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Sabesp descumpre norma que garantiria abastecimento de água

O diretor metropolitano da companhia admite que a pressão atual na distribuição é insuficiente para preencher as caixas de água

María Martín
Homem coloca mosquiteira em uma caixa d'água em São Paulo.
Homem coloca mosquiteira em uma caixa d'água em São Paulo.N.Doce (REUTERS)

O diretor metropolitano da Sabesp, Paulo Massato, reconheceu na manhã desta terça-feira que a companhia estatal está descumprindo normas técnicas ao diminuir a pressão necessária para o fornecimento de água. Segundo Massato, a Sabesp está longe de obedecer a norma brasileira que cobra a manutenção de uma pressão suficiente para atingir uma caixa de água a dez metros de altura, o que tecnicamente é chamado de dez metros da coluna de água, a unidade que mede a pressão na distribuição. Segundo o dirigente da Sabesp, essa pressão atinge apenas um metro. "Não tem pressão suficiente para chegar na caixa-d'água. Estamos abaixo dos 10 metros de coluna de água, principalmente nas zonas mais altas e mais distantes dos reservatórios," reconheceu Massato. Na prática, a redução excessiva da pressão teria os mesmos efeitos que um rodízio, pois deixa bairros sem água por vários dias.

A prática contraria as recomendações que regulam a distribuição de água para abastecimento público da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Massato, que depôs na CPI da Câmara Municipal que investiga os contratos da companhia com a Prefeitura, justificou o descumprimento pela gravidade da crise: "Estamos em uma situação de anormalidade. Nós não conseguiríamos abastecer seis milhões de habitantes [atendidos pelo sistema Cantareira], se mantivéssemos a normalidade". A Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo (Arsesp) informou que vai pedir esclarecimentos à companhia.

Não é a primeira vez que a Sabesp é questionada sobre a força da água mantida no sistema. Após quase 400 reclamações por falta de abastecimento e pressão insuficiente, a própria Arsesp investigou entre junho e setembro de 2014 os Centros de Controle Operacionais da Sabesp e detectou que a pressão de água na tubulação atingia dois metros a menos que o recomendado, conforme revelou o jornal Estado de S. Paulo.

Na época, o governador Geraldo Alckim defendeu a gestão da companhia e negou o que foi afirmado nesta quarta-feira por Massato. “Ela [a Sabesp] cumpre a norma da ABNT, que é de uma coluna de 10 metros de água”, disse Alckmin em dezembro, quando também afirmou que os problemas por falta de abastecimento eram “pontuais”.

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Não é a primeira vez tampouco que as declarações de Massato contrariam a versão oficial. Foi o dirigente da Sabesp quem introduziu no vocabulário da crise hídrica o conceito de “rodízio drástico” ao anunciar a possibilidade dos paulistanos ficarem cinco dias sem água por semana. "Para fazer rodízio, teria que ser muito pesado, muito drástico. Para ganhar mais do que já economizamos hoje, seriam necessários dois dias com água e cinco dias sem água", afirmou Massato no final de janeiro. Três dias depois, Alckmin negava essa previsão.

Massato foi também protagonista de um áudio de uma reunião da diretoria da Sabesp vazado em outubro. “Essa é uma agonia, uma preocupação. Alguém brincou aqui, mas é uma brincadeira séria. Vamos dar férias [inaudível]. Saiam de São Paulo, porque aqui não tem água, não vai ter água pra banho, pra limpeza da casa, quem puder compra garrafa, água mineral. Quem não puder, vai tomar banho na casa da mãe lá em Santos, Ubatuba, Águas de São Pedro, sei lá, aqui não vai ter”, disse o dirigente. A divulgação jogou um balde de água fria no Governo quando ainda tentava negar a gravidade da crise.

Uma prática sem transparência

A redução de pressão vem se confirmando desde meados do ano passado, mas foi só em janeiro deste ano que a companhia reconheceu e divulgou no seu site os horários da restrição, de até 15 horas, em todos os bairros da capital. Uma pressão menor ajuda a diminuir o consumo e as perdas por vazamentos da rede e deixa as torneiras secas, especialmente nas áreas mais altas da cidade. 

Diversas informações, porém, apontam que a Sabesp não só está reduzindo a pressão, mas também está fechando os registros. Segundo Marzeni Pereira, tecnólogo em saneamento da Sabesp, o Governo mente ao falar em redução de pressão, porque não há esse mecanismo disponível em toda a rede. O que se faz, disse Marzeni ao EL PAÍS em 7 de fevereiro, é fechar os registros. Não é toda a tubulação da capital de São Paulo que está controlada por válvulas redutoras de pressão (VRP). O Estadão, baseado e uma fonte de alto escalão da companhia, e o portal IG, após acompanhar a manobra com vários técnicos da Sabesp, também noticiaram esses fechamentos de registros em 40% da rede. A companhia nega, assim como negou na época a redução de pressão.

Grandes consumidores

Massato também se referiu aos grandes consumidores de São Paulo, beneficiados pelos chamados contratos de demanda firme que oferecem grandes descontos quanto mais água for consumida. Na lista de parte dos clientes revelada pelo EL PAÍS há shoppings, condomínios de luxo, clubes esportivos e indústrias cujo consumo de mais de 500.000 litros por mês é premiado com descontos de até 75%. Entre eles está, por exemplo, o caso do Hotel Hilton, que mantém aberto um spa e um centro fitness 24 horas por dia, além de uma piscina com vista panorâmica, e consome por mês o mesmo que 751 famílias com quatro membros (11.722 m3/mês). O hotel paga 6,76 reais por cada metro cúbico, quando a tarifa comercial é de 13,97. Neste caso, o valor é menor, inclusive, do que o pago por uma família de quatro pessoas que paga a tarifa comum (7 reais/m3).

Segundo o diretor da Sabesp, esses consumidores ajudaram na redução da demanda. "Tivemos parceria muito forte com os grandes consumidores, que perfuraram poços e atuaram fortemente na redução da demanda. Os grandes consumidores foram os grandes contribuintes para a redução da captação de água do Cantareira", afirmou.

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