_
_
_
_
Crítica
Género de opinião que descreve, elogia ou censura, totalmente ou em parte, uma obra cultural ou de entretenimento. Deve sempre ser escrita por um expert na matéria

‘A Lei é Para Todos’, um filme nocauteado pela tragicomédia real da Lava Jato

Problemas de roteiro e maniqueísmo agravam dificuldades da obra lançada neste 7 de Setembro

O diretor explica cena aos atores.
O diretor explica cena aos atores.Ique Esteves/Divulgação

Polícia Federal - A Lei é Para Todos mostra, já desde o título, qual a perspectiva escolhida pelo filme que almeja ser um blockbuster sobre os primórdios da Operação Lava Jato. Os heróis são da PF - e o epíteto vale até para o infame agente “japonês” que mesmo condenado pela Justiça ganhou espaço na tela. Dito isso, é pouco razoável cobrar que a obra reflita a fundo sobre as contradições da investigação como também ingênuo esperar que ela consiga ser analisada isoladamente. Um problema incontornável do filme é justamente esse, a justaposição com a tragicomédia real que o nocauteia de partida. Enquanto vemos o primeiro capítulo da saga – a fita vai até março de 2016, ou seja, estamos ainda no Governo Dilma e Lula é o vilão do filme que tenta fugir da cadeia se tornando ministro – , do lado de fora do cinema a trama segue a toda, com novos e turbinados vilões enganando os mocinhos em tempo real, dinheiro em bunker, dinheiro caindo do bolso de paletó...

A direção de Marcelo Antunez não ignora a questão e tenta explicitar ao máximo o to be continued - os produtores prometem filmar uma sequência em breve. Há a inserção de um teaser e de trechos reais dos vídeos das delações. É um bom truque, mas que não deixa de reforçar o contraste da ficção com a alta potência dramatúrgica dos relatos reais de corrupção explícita. Planta-se também, na boca de um dos melhores personagens da trama, o delegado da PF vivido pelo ótimo Antonio Calloni, algumas dúvidas sobre “interesses ocultos” e consequências políticas da Lava Jato, uma alfinetada aqui e ali no Supremo Tribunal Federal. É outro bom truque que, vide as reviravoltas da operação, soa menos como contraponto do que como uma espécie de precaução.

Mais informações
Eliane Brum: 'A lei não é para todos'
Delatores da Lava Jato: penas menores do que o previsto e patrimônio mantido
No Brasil, muito escândalo político para poucos filmes nacionais do gênero

Mas as boas sacadas param por aí. Mesmo com a carência de filmes de ação no cinema nacional  – um filão a explorar de forma competente, como já mostrou Cidade de Deus e Tropa de Elite –, o roteiro abandona rápido demais o lado mais dinâmico de seus heróis da PF, com perseguições bem executadas e boas apostas como o doleiro malandro Alberto Yousseff, para logo entrar numa espécie de modo Jornal Nacional editado sobre a Lava Jato. Num momento a tela se enche com uma sequência de manchetes de jornais com escândalos do passado. Noutro entra até uma animação solta sobre os desmandos no tempo da colônia. Tudo isso é para mostrar, em meio à perigosa pregação contra "todos os políticos bandidos” e sempre foi assim, que Lula não é o vilão isolado? Mesmo com a narração frisando que o mensalão foi o maior escândalo de todos? Não funcionou.

O trecho final do filme é dedicado a falar das acusações contra o petista – só ele e os empresários tem os nomes reais usados no filme. Duvido que os não consumidores intensos do noticiário entendam tudo. Mais grave do que isso: há sínteses e raciocínios que parecem até passíveis de contestação legal por parte da defesa do ex-presidente, já que ele ainda não foi condenado judicialmente por elas. Ainda assim, e já descontando a polêmica sobre patrocinadores ocultos e uso político em 2018 (as fake news fazem muito melhor trabalho e com muito menos dinheiro que uma produção cinematográfica, diga-se), isso não é o pior do filme. Nem mesmo os espantosos ternos brilhosos de Sérgio Moro reproduzidos no figurino de Marcelo Serrado são o pior. O ponto mais baixo do filme, sem dúvida, é a escolha de Ary Fontoura, com déficit de carisma e vigor, para interpretar Lula. A metade do país que ama odiar o petista - e deve gostar filme - merecia um ator mais crível para a tarefa.

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo

¿Quieres añadir otro usuario a tu suscripción?

Si continúas leyendo en este dispositivo, no se podrá leer en el otro.

¿Por qué estás viendo esto?

Flecha

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo y solo puedes acceder a EL PAÍS desde un dispositivo a la vez.

Si quieres compartir tu cuenta, cambia tu suscripción a la modalidad Premium, así podrás añadir otro usuario. Cada uno accederá con su propia cuenta de email, lo que os permitirá personalizar vuestra experiencia en EL PAÍS.

En el caso de no saber quién está usando tu cuenta, te recomendamos cambiar tu contraseña aquí.

Si decides continuar compartiendo tu cuenta, este mensaje se mostrará en tu dispositivo y en el de la otra persona que está usando tu cuenta de forma indefinida, afectando a tu experiencia de lectura. Puedes consultar aquí los términos y condiciones de la suscripción digital.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_