Movimentos pelo impeachment convocam primeiro ato nacional da era Temer
Lideranças se dividem entre agregar direita e esquerda na pauta contra a corrupção Movimentos de esquerda afirmam que não estarão nas ruas neste domingo
Os movimentos que foram às ruas pedir o impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff ao longo de todo o ano passado e parte deste ano estão de volta. Neste domingo, o Vem pra Rua, o Nas Ruas e o Movimento Brasil Livre (MBL) convocaram a primeira manifestação nacional da era Temer. Na pauta, desta vez, estão o apoio à Lava Jato, a oposição às dez medidas contra a corrupção tal como foram aprovadas pela Câmara nesta semana, fim de privilégios como o foro privilegiado para políticos e a rejeição ao Projeto de Lei de Abuso de Autoridade, em tramitação no Senado. Se antes os grupos olhavam para o Planalto, agora, o foco é o Congresso, o que não livra o novo Governo de ficar em alerta na jornada.
Se sempre tiverem nuances distintas, há algo que a era Temer escancarou: a unidade dos grupos pró-impeachment enfraqueceu. O racha veio à tona nesta semana, quando foi publicado um post no Facebook do Vem Pra Rua convocando a manifestação dizendo que "não importa se você é de direita, de esquerda ou de centro. Você tem que ir pra rua protestar contra os corruptos", impulsionado pela indignação com a tentativa da Câmara aprovar a anistia ao caixa 2.
Na sequência a essa convocatória que tenta agregar um país tão dividido, Rogério Chequer, líder do Vem Pra Rua, "parabenizou" publicamente a posição do deputado do PSOL, Ivan Valente, sobre a votação da medida que anistiava o caixa 2. “Vamos apoiar fortemente ações como a do deputado Ivan Valente, do PSOL, que está pressionando para que a votação [das dez medidas contra a corrupção] seja nominal. Estamos abertos para conversar com qualquer partido alinhado com a nossa causa. Por isso vamos parabenizá-lo". Rapidamente, o MBL passou a atirar nas redes sociais publicações condenando as declarações de Chequer. Um texto afirma ser um "tiro no pé" que os movimentos se alinhassem "à extrema esquerda". Afirmaram que Chequer deveria pedir "desculpas publicamente" pelo que disse sobre o deputado do PSOL e não aderiram à convocatória do ato.
Não é 'Fora, Temer', mas atinge aliados
A articulação para o primeiro ato nacional da era Temer fez o Planalto acender uma alerta. Na semana anterior, o noticiário havia se concentrado no escândalo que derrubou um homem-forte do Governo, Geddel Vieira Lima, que envolveu diretamente o próprio presidente. De acordo com a consultoria Veto, o tema havia sido visto meio bilhão de vezes até a sexta, dia 25. No domingo, temendo a virada nas ruas, Michel Temer fez um pronunciamento, ao lado dos presidentes da Câmara e do Senado, afirmando que havia um acordo para não aprovar uma anistia à prática de caixa 2. De fato, esse aspecto específico não foi aprovado, mas o pacote anticorrupção acabou sendo descaracterizado e o discurso de pacto entre Poderes e a mensagem de que Temer deteria as maiores distorções acabou inócua.
Seja como for, na prática, as palavras do presidente foram importantes para que os movimentos do impeachment enfatizassem que não se trata de "Fora, Temer". "Pensamos em levar uma pauta de Fora Temer se ele não tivesse se pronunciado sobre a anistia ao caixa 2", disse Carla Zambelli, do Nas Ruas. "Estando ele de olho nas nossas pautas como ele demonstrou estar, não é a nossa ideia. Por enquanto não é". O Vem Pra Rua também diz que pedir a saída de Temer não faz parte da pauta do movimento. Tampouco que organizações de esquerda foram convidadas para o ato deste domingo. "Houve um mal entendido e um mau uso de uma declaração dada por Chequer", explica Mari Botter, do movimento. O MBL, por sua vez, aderiu à convocatória do protesto de domingo.
Já os grupos de esquerda, que pouco têm mobilizado nas ruas em comparação aos movimentos pelo impeachment, publicaram uma nota afirmando que não participarão do ato deste domingo. "Esclarecemos que as Frentes não apoiam e nem participarão da manifestação convocada pelo Vem Pra Rua, um grupo de direita, golpista, que utiliza de forma demagógica e oportunista o suposto combate à corrupção", diz o início da nota. As frentes aproveitam para convocar uma manifestação no próximo dia 13, "pelo Fora Temer, contra a PEC 55 (que impõe o limite de gastos públicos) e pelo fim da repressão a movimentos sociais". Assinam a nota as frentes Povo Sem Medo e Brasil Popular, que agregam diversos movimentos da esquerda.
Ainda que minoritário, a presença ou não de esquerdistas no domingo provocou debate nas bolhas tidas como progressistas nas redes sociais. Poucos defendiam abertamente a adesão, mas ponderavam os prejuízos de não haver nenhuma convergência entre as pautas que serão defendidas nas ruas no dia 13 e as deste domingo. Nem mesmo quando o tema é a corrupção. Há no campo progressista muitas críticas à forma de atuação da Operação Lava Jato, não apenas a suposta politização em ações contra o PT, como mecanismos vistos como fragilizadores do Estado de Direito, e contradições no projeto original do Ministério Público Federal contra a corrupção. Seja como for, analistas discutiam os prejuízos de não se juntar ao lema do combate à corrupção - um tema de defesa universal - quando as pesquisas mostram altíssimo apoio à Lava Jato.
Para a consultoria de risco político Eurasia Group, ainda que poupe Temer diretamente, a volta dos protestos deve ser um tema de preocupação para o Planalto. O Governo depende do Congresso para aprovar medidas que considera cruciais e não pode simplesmente contrariar os líderes do Legislativo agradando a opinião pública sem alijar boa parte da sua base de apoio. Ainda mais quando o tema é o pacote das medidas anticorrupção e Temer ainda está à espera de uma bomba-relógio que pode incendiar ainda mais os ânimos: a divulgação das quase 80 delações de executivos da Odebrecht.
"Pediremos também pela prisão de Lula e Renan [Calheiros, presidente do Senado] e diremos não à recondução de Rodrigo Maia (PMDB) à presidência da Câmara", diz Carla Zambelli, do Nas Ruas. As eleições para a presidência da Câmara dos Deputados ocorrerá em fevereiro e Maia, que preside a casa em substituição ao deputado afastado e preso, Eduardo Cunha (PMDB), se articula para permanecer na cadeira.
A pauta difusa da manifestação deste domingo é vista como fato desagregador, daí a importância de avaliar quantos de fato vão às ruas e com qual discurso. "Não vou [ao ato de domingo]", escreveu no Twitter a advogada Janaína Paschoal, coautora do pedido de impeachment de Dilma Rousseff, e protagonista de diversas manifestações pela saída da petista da presidência. "Cenário muito indefinido. Quantos analistas interpretarão o povo na rua como necessidade de Eleições já? Eu não vou correr o risco de apoiar não sei bem o que". E seguiu: "Não é de hoje que eu estou achando o clima estranho. Respeito a liberdade de manifestação, mas pautas genéricas permitem qualquer coisa".
Colaborou Flávia Marreiro
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