Temer tem apoio popular, ainda que seja envergonhado ou enrustido
O silêncio nas ruas durante a votação da denúncia contra o presidente mostra que muitos brasileiros podem odiar o mandatário, mas preferem suportá-lo até 2018
Você aprova ou rejeita o Governo Temer? Há uma grande chance de que você, leitor ou leitora, esteja entre os 95% que rechaçam o presidente brasileiro por suas práticas pouco republicanas, como mostrou a pesquisa do Ibope da semana passada. Mas, ainda que essa seja sua resposta, há uma chance de que no fundo, no fundo, você prefira manter as coisas como estão e esperar 2018. E, ainda que desconfiando, está dando um voto de confiança pela melhoria da economia. Os entrevistados pelo Ibope disseram que desaprovam o Governo Temer, mas não disseram que queriam que ele saísse já.
Um outro levantamento do instituto, divulgado na segunda (31), revelou que 81% das pessoas esperavam que os deputados aceitassem a denúncia. Mas, não sei se diriam a mesma coisa numa prosa animada sentados à mesa de um boteco com amigos de longa data. O retrato do silêncio popular com tímidos protestos nesta quarta, enquanto a Câmara arquivava a denúncia por corrupção passiva contra o presidente, mostra muito mais que o brasileiro age conforme o que ele realmente pensa: apesar de ruim, melhor ele ficar.
Nem mesmo o fato de a rede Globo ter deixado de lado o seu principal noticiário e a novela das 9 gerou algum efeito. Na recepção de um consultório médico de São Paulo, no dia da votação, um grande telão transmitia a votação em tempo real. Mas as pessoas ali presentes não prestavam atenção, estavam olhando os respectivos celulares.
A ideia de que o desânimo com a política procrastinou os brasileiros não me parece tão certa. Em conversas informais, dá para perceber que ninguém se atreve a defender o presidente com vigor, e nem consegue apontar algum gesto marcante de sua gestão. Na atual conjuntura, com todas as denúncias na mesa, pega mal defender Temer. Mas, o temor de que o que está ruim na economia fique pior com outro desconhecido colou sim, e a ideia de duas trocas de presidentes em um ano é um pouco forte para esta parcela.
Tenho, também, um palpite de que dois fatores paralisaram aqueles que se dizem de esquerda e de direita – muito embora essa classificação seja rasa e fajuta. Tire os organizadores dos protestos, que defendem interesses. O povo mesmo, o arquiteto, a professora, o microempresário que se sentiu feliz de ir à avenida Paulista, em São Paulo, protestar contra os desmandos do Governo Dilma, entende que contribuiu com o quadro atual. Prefere, assim, pagar esse pedágio que é esperar até 2018, para não colocar em risco os parcos ganhos da economia. Que o diga a classe média diante de um dólar e a inflação em baixa. Algo vingou e esses dois indicadores seriam a prova. Para eles, é fato que Temer está pagando a fatura deixada por Dilma. Daí, é como tentar mandar embora um parente chato que está hospedado em casa por um mês. Expulsá-lo pode gerar uma crise familiar maior do que o incômodo por mais uns dias.
Pelo lado dos que defendiam a petista, debatem-se diversas explicações. A falta de unidade é uma. Vi lulistas, por exemplo, preferirem não validar a denúncia contra Temer, que partiu de uma delação premiada conduzida pela Lava Jato. A mesma operação que está no calcanhar de Lula e o acusa de crimes a partir de... delações. Protestar em público para que Temer fosse denunciado seria legitimar a Lava Jato? Talvez.
Outro grupo que foi contra o impeachment se sente indignado ao ver colegas à esquerda defendendo cegamente o ex-presidente que pode ser preso, sem lhe atribuir uma responsabilidade sequer. Fragmentam-se ainda mais os grupos que se opõem ao atual Governo, num conjunto de bolhas separadas que não fazem verão.
Arrisco-me a dizer que, neste silêncio, outro padrão de comportamento brasileiro aparece. Temer ainda se beneficia de uma certa casca que o PT no poder perdeu depois de 13 anos. Uma certa tolerância que o eleitor brasileiro demonstra, suportando o que não gosta. Suportou o PT depois do mensalão, por exemplo, e reelegeu Lula e logo após, sua sucessora. Em outras palavras, Temer ainda não encheu o copo, portanto a denúncia não é a gota d’água. Dilma teve vários lances que rasgaram essa casca. Desde os gastos exagerados com a Copa do Mundo, as jornadas de junho de 2013, a propaganda eleitoral contra Marina Silva, o estouro da inflação...
Temer começou a conduzir o Brasil com o apoio popular dos opositores de sua antecessora. Dilma fora. Ponto. A massa que foi às ruas no ano passado não é cientista político ou especialista no assunto para fazer cálculos profundos ou matemáticos sobre eventuais retrocessos, seja na distante Amazônia, ou na educação de quem mora na periferia. O impeachment de Dilma chegou quando a petista já tinha um desgaste irreversível, algo que, aparentemente, Temer ainda não tem. Parece pairar sobre ele um certo benefício da dúvida entre esses apoiadores enrustidos. E afinal de contas... 2018 está logo ali. Na cabeça do temerista envergonhado, por que não suportar um pouco mais?
Tu suscripción se está usando en otro dispositivo
¿Quieres añadir otro usuario a tu suscripción?
Si continúas leyendo en este dispositivo, no se podrá leer en el otro.
FlechaTu suscripción se está usando en otro dispositivo y solo puedes acceder a EL PAÍS desde un dispositivo a la vez.
Si quieres compartir tu cuenta, cambia tu suscripción a la modalidad Premium, así podrás añadir otro usuario. Cada uno accederá con su propia cuenta de email, lo que os permitirá personalizar vuestra experiencia en EL PAÍS.
En el caso de no saber quién está usando tu cuenta, te recomendamos cambiar tu contraseña aquí.
Si decides continuar compartiendo tu cuenta, este mensaje se mostrará en tu dispositivo y en el de la otra persona que está usando tu cuenta de forma indefinida, afectando a tu experiencia de lectura. Puedes consultar aquí los términos y condiciones de la suscripción digital.
Mais informações
Arquivado Em
- Rodrigo Maia
- Rodrigo Janot
- Operação Lava Jato
- Joesley Batista
- Eleições Brasil 2018
- Opinião
- Michel Temer
- Câmara Deputados
- Crises políticas
- JBS
- Presidente Brasil
- Presidência Brasil
- Congresso Nacional
- Corrupção política
- Governo Brasil
- Conflitos políticos
- Brasil
- Governo
- Força segurança
- Administração Estado
- América
- Empresas
- Política
- Administração pública
- Economia