Metamorfose política do Brasil em 2016 ainda não mostra vencedores
De Dilma Rousseff a Bolsonaro, o que aconteceu com a classe política e suas pretensões no próximo ano
Marcado por um terremoto político, o ano de 2016 teve impeachment de uma presidenta, cassação do ex-presidente da Câmara que impulsionou o impedimento dela, o presidente do Senado descumprindo ordem judicial e as velhas discussões internas entre os aliados do atual Governo. Foi um ano em que Inimigos ocultos se fizeram públicos, e personagens até então irrelevantes ganharam estatura. Brasília viveu uma verdadeira metamorfose dos principais personagens do panteão político nos últimos 12 meses.
O até então discreto vice-presidente Michel Temer, por exemplo, ganhou ares de dissimulado e uma figura com a pecha de traidor. O conciliador senador Renan Calheiros virou um incendiário chefe de Poder gerando uma intensa crise com o Judiciário e o Ministério Público. E o ex-todo-poderoso deputado Eduardo Cunha, agora é um preso especial em uma cadeia que já serviu de hospital psiquiátrico em Curitiba, a república da operação Lava Jato. Abaixo, as principais figuras do cenário político brasileiro para os próximos meses e as que deixaram a cena, ainda que pela porta dos fundos. Na relação há ex-presidentes, deputados federais, senadores e alguns dos presidenciáveis que despontarão no noticiário até 2018.
Michel Temer (PMDB)
Visto como um discreto e ponderado político de bastidores, notou a fragilidade da presidenta Dilma Rousseff e se desligou dela, já no fim de 2015, quando percebeu que poderia deixar de ser um vice decorativo (como ele próprio se definiu em uma carta endereçada a ela) e se tornar presidente. Incentivou seus articuladores a darem andamento ao impeachment. Assumiu o Governo brasileiro temporariamente em maio e efetivamente em agosto montando um ministério exclusivamente masculino. Suas escolhas para a área econômica (lideradas por Henrique Meirelles), em princípio, receberam elogios, mas com o tempo já passam a ouvir críticas pela demora na recuperação econômica. Na área política, seus ministros enfrentam uma série de investigações. Sua experiência no Legislativo o gabaritou para ter um dos maiores apoios no Congresso Nacional e fez com que ele conseguisse aprovar medidas que considera essenciais para a economia, como a PEC do Teto de Gastos.
Renan Calheiros (PMDB-AL)
Mudou seu estilo. De um senador conciliador, passou a ser incendiário. Primeiro, durante o processo de impedimento de Rousseff patrocinou uma jabuticaba legislativa. Conseguiu fazer com que os senadores cassassem a presidenta, mas não seus direitos políticos – conforme previa a Constituição e a Lei do Impeachment. Pouco tempo depois, quando cresceram as suspeitas contra ele na Lava Jato, promoveu uma série de medidas que visavam retaliar os investigadores, como os projetos do abuso de autoridade e a redução de salários de juízes e promotores. Chamou de “juizeco”, um magistrado que mandou prender policiais legislativos suspeitos de obstruir investigações. Teve uma denúncia aceita pelo Supremo pelo crime de peculato. Por fim, decidiu que não iria cumprir uma ordem do ministro Marco Aurélio Mello, do STF, que o afastou da presidência do Senado por entender que réus não podem estar na linha sucessória da Presidência da República. Como a decisão foi modificada pelo plenário da Corte, nas redes ele foi visto como um dos políticos mais influentes do país. Houve até memes que diziam: “Manda quem pode. Desobedece quem tem juízes”.
Rogério Rosso (PSD-DF)
Deputado federal em seu primeiro mandato, foi o presidente da Comissão Especial do Impeachment na Câmara. Antes de se tornar parlamentar, chegou a ser eleito governador-tampão do Distrito Federal em 2010, ao substituir, por eleição indireta, José Roberto Arruda, afastado por denúncias de corrupção. Foi eleito em 2014 pelo PSD. Rosso foi um dos que comandaram o desembarque de seu partido da gestão Rousseff e o consequente embarque no grupo de Temer. Membro do Centrão, concorreu para substituir Eduardo Cunha no mandato tampão na presidência da Câmara. Perdeu para Rodrigo Maia (DEM-RJ), mas ganhou prestígio junto ao atual presidente. Participa de reuniões estratégicas para debater a crise política e tem se cacifado para ser uma das novas caras da gestão do peemedebista no Congresso. Dependendo do cenário político de 2017, pode ser um dos candidatos à presidência da Casa novamente.
Eunício Oliveira (PMDB-CE)
O senador cearense foi apontado por um ex-executivo da Odebrecht como um dos mais influentes do PMDB no Congresso. Deverá suceder Renan Calheiros na presidência do Senado e tem prestígio junto a Temer. Já foi muito próximo a Dilma Rousseff e a Lula, mas rompeu com ambos quando eles deixaram de apoiar sua candidatura ao Governo do Ceará em 2014. Derrotado pelo petista Camilo Santana, ele rapidamente abandonou a gestão Rousseff no Legislativo.
Rodrigo Maia (DEM-RJ)
Assumiu um mandato-tampão de oito meses em substituição a Eduardo Cunha na presidência da Câmara, quando este foi cassado. Sua eleição foi bancada pelo governo Michel Temer para tentar frear a ascensão do Centrão. Tem participado de todos os debates internos da gestão Temer e atua, praticamente, como o líder do presidente na Câmara. Pelo atual regimento interno, não poderia concorrer à reeleição dentro de uma mesma legislatura. Porém, já busca argumentos jurídicos para fazer uma manobra que o mantenha mais dois anos na função. Seus movimentos contam com o apoio de influentes membros do PMDB e de alguns figurões do PSDB. Se Temer confirmar um tucano na função da Secretaria de Governo, todo o partido se juntaria à tese de Maia.
Jovair Arantes (PTB-GO)
Outro deputado federal membro do Centrão que deverá dar trabalho a Michel Temer. Foi o relator da comissão especial do impeachment de Rousseff e, desde então, tenta conseguir apoio para comandar a Câmara. Era próximo de Eduardo Cunha a quem disse que seguiria “até debaixo d’água”. Agora, em seu sexto mandato consecutivo, tem o apoio de seu partido para angariar esse voo até a chefia da Câmara. Já disse que, independentemente da decisão de Temer, sairá candidato. É considerado um dos membros mais atuantes da bancada da bola, evitando a instalação da CPI do Futebol na Câmara. Foi dirigente do Clube Atlético Goianiense, uma das equipes brasileiras que disputará a primeira divisão em 2017. Chegou a ser citado nas investigações que envolveram o bicheiro Carlinhos Cachoeira e o senador cassado Demóstenes Torres (ex-DEM-GO). Apesar de já ter sido um fiel aliado do PT, quando foi vice-prefeito de Goiânia na chapa encabeçada por um petista, virou um dos mais duros críticos da legenda.
André Moura (PSC-SE)
Um deputado até então inexpressivo que vivia a reboque de Eduardo Cunha mostrou que, no atual Congresso, qualquer governo depende de acordos com o Centrão. Virou líder do a base governista após a assunção de Temer ao poder. Mesmo sendo de uma legenda pequena, tem influência no Planalto. Alvo de aliados, tem algumas debilidades que podem afetar qualquer sonho em alçar voos maiores. Um exemplo, na tentativa de Estados e Municípios de obterem novos recursos junto ao projeto de repatriação, Moura se omitiu na discussão e viu o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, assumir o papel informal de defensor da gestão Temer. Ao contrário de líderes de outras gestões, Moura raramente toma a frente ou é protagonista nos debates mais profundos no Legislativo.
Jair Bolsonaro (PSC-RJ)
Polêmico deputado federal, o conservador militar aposentado tem sido elevado ao posto de pré-candidato à presidência. Defensor de torturadores da ditadura militar (algo que ficou claro no processo de impeachment de Rousseff) é apontado como um dos mais expressivos representantes da extrema direita brasileira. Em 2017, caso não apare as arestas com a cúpula de seu partido, deverá migrar de legenda e levar consigo parte dos filiados que hoje dão suporte ao PSC. A reclamação do comando do PSC é exatamente o fato de Bolsonaro não ser controlável. Às vezes, seus posicionamentos assustam até os mais conservadores religiosos vinculados a esse partido.
Marina Silva, Ciro Gomes e Joaquim Barbosa
Sem mandatos, os três tentam garantir seus nomes para a disputa presidencial de 2018. A ex-senadora Marina Silva, da REDE, aparece como a favorita nas principais pesquisas eleitorais para 2018. Precisará, no entanto, fortalecer seu partido e preparar um leque de alianças para se viabilizar. O ex-governador do Ceará Ciro Gomes, mudou do PROS para o PDT com a promessa de que será uma alternativa da esquerda na eleição. Tem percorrido o Brasil para voltar a ser conhecido e tenta articular outras legendas no entorno de seu nome. Joaquim Barbosa, que já presidiu o STF, nega que concorrerá a qualquer cargo, mas várias legendas o sondam desde que deixou o tribunal. Tem como marca positiva ter atuado firmemente no julgamento do mensalão petista, mas seu comportamento explosivo pode atrapalhá-lo.
Ronaldo Caiado (DEM-GO)
Produtor rural, senador e médico, é um dos pré-candidatos à presidência em 2018. Apesar de ser um aliado de primeira hora da gestão Temer, quer tentar mostrar certa independência. Diz, por exemplo, que nenhum político deve ter medo de eleição. Reforçou sua equipe de comunicação já pensando no que há porvir. E quase semanalmente força debates com Lindbergh Farias ou outro representante do PT.
Aécio Neves (PSDB-MG)
De liderança inquestionável do PSDB a chefe de um partido rachado. O senador mineiro que perdeu a eleição para Rousseff em 2014, tentará se reafirmar em 2017 como o nome mais viável para a legenda apresentar um concorrente para a sucessão presidencial. Já foi citado recentemente em operações policiais. Internamente, terá de se digladiar com Geraldo Alckmin, o governador de São Paulo que se fortaleceu após eleger um outsider para a capital de seu Estado.
Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
Ex-presidente da República tentou, em vão, ajudar Rousseff a se manter no cargo. Mas a série de processos judiciais que enfrenta não colaboraram para seu intento. Atualmente é réu em cinco ações criminais, sendo três delas na operação Lava Jato. Como não possui a prerrogativa de foto diferenciado, pode ser preso com uma simples canetada. A conclusão dessas investigações policiais serão fundamentais para definir o cenário político de 2018, já que nas últimas pesquisas eleitorais, Lula ainda desponta como um dos favoritos a assumir a presidência. Se ele tiver alguma condenação em segunda instância, porém, nem poderá disputar a eleição.
Fernando Henrique Cardoso (PSDB)
Ex-presidente da República, teve seu nome colocado como eventual substituto de Temer até 2018, caso ele não consiga terminar o mandato. FHC negou que pretende voltar a comandar o Executivo. Já chamou a gestão do peemedebista de “pinguela”, em referência ao programa “Ponte para o futuro” elaborado pelo próprio PMDB e negocia com seus correligionários para tentar impedir uma luta fratricida pelo poder interno. É consultado pelo próprio Temer sobre as políticas que deveria implementar no país.
Eduardo Cunha (PMDB-RJ)
Quando ainda era presidente da Câmara, aceitou um dos processos de impeachment que opositores apresentaram entrada contra Rousseff. Defendeu a queda da presidenta e se movimentou para que isso ocorresse. Parte do que aconteceu com a petista teve a influência de Cunha, que deixou de ser aliado do PT e passou a ser um adversário. Sua artilharia se voltou contra os petistas a partir do momento em que se viu envolvido na operação Lava Jato. Enfrentou o mais longo processo no Conselho de Ética da Câmara e teve seu mandato cassado em setembro. Antes, havia sido afastado das funções parlamentares pelo Supremo Tribunal Federal porque a Corte entendeu que ele estava usando de seu cargo para obstruir as investigações contra si. Depois que caiu, virou uma espécie homem-bomba político. Sem foro privilegiado, acabou preso em Curitiba onde tem três trabalhos informais, preparar sua defesa, escrever um livro sobre o impeachment e decidir se fará ou não a delação premiada que poderá envolver algumas dezenas de políticos de todos os escalões.
Lindbergh Farias (PT-RJ)
Membro da tropa de choque de Dilma Rousseff e atual líder da oposição no Senado, é um exemplo de como a oposição irá agir durante a gestão Temer no Congresso. A todo momento, trata o presidente como “ilegítimo” e defende a realização de novas eleições. A qualquer projeto aprovado que entende que contraria seus posicionamentos, ameaça recorrer ao Judiciário. Um dos recursos apresentados ocorreu exatamente na discussão da PEC do Teto de Gastos. Tem protagonizado debates duros com aliados de Temer.
Romero Jucá (PMDB-RR)
Líder de todos os Governos nos últimos anos, o senador foi varrido do ministério do Planejamento logo no princípio da gestão Temer por causa de áudios que o envolviam com operação Lava Jato. Quando voltou ao Congresso, seguiu fazendo o que sempre fez, negociando com seus aliados e defendendo o Executivo. Habilidoso, conseguiu fazer com que uma nova etapa da lei da repatriação fosse aprovada mesmo com a presença de familiares de políticos, algo que é repudiado por investigadores e fiscais. É uma espécie de pitbull de Temer no Senado. Quando preciso, ataca até aliados.
Dilma Rousseff (PT)
Reeleita presidenta na mais disputada eleição do Brasil, em 2014, teve o mandato cassado em agosto passado sob a alegação de ter cometido crimes fiscais. No fundo, o conjunto da obra, no qual se destacavam uma economia em grave crise, a falta de habilidade política e as revelações da operação Lava Jato, que feriram o PT profundamente, fizeram com que a primeira presidenta brasileira entrasse para a história como mais um chefe do Executivo a perder o seu cargo. Após o impeachment, afastou-se temporariamente da política, apesar de ainda possuir os direitos políticos. Nos próximos meses, deverá assumir a presidência da Fundação Perseu Abramo, que é o braço teórico do PT. Internamente na sua legenda, é vista como uma figura que pouco pode acrescentar para a necessária renovação do seu partido.
Kátia Abreu (PMDB-TO)
Aliada de Dilma Rousseff, de quem foi ministra da Agricultura, a senadora do Tocantins passou a fazer um jogo duplo no Congresso Nacional. Apesar de ser filiada ao mesmo partido do presidente Michel Temer, algumas vezes vota contra os projetos da gestão dele, como a PEC do Teto de Gastos Públicos. Por outro lado, é bem próxima a Renan Calheiros e em outros momentos apoia o que o Governo quer.
Geddel Vieira Lima, Eliseu Padilha e Moreira Franco (PMDB)
Articuladores e porta-vozes informais de Michel Temer formavam uma tríade do então vice-presidente que tentava convencer os indecisos a votar pelo impeachment de Rousseff. Quando Temer assumiu o Governo, foram recompensados com a indicação para ministérios do núcleo duro, respectivamente Secretaria de Governo, Casa Civil e Secretaria do programa de concessões e privatizações. Geddel, no entanto, não resistiu ao primeiro escândalo que o envolvia e acabou pedindo demissão sob a suspeita de usar de seu cargo para fins pessoais. Padilha e Franco agora aparecem em citações na Lava Jato – ambos negam qualquer irregularidade. Temer os mantém nos cargos porque diz confiar em seus auxiliares. Mas os avanços das investigações podem fazer com que ele mude de ideia.
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