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De Xuxa ao PSTU, protestos contra Bolsonaro atraem aliados improváveis e buscam crescer com a crise política

Movimentos de diferentes ideologias convergem nos atos que serão realizados neste sábado nas grandes capitais de todo país, em um momento em que a pressão aumenta para o presidente. PSDB e ex-bolsonaristas acenam, mas direita tradicional não adere. Vem para a Rua diz que não é hora ainda de a atos

Protestos contra o presidente Jair Bolsonaro dia 30 de junho,em Brasília.
Protestos contra o presidente Jair Bolsonaro dia 30 de junho,em Brasília.Joédson Alves (EFE)
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Um post, à primeira vista tímido, da ex-apresentadora Xuxa Meneghel em sua rede social chamando para os protestos contra o presidente Jair Bolsonaro deste sábado, e a resposta do roqueiro e ativista progressista Tico Santa Cruz dão o tom do que parece ser o início de um diálogo nas ruas entre improváveis aliados nas manifestações deste final de semana: “Vamos derrubar o genocida corrupto! Não se trata de ideologias, se trata de salvar vidas! TMJ”. Em todo o país, movimentos sociais somam forças com partidos de esquerda, esquerda radical e centrais sindicais para aumentar a pressão sobre o Governo federal e já contam com a simpatia —não necessariamente apoio— de antigos opositores, como o diretório municipal do PSDB de São Paulo e o movimento Vem Pra rua. A direita tradicional, decisiva para somar votos por uma destituição, não aderiu.

“O diretório municipal de São Paulo é o que tem maior base e militância política de rua, temos 19 secretários e é unânime a indignação com o que está acontecendo no país. Por isso decidimos aderir às manifestações e somos a favor do impeachment”, afirmou o presidente do diretório paulistano Fernando Alfredo, deixando claro que ele não fala pelo PSDB Nacional, que ainda não se posicionou sobre o pedido de afastamento do presidente. Para Alfredo, tirar Bolsonaro do cargo é uma questão de “garantir a preservação da vida e da democracia”, mesmo se a estrutura que o sustenta hoje, baseada no apoio de militares, seja mantida com um eventual impeachment. “O presidente isolou o vice. Mourão sabe da responsabilidade dele”, justifica.

Já o Vem pra Rua, que nasceu como um antagonista dos governos de esquerda, não fez convocação desta vez, mas se diz simpático ao movimento. “Ainda estamos muito preocupados com a pandemia. Acompanhando o calendário de vacinação, acredito que em 45, 50 dias já será possível ir à rua com mais segurança. Entendemos que é muito importante, não criticamos quem decide ir agora”, afirma Luciana Alberto, porta-voz do Vem pra Rua, que acredita na possibilidade de diálogo com a esquerda, porque há uma convergência entre diferentes ideologias na pauta do impeachment. Segundo ela, é um equívoco acreditar que o movimento deu apoio específico a Bolsonaro nas últimas eleições. “Apoiamos a renovação política”, afirma. No entanto, as primeiras medidas do atual Governo já demonstraram um certo distanciamento das promessas de campanha, como combate à corrupção. O Vem pra Rua ―que a representante define como um “movimento de centro mais liberal, mais à direita”―, protocolou seu próprio pedido de impeachment contra Bolsonaro, listando 130 crimes de responsabilidade que teriam sido cometidos em seu Governo.

Ainda não está certo que direita e esquerda vão realmente convergir numa agenda contra o Governo Bolsonaro, mas os caminhos estão abertos. “O superpedido de impeachment mostra que há uma união, ainda que temporária, entre a esquerda e direita para o enfrentamento de algo maior: o fascismo, a violência e o risco que Bolsonaro representa para nossas vidas e para democracia”, afirma Sheila de Carvalho, representante da Coalizão Negra por Direitos, grupo que representa 200 organizações do movimento negro e que desde o começo da crise de saúde vem puxando a sociedade civil às ruas por conta da ameaça que a covid-19 representa para a população negra e pobre. “A crise sanitária virou uma crise social e econômica por causa da negligência desse Governo”, afirma.

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Raimundo Bonfim, coordenador nacional da Central de Movimentos Populares (CMP), afirma que nos atos que foram realizados até então, embora coordenados pelo campo de esquerda, o público foi bastante diversificado. “Estamos num processo de buscar novos movimentos e novas forças com objetivo de ir ampliando o aspecto político”, afirma. Dois movimentos de caráter suprapartidário aderiram recentemente: o Livres, uma tendência partidária que nasceu no PSL, com objetivo de renovar o partido, mas que rompeu com o partido por discordar da candidatura de Bolsonaro pela sigla; e o Agora, uma plataforma de lideranças engajadas na formulação de políticas públicas no Brasil, que tem dentre os conselheiros Ilona Szabó, diretora-executiva do Instituto Igarapé. “Tem uma discussão de que os atos estão muito vermelhos, em referência as bandeiras da esquerda. Não é uma questão afastar, como em 2013 ―sem bandeira, sem partido, sem ideologia―, mas sim de ampliar, queremos a bandeira vermelha, amarela, verde, azul...”.

Antonio Neto, presidente municipal do PDT de São Paulo e da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), concorda: “Cabe esquerda, centro-esquerda, centro, centro-direita, direita, comunista, liberal… na luta contra Bolsonaro. Todos aqueles que estão comprometidos em resgatar o nosso país das mãos desse Governo genocida são bem-vindos”. A CMP conta com mais de 340 atos confirmados neste sábado em todo Brasil e no exterior. Partidos como o esquerdista radical PSTU também confirmam presença.

Para Arthur Lira ver

O principal desafio das manifestações deste sábado, no entanto, será mostrar que a percepção do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), sobre o apoio ao impeachment está equivocada. Não contente com superpedido de impeachment, que unificou mais de 100 requerimentos parados na Mesa Diretora da Câmara, Lira disse em entrevista ao jornal Valor Econômico, que não vê apoio “nem fora nem dentro do Congresso” para um processo de impedimento. “Não há impeachment em cima de discurso. Há impeachment em cima de materialidade e disposição política, o que não há nem fora nem dentro do Congresso”, disse ao jornal. Apesar do aceno de PSDB e ex-bolsonaristas, a direita tradicional não aderiu nem ao pedido nem aos atos deste sábado, e seus votos, além de sua influência no mercado financeiro e nos setores produtivos, são um peso importante para ao menos tentar amolecer a muralha de Lira, que não tem incentivos para tumultuar com um processo de impeachment a ampliação de seu poder na Câmara.

Os atos deste sábado são os primeiros após as denúncias de corrupção feitas contra o Governo federal na compra da vacina indiana Covaxin na CPI da Pandemia e no suposto pedido de propina feito por um diretor do Ministério da Saúde ao negociar um outro imunizante ―ambos os escândalos tocam no nome do líder do Governo na Câmara, Ricardo Barros. O círculo começa a se fechar para o presidente. A Procuradoria-Geral da República (PGR) protocolou nesta sexta um pedido ao Supremo Tribunal Federal (STF) para apurar suposta prevaricação ―um crime contra a administração pública, que ocorre quando um agente público deixa de cumprir seu dever por interesse pessoal― cometido por Bolsonaro no caso da compra da vacina indiana, já que, ele teria sabido das suspeitas e não levou adiante um pedido de investigação.

O Ministério Público Federal (MPF) também enviou à justiça uma ação contra o ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, que responderá por danos ao patrimônio público e violação aos princípios da Administração na gestão da pandemia. De acordo com reportagem publicada pelo portal UOL, a ação, que tramita provisoriamente em segredo de justiça por conter documentos protegidos por sigilo legal, aponta quase 122 milhões de reais de dano aos órgãos de administração pública. O MPF pede o ressarcimento integral do prejuízo mais pagamento de multa de até duas vezes o valor do dano.

Errata: em uma primeira versão desta reportagem, o roqueiro Tico Santa Cruz foi descrito como reacionário.

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