Brasil assume presidência temporária do Mercosul em meio a rebelião uruguaia
Lacalle Pou defende em encontro dos presidentes a decisão de romper a regra que proíbe parceiros de assinar acordos comerciais fora do bloco. Bolsonaro apoia flexibilização nos negócios externos
O Mercosul vive o que talvez seja a pior crise desde seu nascimento, em 1991: o Uruguai chutou a mesa. Seu presidente, Luis Lacalle Pou, defendeu nesta quinta-feira diante de seus pares a decisão de assinar acordos comerciais fora do bloco, algo que é proibido por estatuto. “O mundo não vai esperar por nós. Portanto, com tranquilidade, queremos dizer que o Uruguai está indo para lá. Tomara que sigamos todos juntos”, avisou Lacalle Pou a seus parceiros em videoconferência, no dia em que o Brasil assumiu a presidência temporária do bloco. A rebelião uruguaia tem como alvo a Argentina, que defende a todo custo as normas acordadas há 30 anos em Assunção, e busca o apoio do Brasil, que concorda em “flexibilizar” o Mercosul, mas sem fraturar a unidade. O Paraguai, por sua vez, apoia silenciosamente a posição de Montevidéu.
As reivindicações de todos os membros, exceto a Argentina, de poderem negociar acordos com outros países fora do Mercosul são antigas. O Uruguai, e em menor medida o Paraguai, abriu o caminho no protesto. Enquanto Brasil e Argentina respondem pela maior parte do comércio no bloco e lideram as negociações com terceiros países, os dois parceiros menores consideram que não recebem os benefícios esperados. Em 26 de maio, em uma cúpula extraordinária por ocasião do 30º aniversário do Mercosul, Lacalle Pou disse que o bloco era um obstáculo à abertura econômica de seu país. O argentino Alberto Fernández lhe respondeu, então, que se ele considerava que o Mercosul era “uma carga muito pesada”, poderia “mudar de barco” quando quisesse.
O Uruguai parece ter aceitado o desafio lançado pelo argentino. Às vésperas da cúpula desta quinta-feira, o chanceler uruguaio, Francisco Bustillo, comunicou a seus pares que seu país “começará a conversar com terceiros para negociar acordos comerciais extrazona”. Lacalle Pou disse em seu discurso que isso não implica romper com o Mercosul porque a decisão “não significa violar nem violentar a regra de consenso” que rege as decisões do bloco. “O fim último é o pertencimento ao bloco”, disse. Sem citar Lacalle Pou, Fernández lembrou que o Tratado de Assunção, constitutivo do Mercosul, estabelece “por um lado, que as negociações têm que ser iniciadas e concluídas de modo conjunto. Em segundo lugar, qualquer proposta tem que estar baseada na regra do consenso”.
Não é apenas a “flexibilização” que divide os parceiros. O Brasil e também o Uruguai defendem ainda a redução drástica da Tarifa Externa Comum (TEC) que regula a entrada de produtos extrazona com uma taxa média de 14%. O prrsidente Jair Bolsonaro esteve presente na cúpula dos presidentes por videoconferência e firmou sua posição. A estratégia de Brasília sempre foi a de promoção de acordos comerciais bilaterais e redução da TEC, mas dentro das normas do bloco. Observa que a Argentina é seu principal parceiro comercial, graças, precisamente, ao comércio intrazona. Também tem a pressão dos grandes industriais. A poderosa Confederação Nacional da Indústria (CNI) divulgou comunicado em que afirma que a estratégia de ruptura do Uruguai não ajuda no avanço do bloco. “A integração no Mercosul precisa de ajustes e aperfeiçoamentos, mas continua sendo a que mais proporciona resultados econômicos e sociais para o Brasil “, diz o comunicado, destacando o recente acordo de livre comércio acertado com a União Europeia.
Por tudo isso, Bolsonaro não deu indicações de que seguirá os passos de Lacalle Pou. Ele até disse, brincando, que a única rivalidade com seus vizinhos sul-americanos é com a Argentina, pelo futebol. “No domingo vamos vencer por 5 x 0 no Maracanã”, afirmou, com a mão estendida para a câmera, sobre o final da Copa América, que será disputado no sábado no mítico estádio brasileiro. Bolsonaro frisou, porém, que a prioridade deveria ser “a revisão da tarifa externa comum e a flexibilidade para negociação comerciais com parceiros externos”. E lamentou que durante os últimos seis meses, o período em que a Argentina exerceu a presidência pro tempore do bloco, não tenham correspondido “às expectativas e necessidades de modernização do Mercosul”. Mas não chutou a mesa.
“Não podemos deixar que o Mercosul continue a ser visto como sinônimo de ineficiência, de desperdício de oportunidades e de restrições comerciais”, disse. A presidência temporária do Brasil, que começa nesta quinta-feira e termina no final de ano, terá como foco a modernização da agenda econômica.
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