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Coluna
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Escola de Chicago floresce no autoritarismo

Esse estranho vínculo entre os modelos autoritários e o ultraliberalismo pode se repetir no Brasil

Joaquín Estefanía
Fotograma de 'Chicago Boys', documentário do 2015.
Fotograma de 'Chicago Boys', documentário do 2015.

Por que a Escola de Chicago e suas teorias econômicas ultraliberais se dão melhor nas ditaduras e nos modelos autoritários que nas democracias consolidadas? Possivelmente porque, para serem implementadas, é preciso que as resistências cidadãs ante a desigualdade que geram não tenham força para se manifestar no seio da sociedade civil. É por isso que os laboratórios mais puros dos Chicago Boys se instalaram nas ditaduras militares do Cone Sul latino-americano dos anos setenta e na Turquia militar do passado. E, possivelmente, terão outra oportunidade no Brasil de hoje se o ultradireitista Jair Bolsonaro vencer as eleições.

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Essa estranha união entre anarcocapitalistas e golpistas (e assimilados) se repetirá outra vez, confirmando a tese, caso se tornem realidade as análises que praticamente de forma unânime dão ao Chicago boy Paulo Guedes a direção do superministério econômico no Brasil de Bolsonaro. Este manifestou sua nostalgia em relação à ditadura brasileira, protecionista e intervencionista, mas declarou que, ante sua absoluta ignorância econômica, cedeu seu programa nessa matéria, e cederá previsivelmente sua política econômica, ao banqueiro ultraliberal de 69 anos, que basearia sua ação numa intensa política de privatizações do setor público empresarial (petróleo, eletricidade, Correios...) e numa reforma fiscal que reduziria os impostos aos mais privilegiados sob o argumento de que são eles os que mais investem (Guedes falou sobre uma alíquota única de 20% no imposto de renda de pessoa física). Também falou de um novo regime previdenciário com base no sistema de capitalização, seguindo os passos do que foi feito no Chile de Pinochet. Doutor pela Escola de Chicago, Guedes tem familiaridade com as políticas implantadas no Chile da ditadura. O autor da reforma previdenciária chilena, José Piñera, é irmão de Sebastián Piñera, atual presidente do país, que recentemente declarou na Espanha que a música do programa econômico de Bolsonaro soava bem aos seus ouvidos. Além disso, Guedes se pronunciou contra o “Estado máquina”, contra um Estado disfuncional que concentra privilégios corporativistas e proveniente de um modelo centralizador que vem da ditadura militar (1964-1985) e que Lula e Dilma não conseguiram reformar. Veremos como serão resolvidas as contradições entre o protecionista Bolsonaro (“Mais Brasil, menos Brasília”) e o ultraliberal Guedes. A vitória de Bolsonaro no primeiro turno soou como música celestial nos mercados, e o real se apreciou com relação ao dólar.

Milton Friedman, pai intelectual dos Chicago Boys, visitou Pinochet nos anos mais duros de sua ditadura, em meados dos anos setenta. Acompanhado por sua mulher, Rose, ele fez fotos com o militar golpista, que foram publicadas nas capas de todos os jornais e serviram como fator de legitimação. Friedman foi também um dos fundadores da Mont Pelerin, uma espécie de Internacional econômica ultraliberal, que se reuniu em Santiago (outra forma de legitimação). Na ocasião, ele passou antes por Lima, onde um jovem Mario Vargas Llosa o entrevistou na TV e lhe perguntou se tinha alguma dúvida moral ao observar que suas teorias eram aplicadas geralmente em países com Governos autoritários. “Não”, respondeu um Friedman que estava a ponto de receber o Nobel de Economia. “Não gosto dos Governos autoritários, mas busco o mal menor.”

Foram os seus discípulos chilenos – Sergio de Castro, Sergio de la Cuadra, Rolf Lüders, Álvaro Bardón, Hernán Büchi, entre outros – que se ofereceram a Pinochet, proporcionaram a ele seu programa econômico ultraliberal e governaram a área econômica do pinochetismo nos anos de chumbo, quando nem os partidos políticos nem os sindicatos podiam se mobilizar. Ditadura política mais ultraliberalismo econômico, eis a fórmula do pinochetismo. Isso ocorreu também, com pequenas diferenças, três anos depois na Argentina de Videla, onde o czar econômico, José Alfredo Martínez de Hoz, juntamente com seus principais colaboradores, identificou-se com o monetarismo de Friedman.

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