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São Paulo começa a usar suas últimas reservas de água

Enquanto o Estado garante as reservas até março de 2015, a Agência Nacional de Águas reduz o otimismo para até novembro

María Martín
O Sistema Cantareira, nesta sexta-feira.
O Sistema Cantareira, nesta sexta-feira.Jorge Araújo (Folhapress)

A reserva de água do Sistema Cantareira, responsável pelo abastecimento de 14 milhões de pessoas na Grande São Paulo e em 62 cidades do interior do Estado, depende mais do que nunca da temporada de chuvas que começa em outubro. E de muita chuva.

O nível de água útil do principal reservatório do Estado chegou nesta quinta-feira a zero, pela primeira vez desde que foi criado em 1974. Resta apenas a reserva da reserva, 400 milhões de metros cúbicos que ficam no fundo da represa, abaixo do nível de captação das comportas e que acumula sujeira, sedimentos e até metais pesados. O denominado volume morto, cuja qualidade é considerada boa segundo as autoridades, nunca tinha sido utilizado para abastecer a população até que em maio se tornou um recurso. Hoje, o único. O plano, se não começar a chover intensamente, pode funcionar até novembro, segundo a Agência Nacional de Águas. Já a Sabesp, empresa estadual que fornece água para 364 cidades de São Paulo, muito mais otimista, acredita que há recursos até março do ano que vem.

No interior do Estado a situação é descrita como alarmante. "Em Campinas, e em outros 75 municípios, não temos outros reservatórios que garantam nosso consumo. Se o sistema da Cantareira deixar de oferecer esses 3 ou 4 metros cúbicos por segundo que necessitamos, nós não temos um sistema alternativo de abastecimento", afirma Francisco Lahóz, secretário executivo do Consórcio Intermunicipal das Bacias dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (PCJ), um dos gestores do sistema Cantareira. "Se o volume morto secar, não temos outro plano". Para Lahóz, orgulhoso da capacidade de reutilização dos recursos da região -o corpo de bombeiros usa a água tratada das estações de esgoto- é necessário que as autoridades sejam claras para abordar o problema. "Está faltando que o governo municipal e estadual comuniquem à comunidade a realidade, para que o cidadão possa reduzir o consumo. Sem isso, não vai ter programa que funcione".

Para os cerca de um milhão de moradores de Guarulhos, junto com os de Diadema, São Caetano do Sul, Valinhos, Vinhedo e Itú, o racionamento de água fez com que, em fevereiro, se conscientizassem à força com a realidade. A torneira de Elias Lopes do Santos, taxista de 52 anos e vizinho de Guarulhos, só oferece água dia sim dia não. “Eu que moro apenas com minha mulher, tenho minha própria reserva de 1.000 litros e sempre fui responsável nesse quesito não sofro tanto, mas as famílias maiores estão tendo grandes dificuldades para lidar com o rodízio de água”, explica. “Eu estou aborrecido. Não houve investimento pelo Governo do Estado para a construção de um novo reservatório, mas também nunca fizeram nada para o tratamento efetivo da água. Eu sinto vergonha toda vez que passo pelo rio Tietê e o rio Pinheiros”, lamenta.

Alguns especialistas concordam com o fato de que não foi apenas a falta de chuva deste verão -50% abaixo do normal- e as altas temperaturas que levaram o Estado a atual crise de abastecimento. "Nosso sistema está completamente desfasado no tempo. Há 30 anos que temos os mesmos mananciais porque nenhum governo investiu para ampliar o sistema, enquanto a cidade crescia, chegando a mais de dez milhões de pessoas", lamenta Julio Cesar Cerqueira, engenheiro civil e membro do Conselho de Meio Ambiente da Federação de Indústrias de São Paulo (FIESP).

O Governo do Estado de São Paulo é, há 20 anos, administrado pelo PSDB, partido do atual governador Geraldo Alckimn. Para Cerqueira, a situação chegou até este limite porque o Governo de Alckmin, que aspira à reeleição em 4 de outubro, "continuou distribuindo água como se não houvesse seca". Uma eventual crise do abastecimento de água no Estado, às vésperas das eleições, poderia prejudicar seus planos políticos.

O Governo do Estado não adotou o racionamento de água, porque seria uma “medida cruel” segundo a Sabesp, e se recusou punir os excessos de consumo. O que fez foi criar um bônus que premia com 30% de desconto na fatura mensal os clientes que conseguirem baixar 20% de seu consumo de água. Uma medida que é um sucesso para o órgão, dado que mais da metade dos usuários conseguiu fazer essa redução, mas insuficiente para alguns.

“A Grande São Paulo precisa reduzir seu consumo em 50%. Se for assim poderíamos nos manter por vários meses em um estado de tranquilidade”, afirma Lahóz do consórcio PCJ.

Hoje, as previsões meteorológicas são recebidas com inquietude. Enquanto a Sabesp afirma que meteorologistas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) já preveem que o volume de precipitação da próxima estação chuvosa será igual ou maior do que a médias dos anos anteriores, devido ao fenômeno El Niño, o Instituto Nacional de Meteorologia lamenta não poder oferecer uma previsão. “Não temos como saber se o ciclo de pouca chuva que vivemos no verão vai continuar”, afirma Helena Turon Balbino, meteorologista do instituto.

Elias Lopes, o taxista de Guarulhos, tem sua própria predição. “A natureza castigou os governantes”.

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