Argentina baixará drasticamente o preço dos computadores, os mais caros da América
Macri abre o mercado aos produtos importados e existe temor pelo impacto no emprego local


Os preços dos aparelhos eletrônicos na Argentina, os mais caros da América, fizeram com que todos os que podem se permitir, especialmente a classe média-alta, os comprem no exterior. É um êxodo que pode ser fotografado: filas de até 15 quilômetros de carros esperam para atravessar a fronteira do Chile todo final de semana para comprar celulares, computadores e tablets pela metade de seu valor. Por isso o governo de Mauricio Macri decidiu eliminar a partir de março os 35% de imposto dos importados. Segundo seus cálculos, os preços cairão 50% e ficarão no mesmo patamar dos países vizinhos. A contrapartida será o impacto que a medida terá em uma indústria de montadores que sobrevive graças a um mercado altamente protegido. O governo disse que serão perdidos 1.000 postos de trabalho de um total de 4.500 pessoas. Mas o setor considera que com tarifa alfandegária de 0% mais de 10.000 pessoas ficarão sem trabalho, especialmente nas pequenas e médias empresas que se alimentam do mercado de tecnologia.
As discussões sobre a necessidade ou não de se ter um mercado protegido fazem parte do folclore econômico argentino desde a década de 40, quando o governo de Juan Domingo Perón iniciou um processo de substituição de importações sem precedentes. O modelo dividiu desde então aqueles que consideram necessário o desenvolvimento de uma indústria local, com o subsequente impacto no emprego, e os que denunciam que um mercado protegido só encarece os preços e diminui a competitividade. A produção de tecnologia faz parte do núcleo duro dessa velha disputa. O governo de Macri considera que os preços locais são abusivos e com a eliminação das tarifas espera reduzi-los à metade. Ao mesmo tempo incentivará a “reconversão” das empresas que hoje montam computadores portáteis e tablets. Para os eventuais demitidos existirão cursos de capacitação e um seguro trabalhista. “A transformação será gradual. Vamos trabalhar com as empresas na transformação, mas a prioridade serão os trabalhadores”, disse o secretário de comércio, Miguel Braun.
Hoje a Argentina tem 15 grandes montadoras, 75% delas localizadas na província de Buenos Aires e o restante na Terra do Fogo, no ponto mais ao sul da Patagônia, onde existe uma zona franca. As tarifas dos produtos importados garantiram pouca concorrência externa a essas empresas, a ponto de um computador na Argentina sair 50% mais caro do que no Chile e até 175% do que nos Estados Unidos. De acordo com dados da Câmara Argentina de Máquinas de Escritórios Comerciais e Afins (Camoca), em 2012 foram vendidos 2,88 milhões de computadores portáteis, dos quais 2 milhões foram montados no país. A tendência se manteve até 2014 e se reverteu em 2015, quando foram vendidos 2,2 milhões de computadores importados e 2,1 nacionais. Os fabricantes argentinos têm agora o desafio de baixar seus preços diante de uma onda de produtos importados que terão custos menores e, é de se esperar, mais qualidade. “Os preços dos nacionais não baixam porque temos 50% de carga de impostos”, diz Carlos Scimone, gerente da Camoca, um crítico do projeto oficial de “reconversão”. “A reconversão industrial na eletrônica leva de 3 a 5 anos, eu não conheço no mundo empresas que se reconverteram em cinco meses. O governo diz que existem empresas capacitadas para mudar de produto e isso é impossível. Nós calculamos que por volta de 10.000 pessoas perderão seus empregos”, alerta.
O governo disse que a tecnologia mais barata reverterá o efeito negativo inicial que a eliminação das tarifas produzirá. O ministro Braun estimou que uma maior oferta criará novos postos de trabalho no setor de consertos, o que se converterá, em 3 anos, em 15.000 empregos. A redução dos custos em equipamentos também terá efeitos sobre a produtividade das empresas, especialmente as pequenas. “Isso é certo”, diz Scimone, “mas esse empresário também precisa comprar uma caminhonete que aqui lhe custará o dobro do que no exterior. Por que escolhemos abrir o mercado aos eletrônicos e não aos automóveis?”.