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Sergio Moro enfrenta sua primeira prova de fogo no Senado após vazamentos

Ministro pediu ao presidente do Senado para prestar explicações sobre teor das reportagens do 'The Intercept'. Ele também deve ir à Câmara em breve

O ministro Sergio Moro em cerimônia da Marinha.
O ministro Sergio Moro em cerimônia da Marinha.ADRIANO MACHADO (REUTERS)
Gil Alessi

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, enfrentará às 9h desta quarta-feira uma prova de fogo no Senado. Ele se ofereceu para ir à Comissão de Constituição Justiça e Cidadania da Casa esclarecer o conteúdo dos diálogos divulgados nas reportagens do The Intercept Brasil. A decisão de comparecer espontaneamente foi tomada com o objetivo de desidratar as articulações em torno de uma CPI para apurar o caso. Além disso, senadores já preparavam requerimentos para convocar o ministro, o que ampliaria o desgaste do Governo. Moro terá que lidar com uma bateria de questionamentos vindos da oposição e de parte do centrão a respeito das possíveis ilegalidades cometidas por ele e pelos procuradores da força-tarefa da Operação Lava Jato, em especial Deltan Dallagnol, coordenador do grupo. Também está prevista para o dia 26 de junho a ida do ex-juiz na condição de convidado à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara para um segundo round de questionamentos.

Até o momento o ministro e o Ministério Público Federal minimizaram as críticas de que foram alvo após a publicação dos diálogos. Em entrevista ao Estado de São Paulo Moro negou qualquer ilicitude e disse não reconhecer a autenticidade do material: "Eu não excluo a possibilidade de serem inseridos trechos modificados", afirmou, fazendo a ressalva de que "algumas coisas podem ter sido coisas que eu tenha dito". Esta deve ser a tese adotada pela tropa governista durante o questionamento a Moro na Comissão. Os senadores da base devem insistir na possibilidade de que as mensagens foram adulteradas por um hacker, além de apostar no fato de que o conteúdo foi supostamente obtido de forma ilegal, logo seu teor deveria ser desconsiderado.

Apesar da aparente calma com que o ex-juiz trata o assunto, o conteúdo divulgado até o momento dá munição de sobra para a oposição. Embasada pelo parecer de juristas, advogados e até ministros do Supremo Tribunal Federal, que condenaram o envolvimento e a ajuda de Moro a Dallagnol, os parlamentares devem insistir no discurso de que o magistrado foi parcial na condução dos processos —em especial no do ex-presidente Lula. Os principais questionamentos ao ministro no Senado devem girar em torno dos seguintes pontos:

Moro orientando Dallagnol

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Em diversos trechos do diálogo Moro orienta e dá dicas para o procurador. Os conselhos abrangem uma série de assuntos. O juiz sugere a troca de ordem de fases da Lava Jato, critica recursos do MPF, consulta o procurador com relação à abertura de sigilos e cobra mais rapidez: “Não é muito tempo sem operação?”, indaga nas conversas. Em uma das reportagens mais recentes de The Intercept, consta um trecho no qual Moro sugere a Dallagnol que os procuradores elaborem uma nota rebatendo a defesa de Lula, que teria dado "showzinho", segundo o magistrado. As orientações de Moro a Dallagnol são um dos pontos que mais foram criticados pela oposição e por juristas. A análise é que o juiz apresenta uma conduta parcial, orientando uma das partes (a acusação) e violando o principio da isenção que se espera do magistrado.

Até o momento o ministro minimizou qualquer malfeito: "não tem nenhum comprometimento das provas, das acusações, do papel separado entre o juiz, o procurador e o advogado". Dallagnol afirmou que “conversas entre advogados e procuradores e o juiz sem a presença da outra parte são normais”. Boa parte da comunidade jurídica discorda desta leitura, e aponta que, da maneira como foi conduzido o diálogo, fica evidente a tentativa do magistrado de ajudar a acusação, o que pode provocar a suspeição do mesmo e, em último caso, a anulação de processos.

Moro indica testemunha

Em outro trecho Moro viola novamente as atribuições de seu papel de juiz ao indicar uma testemunha para ajudar o procurador Dallagnol. Segundo ele, trata-se uma pessoa que potencialmente poderia prejudicar o ex-presidente Lula, então em liberdade. “Seguinte: fonte me informou que a pessoa do contato estaria incomodada por ter sido ela solicitada à lavratura de minutas de escrituras para transferências de propriedade de um dos filhos do ex-presidente [Lula]. Aparentemente, a pessoa estaria disposta a prestar a informação. Estou então repassando. A fonte é séria”, escreveu Moro. O nome desta potencial testemunha não é revelado nos diálogos divulgados. A sugestão de testemunhas ou fontes por parte do juiz é uma prática irregular, violando a imparcialidade do magistrado, que não pode aconselhar as partes do processo. Dallagnol agradece a gentileza do juiz e afirma que entrará em contato.

Sobre este ponto Moro afirmou ao Estadão que "tudo o que chegava que era relevante, ou a gente encaminhava para a polícia ou Ministério Público, seja lá se a informação eventualmente beneficiava defesa ou acusação", e que o objetivo era "descobrir a verdade".

Dallagnol diz para Moro que irá plantar denúncia anônima falsa

Logo após Moro indicar uma testemunha para a acusação, Dallagnol agradece e diz que irá atrás da pessoa. Minutos depois, o procurador responde: “Liguei e ele arriou [desistiu]. Disse que não tem nada a falar etc… Quando dei uma pressionada, desligou na minha cara… Estou pensando em fazer uma intimação oficial até, com base em notícia apócrifa”. Apesar de haver previsão legal para o uso de notícia apócrifa, também conhecida como denúncia anônima, ela jamais poderia partir de um procurador do caso.

Da forma proposta por Dallagnol, a denúncia poderia ser encaminhada de duas maneiras. A primeira, ser repassada para algum veículo de imprensa e, posteriormente, serviria como base para que a pessoa mencionada fosse intimada a depor. O segundo seria o procurador afirmar ter recebido denúncia anônima envolvendo a fonte em questão. Especialistas ouvidos dizem que o método sugerido por Dallagnol é ilegal, equivaleria a uma fraude processual. Moro, que poderia ter desaconselhando o uso do expediente irregular colocando um ponto final na questão, se resume a sugerir que tudo seja formalizado: “Estranho pois ele é quem teria alertado as pessoas que me comunicaram. Melhor formalizar, então”. Pelo trecho divulgado no The Intercept não se sabe se o expediente foi colocado em prática ou não.

Politização da força-tarefa e da Justiça

Moro também deve ser instado a comentar mensagens relacionadas ao movimento antipetista. Em mensagem trocada após manifestações de rua pela saída da então presidenta Dilma Rousseff, em março de 2016, ele é parabenizado por Dallagnol: “Parabéns pelo imenso apoio público hoje. Você hoje não é mais apenas um juiz, mas um grande líder brasileiro (ainda que isso não tenha sido buscado)”. Moro responde: “Parabéns a todos nós”.

Mensagens falsas

A tropa governista deve bater na tecla de que um hacker, suposto responsável por invadir os aparelhos celulares dos procuradores pode ter forjado conversas com o intuito de comprometer as partes —Moro diz que seu telefone foi clonado, mas não foram obtidos dados; o The Intercept Brasil não revela como obteve as informações. Apesar do ministro e do MPF terem inicialmente publicado notas nas quais não negavam a autenticidade das conversas divulgadas, esta tese das mensagens forjadas ganhou tração após um hacker ter acessado o telefone de integrantes do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e se passado por um deles na semana passada. Esta tese, no entanto, esbarra em alguns problemas. Primeiro: nada garante que a pessoa que violou os equipamentos dos membros do CNMP seja a mesma que obteve os dados de Moro e dos procuradores de 2015 a 2017. E, segundo, o argumento é enfraquecido pelo fato de que inicialmente tanto o ministro quanto o MPF apenas criticaram a divulgação das conversas sem denunciar a eventual falsidade das mensagens.

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