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Governo e Sabesp consideram um rodízio de 5x2 ainda este ano

Sem obras entregues no prazo e chuvas no nível de 2014 água pode acabar em agosto

Mariana Chaves, vizinha de Perdizes, fica sem água 12 horas por dia desde o ano passado.
Mariana Chaves, vizinha de Perdizes, fica sem água 12 horas por dia desde o ano passado. Victor Moriyama

O Comitê da Crise Hídrica de São Paulo, criado pelo governador Geraldo Alckmin em fevereiro, trabalha com a possibilidade de implantar um rodízio drástico, de cinco dias sem água por dois com água, nas zonas abastecidas pelo Sistema Cantareira que somam, só na região metropolitana, mais de cinco milhões de pessoas.

Uma equipe formada por representantes da Sabesp, da Defesa Civil, da Secretaria de Segurança Pública, da prefeitura de São Paulo, das universidades e da sociedade civil discute desde março as medidas emergenciais a serem orquestradas no caso da adoção de um rodízio, consequência da pior crise hídrica em 84 anos. O plano de contingência, ao qual teve acesso o EL PAÍS, pode ser modificado e ainda precisa ser aprovado, mas já revela alguns dos cenários previstos se o fornecimento de água for cortado, ainda no segundo semestre deste ano.

O rodízio contemplado pelo grupo do Comitê é o mais severo dos considerados até hoje. No plano elaborado pela Sabesp em janeiro de 2014, e que foi descartado por Alckmin, o rodízio proposto nessas mesmas regiões era muito mais suave, de 48 horas sem água por 24 com abastecimento.

O gatilho que deve ativar a implantação desse rodízio não está definido nos documentos, mas a Secretaria de Recursos Hídricos considera algumas premissas, como as chuvas, as obras emergenciais, o consumo ou as perdas na rede, que permitiriam atravessar 2015 sem cortes drásticos no fornecimento. "Não atendimento parcial ou total das premissas adotadas no estudo de simulação pode levar ao estabelecimento de um programa de rodízio", diz o documento.

Por enquanto, uma delas, a conclusão das obras emergenciais para aumentar a oferta de água na região metropolitana, já está comprometida. A principal dessas obras, a ligação do Sistema Rio Grande para socorrer o Sistema Alto Tietê, já está atrasada três meses e não ficará pronta até setembro. Dois engenheiros especializados em recursos hídricos consultados pela reportagem, defendem, no entanto, que esse prazo também pode não ser cumprido em se tratando de uma obra de tal envergadura.

A Sabesp trabalha com simulações de vários cenários, cuja gravidade depende, precisamente, da finalização de três obras emergenciais previstas, inicialmente, até junho deste ano.

Fonte: Sabesp

Se considerada uma temporada seca com o mesmo nível de vazão de entrada de água de 2014 no sistema – próximo ao registrado neste mês de abril – e sem as obras prontas, a água da terceira cota de volume morto no Cantareira pode acabar em agosto (linha roxa). Ou ainda em julho se a vazão for 20% menor (linha vermelha).

Na simulação mais otimista da companhia, considera-se a conclusão das obras emergenciais. Com níveis de vazão de entrada de água nas represas na média de 2014, o nível do Cantareira deve chegar a outubro com a primeira cota de volume morto esgotada.

Sem água nas torneiras, a prioridade da Sabesp, segundo os documentos, seria garantir o abastecimento emergencial dos estabelecimentos de máximo interesse social, onde o fornecimento não pode ser interrompido. São, ao todo, 1.578 locais entre hospitais, pronto-socorros, grandes clínicas de hemodiálise, presídios e centros de detenção, e não inclui as 4.562 escolas municipais e estatais. A garantia de abastecimento desses locais dependeria ainda de obras de pequeno porte, como o prolongamento da tubulação e construção de adutoras.

A perfuração, a requisição e o uso de poços, em substituição da rede pública, poderia ser uma alternativa para a distribuição de água potável para a população. Contempla-se também a distribuição de água em lugares como escolas e outros equipamentos urbanos.

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O cenário de rodízio estudado pelos representantes do Comitê prevê também questões de segurança. “Em momentos onde a população é colocada em situações de anormalidade social em função de crises e tragédias, sejam provocadas pela natureza ou pelo homem, as regras e comportamentos de convivência em sociedade são pressionados por inseguranças, medos, pela falta de informações, bem como, pela quebra de rotinas cotidianas provocadas pela situação extrema”, reza a proposta emergencial apresentada pela Defesa Civil.

A Polícia Militar deve prestar apoio às concessionárias nos locais de abastecimento ininterrupto e deve ser acionada diretamente “caso seja constatada alguma possibilidade de violência iminente ou perturbação da ordem relacionada à falta de água”. O grupo cogita a implantação de uma hot-line, destinada especificamente a esse tipo de denuncias.

Os caminhões-pipa são apontados no plano da Defesa Civil como alternativa para os estabelecimentos de interesse social, que fiquem eventualmente sem fornecimento. Mas a visão da Sabesp é rigorosa sobre a utilidade dos veículos: “Seria inviável realizar o abastecimento com caminhões, ou furar poços em todos esses locais [prioritários]”, disse o gerente da estatal Marcel Costa Sanches em uma das reuniões do grupo, fazendo referência a hospitais e escolas. Sanches também ressaltou a necessidade de criar um plano de contingência especifico para alguns desses locais que sofrem com a falta de fornecimento e não têm reserva suficiente. A companhia quer que esses planos sejam desenvolvidos por diferentes atores responsáveis. “A Sabesp não vai conseguir atender sozinha a todas as demandas em cenário de guerra”, disse.

Questionada pelos detalhes do rodízio, a Secretaria de Recursos Hídricos respondeu que "as simulações "citadas nesta reportagem não passam de rascunhos de um grupo de trabalho que sequer concluiu suas análises". Este grupo, continua a nota, "quando encerrar suas atividades, apresentará a proposta ao Comitê da crise hídrica, que, por sua vez, debaterá e definirá a versão final do plano de contingência unificado entre os municípios da Região Metropolitana de São Paulo."

Menos de uma semana depois destes planos serem discutidos em reunião fechada, o governador assegurava, no último dia 28 em um evento com empresários, que não vai faltar água no Estado: "Estamos preparados para o período seco e não vai faltar água". Uma nova reunião está agendada para esta sexta-feira onde deve ser discutida e aprovada a proposta do plano de emergência definitiva.

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