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Bento XVI situa a origem da pedofilia na Igreja em Maio de 68

O Papa emérito escreve um documento de 18 páginas no qual garante que nessa época “a pedofilia também foi diagnosticada como permitida e apropriada”

Daniel Verdú
O Papa emérito, Bento XVI, em uma imagem de 2015.
O Papa emérito, Bento XVI, em uma imagem de 2015.GREGORIO BORGIA (AP)

Joseph Ratzinger, o papa emérito Bento XVI, quebrou seu silêncio e publicou um documento de 18 páginas no qual analisa algumas das causas da praga dos abusos sexuais de menores que assola a Igreja Católica. Como resultado da cúpula realizada pelo Vaticano em fevereiro, o texto, intitulado A Igreja e os Abusos Sexuais, aponta alguns fundamentos teológicos para lidar com um dos momentos mais complicados da Igreja Católica. No entanto, o texto vai muito além da esfera eclesiástica e, de certo modo, atribui o problema a uma evolução dos costumes sexuais produzida em toda a sociedade e originada durante a revolução sexual dos anos sessenta. Além disso, culpa em parte "uma justiça garantizadora" para com os padres por sua impunidade e também a falta durante anos de punições mais severas.

O texto está dividido em três partes e deve ser publicado no semanário católico alemão Klerusblatt na Semana Santa, segundo a AciPrensa. Mas foi vazado pelo The New York Post e outras mídias. O documento está estruturado em três partes. Na primeira, apresenta o contexto histórico desde a década de sessenta. De fato, situa o epicentro da origem da questão na revolução de Maio de 68 e no colapso espiritual que supostamente produziu. "Pode-se dizer que nos 20 anos entre 1960 e 1980 os padrões até então vinculativas em relação à sexualidade entraram completamente em colapso e surgiu uma nova normalidade, que até agora tem sido objeto de várias tentativas laboriosas de disrupção". Mas o Papa emérito vai mais longe na demonização desse período e afirma que "parte da fisionomia da Revolução de 68 foi que a pedofilia também foi diagnosticada como permitida e apropriada”.

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Na segunda parte, refere-se ao impacto que teve uma certa decadência moral daquele período nos sacerdotes; e, na terceira, lança uma proposta para enfrentar uma situação que, segundo ele, "não foi aguda até meados dos anos 80". O texto, no entanto, não fornece referências claras sobre como erradicar os abusos sexuais de menores dentro da Igreja e conclui que a pedofilia atingiu "essas proporções" ante a "ausência de Deus".

Ratzinger, como não poderia ser de outra forma, explica que escreveu o texto de acordo com a Secretaria de Estado do Vaticano e com o próprio papa Francisco. "A extensão e a gravidade dos incidentes relatados desconcertaram padres e leigos, e fizeram com que muitos questionassem a própria fé da Igreja", começa o Papa emérito, referindo-se à origem da cúpula do Vaticano de fevereiro. "Foi necessário enviar uma mensagem forte e buscar um novo começo para tornar a Igreja novamente digna de crédito como uma luz entre os povos e como uma força que serve contra os poderes da destruição."

Em sua análise, que, inevitavelmente será interpretada como um reforço teológico para uma cúpula mais focada nas questões práticas e desprovida de conteúdo doutrinal, Bento se refere a uma certa irrupção do relativismo moral no qual já não existe o bem e o mal. Mas só aquilo que "conforme a circunstância é relativamente melhor".

O Papa emérito se concentra muito na experiência vivida em sua juventude na Alemanha e fala de "clubes de homossexuais" formados "em vários seminários, que atuavam mais ou menos abertamente", e que "mudaram significativamente o clima que se vivia neles". São curiosas algumas revelações que ele faz agora, como que "em um seminário no sul da Alemanha, os candidatos ao sacerdócio e ao ministério laico de especialistas pastorais viviam juntos e os casados às vezes até estavam com sua mulher e filhos; e às vezes com suas namoradas".

Ratzinger também se refere aos bispos que rejeitaram a tradição católica em nome de um "catolicismo moderno". Um problema que, segundo explica, era conhecido da Santa Sé. Além disso, defende o papel de João Paulo II neste assunto, embora agora algumas correntes modernas tentem desacreditá-lo. Com ele, diz Bento, chegou-se à conclusão de que a Congregação para a Doutrina da Fé (na época Ratzinger foi prefeito desse dicastério) deveria ser dotada da autoridade e mecanismos para julgar e punir alguns crimes que uma justiça "garantizadora" demais era incapaz de controlar.

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