Câncer de Bruno Covas “ganha terreno” apesar do tratamento, segundo seus médicos
Tucano anuncia aparecimento de novo nódulo do fígado e está internado para quimioterapia. Prefeito decidiu permanecer trabalhando. Cidade assiste a problemas na volta às aulas presenciais
O prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), sempre falou abertamente sobre o fato de não estar curado do câncer no trato digestivo descoberto no final de 2019. Apesar disso, a doença estava controlada. Após ter sido diagnosticado com covid-19 e recuperar-se com rapidez, liderar o combate à pandemia na cidade, ter feito uma intensa campanha pela reeleição no final do ano passado e até ido à final da Copa Libertadores da América entre Santos e Palmeiras no estádio do Maracanã neste ano, em uma viagem relâmpago ao Rio de Janeiro com o filho, a impressão era de que sua saúde estava bem. Assim, o anúncio do surgimento de um novo nódulo no fígado, feito na noite desta quarta-feira, provoca apreensão.
“Observou-se o surgimento de um pequeno nódulo hepático, o que nos sugere que de alguma forma a doença tenha conseguido ganhar terreno apesar da imunoterapia”, afirmou o oncologista Artur Katz em entrevista coletiva na tarde desta quinta-feira no Hospital Sírio-libanês, onde Covas está internado. Inicialmente ele fará quatro sessões de quimioterapia de 48 horas cada uma, com intervalos de 14 dias entre elas. Segundo o médico Tulio Eduardo Flesch Pfiffer, que integra a equipe que cuida do prefeito, o nódulo foi descoberto em um exame de rotina nesta semana. “Quando fez quimioterapia em um primeiro momento, ele teve uma resposta muito boa. Esse que se manifestou agora é em outro ponto. Estamos confiantes para essa nova etapa do tratamento.”
O câncer de Covas, de 40 anos, começou na cárdia, uma válvula no trato digestivo, e depois atacou também o fígado. Entre outubro de 2019 e fevereiro do ano passado, o prefeito fez oito sessões de quimioterapia. As lesões regrediram, mas não desapareceram. Desde então, ele passou a fazer uso da imunoterapia. Esse tratamento não ataca o tumor, mas estimula as defesas do organismo para combater a doença. A imunoterapia, que normalmente dura dois anos, tem revolucionado o tratamento de vários tipos de câncer. No caso de Covas, além do tumor na cárdia, inicialmente foram detectados tumores no fígado e nos linfonodos ao lado do estômago.
De acordo com um médico com conhecimento do caso ouvido pelo EL PAÍS, o câncer do prefeito é agressivo e dificilmente pode ser totalmente curado, mas pode ser diminuído e controlado para que ele viva bem com a doença. Na coletiva de imprensa, seus médicos informaram que o prefeito continua trabalhando normalmente, mesmo internado no hospital desde esta terça-feira para as sessões de quimioterapia. Segundo o boletim médico, ele está bem disposto, alimentando-se bem e recuperando o peso que havia perdido recentemente, após sessões de radioterapia. Ele deve voltar para casa no sábado de acordo com a previsão dos médicos que cuidam do caso. Ainda não foi divulgada como será a continuidade do tratamento após isso, já que o caso deve ser avaliado continuamente pela junta médica que cuida do prefeito.
Sem afastamento da Prefeitura
Por ora, não há nenhuma previsão de afastamento de suas atividades normais por causa da doença, mas essa possibilidade existe. Em janeiro, antes da descoberta do novo nódulo, Covas ficou afastado do cargo durante dez dias para submeter-se a outro tratamento para o câncer contra o qual luta há quase um ano e meio. Na ocasião ele passou por sessões de radioterapia e quem assumiu a prefeitura foi o controverso Ricardo Nunes (MDB), vice-prefeito muito atacado por adversários políticos e alvo de diversas reportagens da imprensa durante a campanha eleitoral por sua proximidade com entidades que gerem creches que mantém convênios com a prefeitura. Ligado à bancada religiosa e a políticas contra a diversidade de gênero, também consta contra Nunes um boletim de ocorrência por violência doméstica feito por sua mulher ―ele nega agressões e qualquer irregularidade. Caso o prefeito necessite afastar-se por mais de dez dias, a Lei Orgânica do Município diz que a Câmara deve ratificar a licença. Sempre que o prefeito está de licença, independentemente do período, quem assume o comando da cidade é o vice e, depois dele, o presidente da Câmara Municipal.
A notícia sobre o estado de saúde de Covas vem em um momento conturbado para sua administração, que é criticada por problemas na volta às aulas presenciais após praticamente um ano com as escolas fechadas. Em 530 escolas municipais os alunos não puderam voltar às aulas porque ficaram sem serviços de limpeza na semana anterior ao retorno dos alunos, iniciado no dia 15 deste mês. Outras 50 escolas ainda estão em obras, e nenhuma delas recebeu os tablets que a Prefeitura anunciou para o ano passado. A Prefeitura prometeu resolver a situação em até mais 15 dias.
A administração municipal também demorou para renovar o contrato com a empresa que fornece o vale-alimentação criado pela Prefeitura para substituir a merenda escolar e a recarga do benefício dos alunos, que seguirão em aulas remotas em revezamento com as presenciais, atrasou em fevereiro. Esses problemas pontuais somam-se à confirmação da circulação comunitária na cidade das novas cepas do coronavírus, que possuem potencial infeccioso maior.
Aliados do prefeito na Câmara dizem receber com pesar a notícia, mas não surpresa. “Recebi a novidade com muita tristeza e preocupação, mas não surpresa”, afirma um vereador do PSDB que pediu para não ser identificado na reportagem. “Infelizmente sempre soubemos que isso podia acontecer e aconteceu. Tenho certeza que ele vai sair dessa como saiu até agora, precisamos dele para liderar a cidade nesse momento tão difícil”, diz. “Gera um preocupação enorme com quatro anos inteiros de mandato pela frente, mas foi um risco político que assumimos, incluindo os eleitores, e estamos preparados para continuar fazendo nossa parte do trabalho independentemente disso”, diz outro vereador, do DEM, que também conversou informalmente com o EL PAÍS.
Na corrida eleitoral, em geral a doença do prefeito foi tratada com respeito e reserva por todos os adversários. Guilherme Boulos (PSOL) sugeriu em vários momentos durante os debates e suas propagandas no segundo turno que os eleitores deveriam prestar mais atenção em quem era o vice de seu adversário, em uma eventualidade de ele assumir a Prefeitura de São Paulo. Apesar disso, não fez alusão direta ao câncer de Covas.
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