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Um sarau para Hilda Hilst (antes que Paraty vire parada eleitoral)

Flip começa com Fernanda Montenegro encarnando a homenageada da festa. Pré-candidatos à presidência farão campanha nos eventos paralelos

Fernanda Montenegro lê crônica política de Hilda Hilst na Flip
Fernanda Montenegro lê crônica política de Hilda Hilst na FlipWalter Craveiro/Divulgação
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A Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), que vai até este domingo, começou como prometido: densa e voltada para o mundo interior. O tom, como a curadora da festa, Joselia Aguiar, havia dito em entrevista ao EL PAÍS, é todo hilstiano: um mergulho em temas como transcendência, morte, Deus, amor. Tudo bem ao estilo literário de Hilda Hilst, a escritora homenageada desta 16ª edição do evento. Tachada como difícil e hermética durante a vida, Hilst escreveu incansavelmente, mas, só agora, começa a alcançar um sucesso de público que não teve em vida. Ressaltado a intenção de promover uma Flip mais intimista, a curadora não deixou, contudo, de traçar paralelos entre Lima Barreto, homenageado da edição passada, e Hilst. “Lima escreveu ‘a literatura ou me mata ou me dá o que peço dela’ e essa frase poderia ter sido dita por Hilda”, disse.

Com projetos literários muito diferentes, um calcado no real, na vida social, outro inspirado na transcendência e morte, ambos autores tiveram dificuldades com a publicação de suas obras. Lima Barreto, em grande parte, por ser negro e ter um caráter insubmisso; Hilda Hilst pelo mesmo traço de caráter, mas por ser mulher. Se os temas que dão abertura para uma Flip mais politizada também estão presentes, como ressaltou Aguiar, a abertura do evento, contudo, passou ao largo deles. Um dos nomes mais esperados do evento, a atriz Fernanda Montenegro, da mesma geração de Hilst, subiu ao palco para fazer uma leitura emocionada de alguns textos da autora. Em algumas passagens, mais densas, falou sobre a fama de hermética e os poucos leitores que tinha: “Quero ser lida em profundidade e não como distração”, “Leiam-me, não me deixem morrer”.

O clima hilstiano, a que a curadora da Flip se referia, contudo, veio pra valer mesmo com os dois números musicais de Jocy de Oliveira, que, também contemporânea de Hilst, subiu ao palco depois da atriz. Primeiro, duas sopranos alternaram-se na peça “Ouço vozes que se perdem nas veredas que encontrei”, de 1981, escolhida por Oliveira por dialogar com o tema da morte, tão próximo da obra de Hilst. Pairou, então, um clima fantasmagórico no auditório, que aproximou o público das gravações que Hilst fazia nos anos 1970, numa tentativa de falar com os mortos. Para encerrar, a segunda peça musical foi a ópera Medeia, uma das personagens mais impressionantes da mitologia grega, que comete matricídio. Na peça musical de Oliveira, Medeia aparece gritando contra sua condição de mulher subjugada, a favor do direito de ser diferente, ressaltando o fato de ser estrangeira, miscigenada, livre. Oliveira, quando explicava as escolhas das peças para a abertura, disse ao final, para aplausos do público: “Nós, mulheres, somos todas Hilda”.

Morte, transcendentalidade e liberdade feminina: assim o espírito de Hilst esteve presente durante toda a abertura, que, segundo Aguiar, dará o tom de toda a curadoria. Assim, ao que tudo indica, é fora da programação principal, nas cerca de 20 casas parceiras que a Flip tem esse ano, que o evento deve ganhar ares mais políticos - como tem acontecido nos últimos anos. Os presidenciáveis Manuela D’Ávila, Guilherme Boulos, além do ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad e o ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso são alguns dos nomes que estão confirmados para os eventos paralelos.*

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