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Bolsonaristas manobram e conseguem empurrar PEC do voto impresso para agosto

Em reunião tumultuada, relator da proposta, o deputado governista Felipe Barros (PSL-PR), pede para apresentar um novo texto na comissão especial da Câmara que analisa o tema. Agora, avaliação só acontecerá depois do recesso parlamentar

Eleições 2020
Uma urna eletrônica de um colégio eleitoral no Rio de Janeiro, nas eleições de 2020.Fernando Frazão (Agência Brasil)
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Uma urna eletrônica.
Entenda a polêmica em torno da PEC do voto impresso
View of voting machine at a polling station in Igarape Miri, Para state, Brazil on November 15, 2020, during the first round of municipal elections amid the new coronavirus pandemic. - Brazilians voted Sunday in municipal elections that will test the strength of the country's rightward shift under President Jair Bolsonaro, with the coronavirus pandemic looming large -- and likely denting turnout. (Photo by TARSO SARRAF / AFP)
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Os bolsonaristas ganharam mais um round, tático, na campanha por tentar emplacar o voto impresso. Depois de mais uma manobra envolvendo a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 135/2019, que estabelece a obrigatoriedade do voto impresso, a votação na comissão especial da Câmara onde o tema tramita foi adiada para agosto. Em uma reunião tumultuada nesta sexta-feira, o relator da proposta, deputado governista Felipe Barros (PSL-PR), atropelou a fala dos demais parlamentares e conseguiu adiar a votação, ao pedir para reformular o texto. A nova data marcada para a votação será dia 05 de agosto, após, portanto, o recesso parlamentar que termina em 30 de julho.

Foram tantas manobras e idas e vindas envolvendo a PEC do voto impresso, que, já no início da reunião, realizada remotamente pelo Zoom, alguns deputados chegaram a levantar a teoria de boicote devido à instabilidade da plataforma. A tese foi refutada pelo presidente da comissão, o deputado Paulo Eduardo Martins (PSC-PR). A relatora da PEC, a também deputada governista Bia Kicis (PSL-DF), aproveitou o ensejo para colocar em dúvida a segurança da urna eletrônica. “Estamos tendo uma prova aqui de como a tecnologia pode falhar”, disse, emendando que a urna eletrônica “também pode falhar”. Os parlamentares de ambos os lados aproveitaram então para falar em cima da fala uns dos outros e tumultuar a sessão.

O imbróglio já se desenhava desde a madrugada desta sexta-feira, quando deputados bolsonaristas tentaram, sem sucesso, fazer uma manobra para suspender a votação da PEC na comissão. Ao perceber que o placar se mostrava desfavorável à aprovação da proposta, os parlamentares governistas tentaram aprovar requerimento para proibir a realização de sessões e comissões especiais entre 16 e 20 de julho, em virtude do recesso parlamentar que ocorre de 18 a 30 de julho. Com 207 votos a favor, o requerimento de autoria do deputado Cacá Leão (PP-BA) acabou sendo rejeitado por falta de quórum. Eram necessários 257 votos para validar a votação, mas houve registro de somente 255.

Esta havia sido a segunda tentativa da bancada bolsonarista de adiar a votação. A primeira ocorreu a pedido do próprio presidente da comissão, o deputado Paulo Eduardo Martins (PSC-PR). Ele suspendeu a reunião que ocorria no início da semana e disse que só retomaria a discussão em agosto, depois do recesso. Mas os parlamentares contrários à PEC fizeram uma autoconvocação. Foi essa convocação que os líderes bolsonaristas tentaram derrubar na madrugada.

O cabo de guerra do voto impresso passou até mesmo por uma dança das cadeiras dos parlamentares. No início do mês, líderes partidários de ao menos 11 siglas se reuniram e fecharam posição contrária à aprovação da PEC. A partir daí, as siglas começaram a substituir na comissão os deputados que eram a favor do voto impresso. Segundo levantamento do Congresso em Foco, houve pelo menos 20 trocas, entre parlamentares e suplentes. Ao perceber que a comissão tinha maioria contrária à PEC, líderes a favor da proposta começaram a tentar adiar a votação.

Campanha reiterada

A ideia sobre o voto impresso é impulsionada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que colocou o assunto em pauta passados 25 anos da estreia das urnas eletrônicas nas eleições brasileiras. Sem qualquer prova, o presidente vem martelando a tese de que o sistema não é seguro e já atacou o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) diversas vezes, tudo tendo como pano de fundo a sucessiva queda de popularidade que o presidente vem sofrendo. Na semana passada, pesquisa do instituto Datafolha mostrou que 51% dos brasileiros reprovam Bolsonaro, um recorde de rejeição até agora. No mesmo ritmo da queda nas pesquisas, Bolsonaro vem discursando a favor do voto impresso e questionando a segurança da urna eletrônica, na esteira do que ele já faz desde o pleito de 2018 que o elegeu. “Ou fazemos eleições limpas no Brasil ou não temos eleições”, ameaçou o presidente no último dia 8.

A declaração provocou reação do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luis Fux, que convidou Bolsonaro para uma reunião na Corte, no último dia13, para tratar da crise entre os dois poderes e cobrou “respeito às instituições e aos limites impostos pela Constituição Federal”. O encontro não esgotou o assunto e uma nova reunião com a presença dos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) deverá ser marcada.

A proposta de Bolsonaro que estava em discussão na Câmara é que o voto digitado na urna eletrônica seja impresso em um papel e depositado pelo eleitor em uma segunda urna, para ser auditado. O TSE refuta as acusações de vulnerabilidade da urna eletrônica e considera que a volta do voto impresso representa o retorno das fraudes no processo eleitoral. “O voto impresso vai potencializar o discurso de fraude”, afirmou o presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, em uma entrevista coletiva no final de junho. “E vão pedir, como já se pediu aqui, a contagem pública de 150 milhões de votos. E contagem pública só pode ser manual. Então, nós vamos entrar num túnel do tempo e voltar à época das fraudes, em que as pessoas comiam votos, as urnas desapareciam, apareciam votos novos. Nós vamos produzir um resultado muito ruim.”

Seja como for, o segundo semestre deve ser uma corrida contra o relógio para os líderes governistas, já que todas as mudanças referentes à proposta devem ser aprovadas até o início de outubro para que possam valer já para a próxima eleição. Depois da comissão, a PEC ainda precisará ser aprovada em dois turnos Câmara e dois turnos no Senado.

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