A polêmica vida de Hunter Biden, pivô da ação que pode levar os Estados Unidos a um impeachment
Filho do ex-vice-presidente dos EUA lutou contra o vício em álcool e drogas
Joe Biden e seu filho tinham um acordo tácito no qual o ex-vice-presidente não lhe perguntava sobre os clientes que tinha nos grupos de pressão com os quais trabalhava em Washington e Hunter tampouco lhe falava deles. “Era como se todos tivéssemos nos reunido e entrado em um acordo”, explica Hunter Biden no longo perfil escrito por Adam Entous na revista The New Yorker no início de julho.
Nunca é fácil para os descendentes de grandes figuras, sejam elas políticas, sociais ou econômicas, escaparem das longas sombras projetadas por seus progenitores, como também é difícil abrir caminho sem que o nome atrapalhe. Ou ajude.
O caso de Hunter Biden ficará na história. A relação com o pai e seus negócios em um país estrangeiro, iniciados quando o ex-senador estava na Casa Branca de Barack Obama, deflagraram o início das investigações para que Donald Trump fosse processado, o famoso impeachment.
Poderia se dizer que nos quase 50 anos de vida de Hunter Biden houve mais sombras do que luzes, mais tragédias do que alegrias, começando com a morte da mãe em um acidente de trânsito quando ele tinha apenas três anos. Álcool, drogas, prostitutas, um casamento fracassado, o relacionamento romântico com a viúva do irmão e vários centros de reabilitação estão na biografia da metade de sua jovem vida.
“Todo mundo tem traumas. Em cada família há vícios. Eu estava perdido. Estava em um túnel, um túnel sem fim, do qual você nunca sai. Você só aprende a lidar com isso”, diz Hunter Biden na The New Yorker. Como se fosse um ato de contrição, o agora único filho homem do ex-vice-presidente, após a morte de Beau em 2015, aos 46 anos, em consequência de um câncer no cérebro, confessou à revista todos os seus pecados para se antecipar assim a qualquer polêmica e não prejudicar o pai em sua tentativa de chegar à Casa Branca.
Sem dúvida, o título da entrevista (Hunter Biden colocará em perigo a campanha de seu pai?) foi em um bumerangue voltado contra Trump e um aviso ao possível adversário de seu pai: “Foda-se, senhor presidente. Aqui estou, vivendo minha vida”. Parte dessa vida se foi com a morte de Beau, razão pela qual buscou refúgio sentimental na única pessoa que passava pela mesma situação, Hallie, a viúva do irmão.
E parte dessa vida se desenvolveu nos arredores da política, em oportunidades que surgiam através de alguém que conhecia alguém que havia trabalhado com seu pai. Essas pessoas sempre tinham um sobrenome grande, podiam ser um Daley, parentes do prefeito de Chicago em cinco vezes, ou trabalhar para Bill Clinton. Em alguns casos, tratava-se de um excêntrico milionário chinês ligado ao setor de energia de Pequim, que entregou a Hunter um diamante de 2,5 quilates junto com o cartão com o qual agradecia a conversa mantida em um único jantar. Em outros, Hunter Biden fazia parte do conselho de administração da Burisma Holdings, uma das maiores companhias de gás natural da Ucrânia e origem da polêmica que deu motivo ao impeachment.
O vice-presidente Biden desempenhou um papel central na supervisão da política dos EUA em relação à Ucrânia depois da chamada revolução de Maidan, quando uma mobilização social europeísta e anticorrupção desalojou do poder o presidente Viktor Yanukovich, aliado do Kremlin. Joe Biden chegou a viajar até 12 vezes para Kiev. Em 13 de maio de 2014, Jen Psaki, porta-voz da diplomacia de Obama, disse em entrevista coletiva depois da divulgação do posto de Hunter Biden na empresa ucraniana que o Departamento de Estado não estava preocupado com o que poderia ser visto como um conflito de interesses, pois Hunter era “um cidadão privado”.
O ex-presidente polonês Aleksander Kwasniewski também foi contratado para o conselho da Burisma, que pretendia adotar os padrões ocidentais de transparência na gestão e fugir da corrupção desenfreada que asfixiava a ex-república soviética. No perfil escrito sobre Biden, Kwasniewski expressa o que sentiu depois de Hunter comunicar que não queria se envolver em nenhum assunto relacionado aos EUA ou a seu pai. “Nunca discutimos como o vice-presidente poderia nos servir de ajuda”, confessa Kwasniewski. Que termina acrescentando: “E falando francamente, não precisávamos de sua ajuda”.
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