não conseguir construir um consenso. Os democratas também não conseguiram mudar de vermelho para azul nenhuma das Assembleias estaduais. Então, o partido se saiu pior do que Biden e o debate interno continua: os moderados, como Obama, alertam para discursos muito extremos (como o que pede corte nos gastos da polícia) e os esquerdistas, como Alexandria Ocasio-Cortez, apontam para a má organização e o pouco trabalho de campo.

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