Ghosn concede entrevista em Beirute pela primeira vez desde sua fuga e acusa a Nissan de um complô contra ele
Magnata atribui sua destituição a uma tentativa da empresa japonesa de destruir sua integração com a Renault
Beirute recebeu na quarta-feira com enorme expectativa Carlos Ghosn, presidente deposto da Nissan que em 30 de dezembro fugiu da Justiça japonesa. Acompanhado por vários guarda-costas, o antigo todo-poderoso do setor automobilístico negou as acusações e disse ser vítima de uma campanha de calúnia por parte da empresa para a qual havia trabalhado.
Ghosn se defendeu das “falsas acusações orquestradas pela Nissan e vários indivíduos” para “restaurar” sua reputação. Ele se dirigiu à imprensa japonesa após mostrar vários documentos que afirma provarem sua inocência, quis demonstrar que não é “o frio ditador” mencionado em Tóquio, e sim o homem que durante 17 anos salvou a Nissan e deixou 20 bilhões de dólares (81 bilhões de reais) de lucros.
“Pela primeira vez em 14 meses posso me defender e falar livremente”, disse, e acrescentou que a decisão de fugir do Japão foi a “mais difícil” de sua vida. Mostrando orgulho de suas múltiplas nacionalidades – francesa, libanesa e brasileira – Ghosn se dirigiu às centenas de veículos de imprensa credenciados primeiro em árabe para agradecer à população e autoridades libanesas por sua hospitalidade; em francês, elogiou “a coragem” mostrada por sua mulher, Carole Ghosn e presente na sala, o que provocou uma explosão de aplausos nas primeira filas ocupadas por amigos e familiares. Por fim falou em inglês, idioma em que durante mais de uma hora defendeu sua reputação.
Ghosn acrescentou que seus direitos foram desrespeitados no Japão: “Passei 138 dias preso em uma cela sozinho, com 30 minutos de acesso ao exterior por dia, com acesso a um chuveiro duas vezes por semana e com interrogatórios de até oito horas por dia”. E se recusou a falar de sua rocambolesca fuga do Japão “por respeito à hospitalidade das autoridades libanesas” e evitar causar-lhes qualquer prejuízo. Antes de responder à rodada de perguntas, abraçou sua mulher, a quem, como disse, só pôde ver por duas horas em nove meses. E sempre diante da presença de seu advogado.
Um dia antes de seu pronunciamento à imprensa, a defesa do empresário atacou a Nissan, a quem acusou de fabricar deliberadamente falsas acusações para impedir uma maior integração entra a empresa japonesa e a Renault.
A rocambolesca fuga do magnata do automobilismo de 65 anos deixou uma grande confusão atrás de si: expôs os serviços de segurança japoneses; sete pessoas investigadas na Turquia, país no qual fez escala; e coloca em dificuldades o Governo libanês, que recebeu uma ordem de extradição da Interpol.
Suas alegações de pouco serviram. “Minha família não teve nada a ver”, afirmou assim que pisou em solo libanês. Promotores de Tóquio, entretanto, obtiveram na terça-feira uma ordem de prisão contra sua esposa Carole por “suposto perjúrio”.
O empresário foi preso pela primeira vez em 19 de novembro de 2018, acusado de fraude fiscal, pelo que passou 108 dias em prisão provisória. Ghosn era acusado de desviar fundos da empresa para fins pessoais, assim como esconder durante anos parte de seu salário para sonegar impostos. Através desses esquemas, o empresário brasileiro teria supostamente embolsado 9,2 bilhões de ienes, mais de 318 milhões de reais.
Após se reunir na terça-feira com o presidente libanês, Michel Aoun, o embaixador do Japão no Líbano, Takeshi Okubo, pediu uma “cooperação maior por parte das autoridades libanesas” com o objetivo de evitar “repercussões negativas” nas relações entre os dois países.
Da mesma forma que a França, o Líbano não possui lei de extradição para seus cidadãos, de modo que Ghosn pode ficar tranquilo e saber que não será entregue à Justiça desse país.
“Esse homem foi francês até hoje, e só se lembra de que é libanês quando se transforma em um ladrão e é perseguidor pela Justiça”, protesta em Beirute Hussein Hutet, comerciante de 47 anos. O faz em uma cidade que hoje vive o 84° dia de protestos anticorrupção, que pedem a queda em bloco de uma classe política que é acusada pelo movimento de protesto de ser corrupta e responsável pelo saque dos cofres do país.
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