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COLUNA
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Bolsonaro está espionando o Papa?

O Sínodo da Amazônia vai manter a atenção sobre a floresta mesmo que as chamas se apaguem

Eliane Brum
Jair Bolsonaro em ato no Palácio do Planalto no último dia 29.
Jair Bolsonaro em ato no Palácio do Planalto no último dia 29.EVARISTO SA (AFP)

A próxima briga de Jair Bolsonaro pode ser com o Papa. Acuado pela reação do mundo diante das imagens da floresta amazônica em chamas, o presidente e seus generais tentam convencer a população que a Europa quer tomar a Amazônia do Brasil. Apelam para o embolorado truque da “soberania nacional” para encobrir que os alertas de desmatamento aumentaram 278% em julho e os focos de incêndio triplicaram em agosto, comparados aos mesmos períodos de 2018. O problema é que, ainda que as chamas se apaguem, as câmeras continuarão apontadas para a floresta. Ao realizar o Sínodo da Amazônia, o Vaticano colocará o tema no centro das atenções globais durante o mês de outubro. Em carta divulgada em 30 de agosto, os bispos da região expressaram a tensão: “Lamentamos imensamente que hoje, em vez de serem apoiadas e incentivadas, nossas lideranças são criminalizadas como inimigos da Pátria”. No dia seguinte, Bolsonaro confirmou que a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) está monitorando o Sínodo, conforme divulgou o jornal O Estado de S. Paulo.

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A Igreja Católica tem uma atuação forte na Amazônia. Padres e freiras compreenderam que viver segundo o evangelho significa respeitar a cultura dos povos da floresta e não convertê-los em outros como fizeram no passado. A maioria das lideranças dos movimentos sociais foram formadas nas pastorais da igreja. A missionária Dorothy Stang foi assassinada em 2005, em Anapu, a mando de um consórcio de grileiros, por defender o uso social e sustentável da terra por pequenos agricultores. Em 2018, seu sucessor, Padre Amaro Lopes, foi preso. É um exemplo de como a ação da Igreja Católica confronta os interesses daqueles que querem converter a floresta em boi, soja e minério.

Nos últimos anos, porém, os católicos vêm perdendo espaço. O número de evangélicos neopentecostais têm crescido de forma acelerada nas cidades da Amazônia e nas comunidades indígenas, ribeirinhas e quilombolas. Mas ainda que a maioria dos evangélicos tenha dado seu voto a Bolsonaro, isso não significa apoio incondicional à sua política colonialista. Algumas das mais aguerridas lideranças surgidas nos últimos anos na luta pela floresta são evangélicas, o que impede uma leitura fácil de um fenômeno complexo.

A política de destruição de Bolsonaro tem conseguido a façanha de, ao mesmo tempo, afastar essa parcela emergente de lideranças evangélicas e devolver ao palco lideranças católicas que começavam a perder protagonismo, assim como garantir a renovação de ativistas ligados à Igreja. A Romaria da Floresta deste ano, promovida em julho pela Comissão Pastoral da Terra, revelou uma participação impressionante de jovens. A caminhada costuma terminar no local onde Dorothy Stang foi assassinada com seis tiros. A placa que marca o acontecimento, presa a uma árvore, está perfurada de balas. É neste contexto que o Sínodo da Amazônia será realizado. Se o colapso climático garantia as atenções do mundo para o Vaticano, a floresta em chamas multiplicou a potência.

Em fevereiro, o Sínodo já era tratado pelo Governo como ameaça à “segurança nacional”. Hoje, a paranoia se instaurou. Já que desta vez Bolsonaro não pode usar sua aversão por mulheres como munição, como fez com Emmanuel Macron ao atacar sua esposa Brigitte, resta saber onde o ultradireitista vai mirar para dar um golpe baixo no Papa Francisco.

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