Eleição na Câmara será primeira prova de fogo para nova base de Dilma
Na escolha do presidente da Casa, no domingo, alinhados tentarão derrotar Cunha (PMDB)
O primeiro dia de trabalho dos novos deputados federais, no próximo domingo, 1º de fevereiro, será marcado por uma acirrada disputa entre o Governo e suas oposições — sim, no plural, já que a base aliada do governo do PT está claramente rachada e tem potencial para causar tanto ou mais dor de cabeça ao Planalto que os opositores declarados.
A primeira batalha de Dilma Rousseff na Câmara dos Deputados neste ano se dará principalmente contra Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o parlamentar que foi uma pedra em seu sapato nos últimos anos. O peemedebista, em tese parte da base aliada mas abertamente hostil ao Planalto, é o favorito para derrotar o candidato petista Arlindo Chinaglia (SP) na eleição para a presidência da Câmara, que tem o deputado Júlio Delgado (PSB-MG) como o azarão e Chico Alencar (PSOL-RJ) como uma candidatura de honra, sem chances de vencer.
A essa altura, apenas uma reviravolta de posição entre deputados da base de Dilma que já decidiram abandonar o Planalto para acompanhar o rebelde Cunha seria capaz de dar a Chinaglia a presidência da Casa. O que pode ajudá-lo é que o voto é secreto: um deputado pode declarar apoio a Cunha ou Delgado, mas votar em Chinaglia.
Se analisados os apoios oficializados até o momento, Cunha teria, no primeiro turno, 161 votos. Chinaglia chegaria aos 128, Delgado, aos 106, e Alencar, aos 5. Faltariam 113 votos (dos 513) ainda por se definir publicamente.
Se fosse se basear apenas no grupo que ajudou a elegê-la, Rousseff não teria problemas, já que o próprio PMDB faz parte de seu grupo de sustentação, tendo inclusive o vice-presidente da República, Michel Temer, e seis ministros. Na prática, contudo, um fisiológico e heterogêneo PMDB age como bem entende. Nos últimos dois anos, Cunha, por exemplo, articulou a derrubada do decreto de Rousseff que criava a conselhos populares em órgãos públicos, agiu para travar a votação do marco civil da Internet e pediu investigações contra a Petrobras. Ainda no governo Lula, ele foi um dos pivôs da derrubada da CPMF (o imposto do cheque que financiava a saúde pública). De persona non grata, ele chegou a ser recebido pelo Palácio do Planalto no ano passado, mas a relação não passou de um flerte. Pela habilidade potencial de causar problemas, Cunha já foi comparado ao deputado democrata Frank Underwood, o ardiloso protagonista da série do Netflix House of Cards. Eles não gosta do paralelo.
Nas últimas semanas, Cunha teve o nome citado no meio da operação Lava Jato como beneficiário de propina, o que ele nega veementemente. O deputado se considera alvo de uma campanha orquestrada para atrapalhar sua candidatura ao cargo.
Os candidatos e seus apoios
Eduardo Cunha (PMDB-RJ)
- PMDB - 66 deputados
- PTB - 25
- DEM - 22
- PRB - 21
- SD - 15
- PSC - 12
- Total - 161
Arlindo Chinaglia (PT-SP)
- PT - 70
- PSD - 37
- PC DO B - 10
- PROS - 11
- TOTAL - 128
Júlio Delgado (PSB-MG)
- PSDB - 54
- PSB - 34
- PPS - 10
- PV - 8
- TOTAL - 106
Indecisos - 113
Enquanto se defende dos petardos, Eduardo Cunha ataca. Diz que o Governo decidiu trocar apoios à candidatura de Chinaglia por cargos na máquina pública, algo que os petistas também negam.
“O Eduardo Cunha é um lobista com um grande poder de argumentação. Seus aliados vão além dos partidos, já que ele inclusive ajuda parte dos deputados com o financiamento de suas campanhas. E recebe a gratidão dos colegas”, avaliou o cientista político Pedro Arruda, da Pontifícia Universidade Católica (PUC).
Promessas
Cunha e Chinaglia têm discursos parecidíssimos quando se trata de benesses aos deputados. Ambos prometem lutar para reajustar os salários dos parlamentares para o teto do funcionalismo público (33.000 reais), construir um novo anexo na Câmara dos Deputados e ampliar a verba de gabinete para os congressistas, que hoje passa dos 48.000 reais por mês.
O que mais os difere é que Cunha é a favor da criação de uma nova CPI da Petrobras e totalmente contrário à regulamentação da mídia, uma proposta que o PT tenta emplacar há anos. “Ao querer barrar a regulamentação econômica da mídia, Cunha automaticamente ganha o apoio dos oligopólios que comandam a mídia brasileira, que fazem clara oposição ao governo federal”, explica Arruda.
O Eduardo Cunha é um lobista com um grande poder de argumentação Pedro Arruda, professor da PUC-SP
Chinaglia, por outro lado, defende a reforma política e luta contra essas duas bandeiras de Cunha. Já Delgado, com chances remotas, diz que fará uma gestão completamente independente. “O que o governo quiser votar e for importante para a sociedade, nós vamos apoiar. O que não for, não vamos. Nenhum dos dois candidatos pode agir da maneira como eu agirei, se for eleito.”
Prelúdio dos problemas
Depois de enfrentar a mais acirrada eleição dos últimos 25 anos, se deparar com uma crise econômica, ouvir críticas da ex-ministra Marta Suplicy, a calmaria está longe de chegar para a presidenta brasileira, independentemente de quem seja o vencedor no domingo.
O motivo é que o cargo de presidente da Câmara não é apenas para escolher o segundo na linha de sucessão de Dilma Rousseff. O ocupante da função define principalmente a agenda de votações da Casa: ou seja, os projetos de interesse do Governo podem entrar na pauta mais rapidamente ou não.
Outro poder nas mãos do cargo é a redistribuição das forças dentro do Congresso Nacional. Com a caneta da presidência em mãos, o partido ganha mais força na indicação das comissões internas e influência na criação de CPIs ou na indicação de integrantes na administração federal.
Câmara só elegeu não governista presidente uma vez desde 89
Dos últimos 14 presidentes da Câmara (desde a redemocratização do país), apenas um declaradamente não governista se elegeu para a função, Severino Cavalcanti (PP-PE), em 2005. Beneficiado por um racha do PT do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Cavalcanti obteve apoio dos partidos nanicos e dos oposicionistas ao prometer uma série de benesses aos deputados. Não durou nem sete meses no cargo. Renunciou ao mandato após ser investigado pelo recebimento de propina.
O que costuma valer tanto na Câmara quanto no Senado é um acordo informal de que a maior bancada presidiria as Casas. Se isso fosse levado em conta, o natural era que o PT, com 70 deputados federais, elegeria o presidente na Câmara. E o PMDB, com 18 senadores, o do Senado.
Em alguns anos houve um acordo para mudar o usual. Na legislatura passada, por exemplo, o PT, que tinha a maior bancada, concordou em apoiar o PMDB para presidir as duas Casas em troca do suporte à candidatura à reeleição de Dilma. Nesta legislatura, porém, a expectativa era de que um petista voltasse ao cargo com o apoio do PMDB, o que não deve ocorrer.
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