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Em protesto anti-Dilma, Sergio Moro vira herói e Renan é vaiado nas ruas

Manifestação anti-Governo reúne 135.000 pessoas em São Paulo, diz o Datafolha

A Avenida Paulista neste domingo, tomada por manifestantes.
A Avenida Paulista neste domingo, tomada por manifestantes.PAULO WHITAKER (REUTERS)

A terceira grande manifestação anti-PT e anti-Governo deste ano, que aconteceu em 150 cidades, ganhou novos heróis e novos vilões neste domingo. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) entrou no alvo dos manifestantes e foi constantemente citado e vaiado, juntamente com a presidenta Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula, do Partido dos Trabalhadores (PT). Nem Rodrigo Janot, procurador–geral da República, outrora ovacionado nas ruas, foi poupado. Janot é visto com desconfiança por parte dos organizadores dos protestos pois, segundo eles, estaria blindando Dilma de uma eventual queda.

Por outro lado, o juiz Sergio Moro, que comanda as investigações da Operação Lava Jato, foi tratado como herói nacional, lembrado em cartazes e camisetas. Sobre Eduardo Cunha, acusado por um delator de ter recebido 5 milhões de dólares em propina, nenhuma palavra. Ou não. “Cunha é o único que pode colocar para votação o pedido de impeachment. E o Janot está tentando achar alguma coisa para incriminá-lo. Isso sim é golpe!”, gritou um dos líderes do carro de som do movimento Nas Ruas, em São Paulo. Os alvos e protegidos refletem o momento atual da crise política, dias depois de o Planalto fechar um acordo com Renan Calheiros para conter o avanço da crise política. Cunha, como Renan investigado na Operação Lava Jato, mas inimigo de Dilma,  se tornou a esperança dos movimentos de ver sua pauta pela saída da presidenta avançar em Brasília.

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Uma vez mais foi São Paulo que liderou os protestos, que reuniu 135.000 pessoas na Avenida Paulista, segundo o instituto Datafolha; no dia 15 de março, 210.000 pessoas se manifestaram na mesma avenida, enquanto que em 13 de abril, 100.000 estiveram presentes, segundo dados do Datafolha. Para a Polícia Militar —que em março assegurou que mais de um milhão se manifestaram na Paulista—, 350.000 circularam na capital paulista e 465.000 em todo o Estado. O perfil do manifestante na capital paulista continua sendo, em sua maioria, brancos, de classe média ou média alta —doutores, advogados, engenheiros, dentistas, designers, professores, entre outros.

Mas, ainda que o número seja um pouco menor do que em abril - avaliações informais da Polícia Militar falam em cerca de 800.000 pessoas no Brasil todo -, as imagens de milhares de pessoas com faixas pedindo fora Dilma ou exibindo bonecos do Lula vestido de preso em diversos pontos de país, é uma fonte de desgaste para o Governo. Problemas do cotidiano têm motivado as pessoas a vestir-se de amarelo para expressar seu incômodo. O portal G1 registrou em Manaus, por exemplo, a presença de Valdizia Almeida, uma senhora franzina, de rosto simples, segurando um cartaz que dizia: “O custo de vida está muito alto. O quilo da cebola está dez reais. Dilma tem que sair”. Como ela, muitos que estiveram na rua não estavam para cobrar a saída da presidenta. “Não sou a favor do impeachment porque ainda não preenche nenhum requisito legal. Estou aqui para protestar contra a corrupção”, disse Silvana Maeda, de 33 anos, que levou a sobrinha Bruna para a avenida Paulista.

Entre os manifestantes de Brasília, havia os que pediam a privatização de órgãos estatais. "A Petrobras foi roubada e a tendência agora é só dar prejuízo. Se pudesse, privatizaria até o Governo", afirma o aposentado Josué Gomes. Cerca de 25.000 pessoas se reuniram na capital federal para o protesto.

Mesmo que a pauta não seja a mesma para todos, o que une os brasileiros que saíram às ruas é um sentimento de insatisfação de que não recebem o que pagam em impostos, avalia a cientista política, Fátima Pacheco Jordão. “A esta altura não há necessidade de pesquisa ou passeata para verificar que população está desconfortável”, afirma.

Além de Dilma Rousseff, os políticos que estão no poder também caíram na boca do povo. No Rio de Janeiro, o vice-presidente, Michel Temer, assim como Renan Calheiros, foram alvo de indignação dos participantes, que desafiaram o calor para ir às ruas neste domingo. Os cariocas, ao contrário dos paulistanos, não pouparam o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, que foi eleito deputado pelo Rio de Janeiro, e está sob investigação por um esquema de propinas da Petrobras.

Apesar de ter se apresentado como o articulador político do impeachment da presidenta, Cunha está pagando o desgaste. "Nossa pauta mais emergencial é conseguir a saída de Dilma, mas nós não temos nenhuma parceria com Cunha. Se se demonstrar que ele está envolvido, ele será o próximo", afirmou Bernardo Santoro, coordenador estadual do Movimento Brasil Livre, cujo pedido de impeachment está nas mãos de Cunha.

Em São Paulo, o líder do movimento Vem pra Rua, Rogério Chequer, afirmou que há um temor de que um provável esquema esteja sendo montado em Brasília, encabeçado pelo senador Renan Calheiros para proteger a investigação sobre ele e de alguns outros. “O Eduardo Cunha está na lista de Janot e exigimos que todos os nomes na lista sejam investigados sem qualquer tipo de discriminação”, completou, ao ser questionado sobre a ausência de críticas ao presidente da Câmara. Representantes do MBL afirmaram esperar de Cunha apenas que cumpra seu papel constitucional de "encaminhar o impeachment".

Políticos do PSDB, - que divulgou vídeos de apoio aos protesto -, arriscaram a caminhar pelas ruas desta vez. Em Belo Horizonte, o senador Aécio Neves, derrotado por Dilma nas eleições do ano passado, discursou para os presentes no ato que reuniu cerca de 6.000 pessoas, segundo a PM. “Quem vai tirar o Brasil da crise é o povo brasileiro, se manifestando como está fazendo hoje”, arriscou ele ao microfone, sendo aplaudido pelos presentes. Em São Paulo, o senador tucano José Serra caminhou pela Paulista e tirou fotos com os manifestantes.

Esquerda, volver

O discurso pró-impeachment dos paulistanos estava mais afinado do que nunca, diante da esperança dos movimentos de que o processo vá adiante depois da análise das contas do Governo do ano passado pelo Tribunal de Contas da União neste mês. Do alto do carro de som, as palavras de ordem contra Dilma e o PT se intercalavam com o hino nacional, tocado exaustivamente, e marchinhas compostas para a ocasião. “Chora petista, bolivariano, a roubalheira do PT tá acabando... olê olê olê, vamos pra rua pra derrubar o PT”, era uma delas, cantada animadamente por organizadores e manifestantes. “Quem não pula é comunista”, era outra. “Vim pedir o impeachment”, cantavam em cima de um palco um dos líderes do MBL, ao ritmo de We will rock you, do Queen. Três grandes carros de som comandavam os protestos: um do MBL, outro do Vem pra Rua e um terceiro do movimento Nas Ruas.

Os organizadores também animaram os manifestantes puxando alguns gritos estranhos, como o repúdio contra o comunismo. “O comunismo matou 100 milhões de pessoas. Mais que o nazismo”, gritava em um microfone um militante. “Quem é a favor de criminalizar o comunismo?”, perguntava, sob fortes aplausos. "Fora comunismo!", urrava no microfone.

No entanto, o radicalismo maior ficou por conta dos líderes dos quatro carros menores, onde o microfone abria espaço para os mais diferentes discursos. “A mídia está comprada pelo PT. Ela só faz o que eles pedem”, dizia um. “Estão tentando vender o aquífero Guarani para a Bolívia”, gritava outra. “Essa filha da puta matou essa criança, que poderia ser seu filho, porque ela foi guerrilheira”, dizia outro, segurando um cartaz com uma foto. O pedido de intervenção militar ecoava desses carros menores e não ganhou muita reverberação nas ruas.

De uma janela, uma moradora de um prédio na Paulista sacudiu uma camiseta vermelha. Foi vaiada. “Esquerda caviar! Você mora na Paulista”, gritou do carro de som Carla Zambelli, do movimento Nas Ruas. As selfies pela avenida, assim como as fotos de manifestantes abraçados com a Polícia Militar. “Eu amo você”, disse Odete Oliveira dos Santos, a um policial do Batalhão do Choque. “Acho a melhor polícia que existe”, disse ela.

Na zona sul da cidade, a mais de 5 quilômetros de distância, cerca de 1.500 pessoas tentaram marcar um contraponto, manifestando-se a favor do PT em frente ao Instituto Lula, que foi atingido por uma bomba há duas semanas. Neste domingo, no entanto, a rua não era deles.

Com informações de Afonso Benites e María Martín.

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