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“O PT não soube cortar na própria carne nos casos de transgressão ética”

Deputado que deixou o PT explica porque saiu do partido depois de 18 anos de militância

María Martín
O deputado Alessandro Molon na Câmara.
O deputado Alessandro Molon na Câmara.Alex Ferreira ( Câmara dos Deputados)

Há um mês que Alessandro Molon (Belo Horizonte, 1971) deixou o Partido dos Trabalhadores, onde militou por 18 anos, para se unir à recém criada Rede Sustentabilidade, liderada de Marina Silva. Não vai ser o único. Segundo o deputado, outros parlamentares progressistas de vários partidos cogitam trocar de bancada. Os últimos rumores apontam que até o prefeito de São Paulo Fernando Haddad estaria flertando com a ideia para optar à reeleição fora de um desgastado PT. Haddad, em todo caso, nega. Molon também desconversa e não dá nomes. “A Rede ainda não conversou sobre as eleições municipais. Primeiro precisamos de um programa”. Entre uma reunião e outra em Brasília, o deputado conversou com o EL PAÍS pelo telefone, criticou a falta de autocrítica do PT, a gestão do prefeito do Rio, Eduardo Paes, e deixou no ar futuros movimentos e as ambições políticas da nova legenda.

Pergunta. Por que tomou a decisão de sair do PT?

Resposta. Eu fiquei por 18 anos no Partido dos Trabalhadores. Nesse tempo eu entendo que contribui para uma série de avanços conquistados no Brasil. Acho que nos últimos 13 anos demos passos importantes na direção da distribuição de renda, da justiça social, do acesso à educação para os filhos dos trabalhadores, acesso à casa própria... Mas, ao mesmo tempo, entendo que uma série de erros foram cometidos por membros do partido e o partido não soube lidar com eles, como o envolvimento de integrantes do PT com crimes de corrupção, transgressões éticas.

O PT não soube deixar claro que isso não correspondia com a história e as ideias da legenda e não soube cortar na própria carne. Eu espero que isso mude, mas como eu não via no horizonte uma mudança rápida, eu entendi que deveria procurar construir uma outra alternativa política no Brasil e ela é a Rede Sustentabilidade.

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O momento do país pede a construção de uma nova alternativa política que seja capaz de reunificar o país e superar o clima de intolerância e de ódio que permanece no cenário político entre PT e PSDB que está envenenando a política e a população.

P. Há rumores de que o prefeito de São Paulo Fernando Haddad estaria cogitando se unir à Rede. O que você sabe sobre isso? Há mais colegas do PT dispostos a mudar para à Rede?

P. Honestamente não tenho conhecimento dessa informação. Há sim outros colegas de vários partidos insatisfeitos. Um exemplo disso é que a própria bancada da Rede tem pessoas de quatro partidos diferentes, quatro na Câmara e um no Senado. Isso mostra que o quadro partidário brasileiro passa por uma crise e os próprios parlamentares estão percebendo que o sistema está esgotado e é preciso criar alternativas novas. A Rede é uma nova possibilidade, com propostas novas e que quer pensar o Brasil dos próximos 40 anos porque está faltando o projeto do Brasil.

P. Qual o prazo de validade de Eduardo Cunha?

R. Já está vencido. Ele deveria ter saído da Presidência da Câmara há muito tempo e é preciso que seja iniciado um processo de quebra de decoro o quanto antes.

P. Quem poderia ser um sucessor Cunha? Você se candidataria?

R. Não (risos). Eu não sou candidato a presidência da Câmara. Eu sou candidato a ajudar a construir a Rede como uma alternativa política. Sobre o sucessor, nós não conversamos sobre isso ainda, devemos começar a conversar isso em breve, mas é importante que ele seja afastado o quanto antes.

P. Como lidar com o receio provocado pelo fato de a líder da Rede, Marina Silva, ter um perfil mais conservador? Ela foi muito questionada, por exemplo, por não ter defendido expressamente os direitos homossexuais durante a campanha do ano passado.

R. A Marina vem se descrevendo, e eu concordo com ela, como uma “sustentabilista progressista”. E eu tenho certeza de que a Rede vai ser um partido progressista nas suas posições, comprometido com o respeito aos direitos humanos, a proteção das minorias, da diversidade... A Rede já tem posição sobre o Estatuto da Família [considerado pela legenda um retrocesso].

P. Como a Rede vai se manifestar oficialmente sobre o impeachment de Dilma Rousseff?

R. Me parece que, por uma reunião da Rede que tivemos nessa semana [passada], a posição do partido é de uma defesa muito firme da democracia e da Constituição.

P. Já se fala seu nome como pré-candidato à prefeitura do Rio? Qual é seu plano para ganhar os votos de outros candidatos progressistas como Marcelo Freixo ou Romário?

R. Vou trabalhar nos próximos meses para construir a Rede no Rio e no Brasil. Foi para isso que vim. Ninguém me ofereceu legenda para ser candidato a prefeito nem eu pedi. Nós nem começamos a conversar sobre as eleições municipais aqui no Rio.

P. E chegaram a conversar sobre as metas para a eleição municipal no ano que vem? Querem eleger quantos prefeitos e quantos vereadores?

R. Nós não entramos nesse debate ainda, mas eu percebo que vai ser uma meta de qualidade e não de quantidade. Vamos apresentar primeiro um programa para cidades sustentáveis no Brasil, pensar como vamos enfrentar os grandes desafios como a mobilidade, saneamento, poluição, violência urbana, inclusão social, acesso à educação... já que a sociedade brasileira vem tendo sua qualidade de vida muito afetada por conta desses problemas. Apresentaremos candidaturas que simbolizem a defesa desse programa, agora, não acredito que estejam pautadas em uma meta de quantidade de prefeitos ou vereadores.

P. Você descarta ser candidato?

R. Não conversamos sobre isso. Mas te garanto que não foi ser candidato a prefeito o que me trouxe para a Rede.

P. Quais são os principais problemas que enfrenta a cidade de Rio?

R. Entre outras coisas, o Rio de janeiro tem um problema de mobilidade urbana, de violência, que é gravíssimo, e uma preocupação grande com o problema de saúde, o acesso aos remédios e tratamentos. A gestão atual [do prefeito Eduardo Paes (PMDB)] não só poderia ter feito mais, se não melhor. Por exemplo, todas as obras que estão fazendo para instalar corredores de BRT [ônibus de tráfego rápido] são um atraso. Isso já está superado há décadas. Essas intervenções deveriam ser para implantação de VLT, de veículos ligeiros sobre trilhos. Não apenas no centro da cidade, deveria ser regra na cidade inteira.

P. E a gestão das Olimpíadas?

R. Há uma enorme quantidade de erros na realização das Olimpíadas no Rio. Se você comparar com as Olimpíadas de Londres, por exemplo, você vai ver que a preocupação deles foi construir o Parque Olímpico num dos lugares mais degradados da região para recuperá-lo econômica e socialmente. Aqui no Rio, o prefeito escolheu fazer o Parque Olímpico na Barra da Tijuca em um dos lugares com mais infraestrutura e mais ricos da cidade. O oposto do que deveria ter sido feito. As Olimpíadas também não foram pensadas com uma abordagem ambiental. Qual é o legado ambiental das Olimpíadas? A Baia de Guanabara? A vergonha que o Brasil vai passar com os atletas correndo risco de serem contaminados? Não há legado nenhum.

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