Brasil vai às urnas votar para prefeito com um olho na covid-19 e outro na presidência em 2022
Saúde foi um dos temas mais debatidos nas redes nos últimos dias, segundo a FGV DAPP, após nova alta de contágios nas últimas semanas e com UTIs cheias em várias cidades
Se no dia 15 de novembro o eleitor fez cálculos de qual força política deveria sair fortalecida nas urnas, neste segundo turno o foco são os problemas imediatos que afligem suas cidades, em especial, o repique da covid-19 constatada nas últimas semanas. As notícias de que a ocupação de UTIs para infectados por coronavírus voltou a subir a níveis preocupantes aumentaram o interesse dos brasileiros com os investimentos em saúde em seus municípios. Um levantamento da Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getúlio Vargas (DAPP-FGV) mostra que em capitais como São Paulo e Recife o tema saúde virou prioridade nos debates no Twitter. A pesquisa foi feita entre os dias 16 e 23 de novembro.
Na última quinta-feira, o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, chegou a admitir o crescimento da pandemia em vários locais do país ―“repiques”, segundo ele— após um período de estabilidade. O país já soma quase 172.000 mortes por covid e mais de 6 milhões de casos. Alguns resultados no primeiro turno já apontaram que a preocupação do eleitor com a pandemia ajudou a decidir resultados. Caso de Alexandre Kalil (PSD), em Belo Horizonte, ferrenho defensor das regras da Organização Mundial de Saúde (OMS) no comando da capital mineira, apesar da pressão do governador Romeu Zema (Novo) pela reabertura do comércio em momentos críticos. Kalil foi reeleito em primeiro turno com mais de 60% dos votos e já se cacifa como um dos potenciais nomes do seu partido para 2022.
Em São Paulo e no Rio de Janeiro, o assunto pegou de frente na reta final da campanha. O candidato tucano, Bruno Covas, que lidera as pesquisas na capital paulista, foi questionado até o último dia sobre o aumento de contágios em São Paulo. “Há uma estabilidade da pandemia na cidade de São Paulo”, garantiu Covas neste sábado, 28. “Houve aumento na quantidade de internações, mas há uma estabilidade me relação ao número de casos e óbitos”, garantiu. Até este final de semana, a cidade somava 406.362 casos de covid-19 e 14.387 mortes confirmadas por coronavírus.
A pandemia atingiu, inclusive, candidatos nesta eleição. Em Boa Vista, a candidata a vice pelo MDB, Edileusa Barbosa Gomes, faleceu de covid-19 aos 57 anos no dia 25 de outubro, em plena campanha. Também o candidato a prefeito de Goiânia Maguito Vilela, do mesmo partido, chegou ao segundo turno sem saber que é o favorito. Está internado na UTI do hospital Albert Einstein em São Paulo, entubado depois de complicações respiratórias que começaram no dia 15, antes do fechamento das urnas no primeiro turno.
A covid=19 permeia esta eleição em todas as frentes e acirra inclusive as fricções que começam no xadrez político para 2022. A disputa pela vacina contra a doença também mexeu com o imaginário dos brasileiros após notícias da chegada da Coronavac ao país no dia 19, segundo a FGV DAPP. A vacina é produzida pela chinesa Sinovac em parceria com o Instituto Butantan, de São Paulo. A Coronavac, porém, não está entre as vacinas cotadas para um possível acordo de compra pelo Governo federal, um reflexo do embate entre o governador João Doria (PSDB) e o presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Ambos se perfilam para concorrer à presidência da República em 2022 e calculam passos e estratégias nesta eleição para estudar o terreno.
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Enquanto Doria e Bruno Covas celebram ter controlado a pandemia no Estado e na cidade, Bolsonaro tem sido atacado pela omissão na crise sanitária —o que pode influenciado negativamente aqueles candidatos a prefeito que tentaram colar sua imagem à do presidente. Nos últimos dias, Bolsonaro tem se embananado nas respostas à pandemia, mesmo diante dos sinais de retomada dos contágios. Há poucos dias o jornal O Estado de S. Paulo revelou que quase 7 milhões de testes para covid-19 estocados não foram distribuídos ―e estavam próximos de vencer. Também em um lapso de memória, o presidente disse em uma live na última quinta-feira que nunca havia chamado a covid-19 de “gripezinha”. “Não existe um vídeo ou um áudio meu falando dessa forma”, disse ele, desmentido na sequência por todos os jornais que retransmitiram aparições públicas em que usou o termo. Uma delas em cadeia nacional de rádio e televisão.
A notícia de que a pandemia se estenderá e exigirá equilíbrio no binômio saúde e economia é uma realidade inexorável e deve marcar os próximos passos de todos os governantes ―dos prefeitos que vão assumir em 1º de janeiro, aos governadores e o presidente. A julgar pelo pleito dos Estados Unidos, é inegável que a covid-19 jogou um papel importante na derrota do republicano Donald Trump, segundo analistas, uma vez que a economia do país vai melhor do que se esperava. No Brasil, contudo, a atividade econômica continua morna, o que vai requerer soluções criativas para superar a crise. Candidatos mais à esquerda defendem ajudas no estilo do auxílio emergencial, mas vivem o dilema de encarar o teto de gastos de apertados orçamentos que caem com a queda da arrecadação. Mais à direita, surgem as propostas para reativar atividades comerciais como solução para retomar emprego e renda.
Esse embate já está desenhado no Brasil, que se engalfinha ainda sobre o périplo das vacinas, diante de uma população que vai perdendo a vontade de se manter confinada. A alegria pela vitória neste domingo dos 57 eleitos em segundo turno vai ser grande, mas vai durar pouco. A necessidade de preparar uma estratégia concreta para lidar com a pandemia quando assumirem seus cargos em 2021 deve abreviar a euforia e será um teste de resiliência política para passar pelo crivo do eleitor nas próximas disputas.
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