_
_
_
_

O setor privado venezuelano exige em uníssono o pagamento da dívida

A indústria alimentícia se une às linhas aéreas e aos jornais impressos como os atores mais ativos em cobrar do governo a entrega de divisas para operar

Um jovem protesta a favor da compra de papel de jornal.
Um jovem protesta a favor da compra de papel de jornal.M. Gutiérrez (EFE)

Não é só uma goteira. São ao menos três e ameaçam se converter em uma inundação. A indústria processadora de alimentos se uniu às linhas aéreas e aos jornais impressos para cobrar dívidas do governo venezuelano. Todos estes atores esperam há vários meses que a estatal Comissão de Administração de Divisas (CADIVI) entregue as divisas preferenciais para manter sua operação.

Nesta quarta-feira a Câmara Venezuelana da Indústria de Alimentos (CAVIDEA) publicou um extenso anúncio na imprensa local para expor sua situação: A dívida de CADIVI com o setor chega a 2,4 bilhões de dólares (5,8 bilhões de reais). “Nossos membros estão produzindo à plena capacidade em um meio econômico de custos crescentes e dificuldades para a aquisição de matérias prima e insumos (…) Os preços regulados, incluindo os que foram congelados há dois anos, não se ajustaram de acordo com a revisão trimestral prevista, o que impediu a obtenção de uma rentabilidade conforme as necessidades de investimento”.

O chavismo estabeleceu um rígido controle de mudanças em 2003 que impede a livre compra e venda de moedas. Empresas públicas e privadas vão ao governo para que este autorize as divisas –a uma mudança de 6,30 bolívares por dólar- que lhes permita importar matérias prima ou produtos manufaturados.

A dívida, segundo CAVIDEA, é o principal obstáculo para a produção de alimentos na Venezuela, porque impede as empresas de pagar seus compromissos com os fornecedores internacionais e contar com linhas de crédito. Em um país com tradição importadora como a Venezuela a falta de dólares para importar é a principal razão do generalizado desabastecimento. Em 2013, segundo cifras do Banco Central de Venezuela, a escassez chegou a 22,2%, a média mais alta da última década. Embora no passado teve picos de maior carestia esta é a primeira vez em tanto tempo que a escassez já faz parte da paisagem. Basta percorrer as prateleiras de supermercados, lojas de ferragens ou vendas de eletrodomésticos para comprová-lo. Na Venezuela o cotidiano começa a ser extraordinário.

Esta cifra se soma aos valores já conhecidos pela opinião pública: uma dívida de 3,6 milhões de dólares com as linhas aéreas –que provocou a redução da oferta de assentos disponíveis para viajar desde Caracas-, de 2,3 milhões de dólares com o setor farmacêutico, de 4 milhões de dólares com o diário O Nacional e de 877 mil dólares com o jornal O Carabobeño, da cidade de Valencia.

Durante toda a semana os jornalistas de diversos impressos, acompanhados por diretores da entidade que os agrupa, protestaram exigindo o pagamento de divisas. Até agora a pressão não tem surtido efeito. Por essa razão a partir desta quinta-feira O Nacional reduzirá sua paginação a dois corpos. “Se antes tínhamos papel para três semanas agora poderemos circular por dois meses com este nível de inventário”, assegurou a este diário o editor-presidente dessa publicação Miguel Henrique Otero.

Há duas razões possíveis que explicam a demora em honrar os compromissos. A primeira é a falta de dinheiro. As cifras mais conservadoras indicam que o governo deve ao setor privado entre 9 bilhões a 10 bilhões de dólares. Para o dia 28 de janeiro as reservas internacionais estavam em 21,1 bilhões de dólares. Boa parte desse dinheiro está em ouro e a disponibilidade de efetivo alcança mal dá, segundo os cálculos de economistas, para pagar em uma semana de importações.

A outra razão, mais política, é a decidida vontade do Governo de fiscalizar com rigor que não se sobrefaturem as importações. No passado reconheceram que entregaram a empresas fantasmas ou que sobrefacturaram suas encomendas mais de 20 bilhões de dólares. Essa decisão ficou em evidência ao conhecer-se a desvalorização da moeda local, o bolívar, que incluiu uma drástica redução da cota anual de divisas autorizas/autorizadas aos particulares para consumos no exterior. O vice-presidente da área econômica e ministro de Energia e Petróleo, Rafael Ramírez, duvidou das cifras dadas a conhecer pelo setor privado. “Ali há muita gordura”, disse.

Uma fonte do setor farmacêutico que pediu a reserva de sua identidade confirmou a este diário que o governo, através do ministro de Saúde Francisco Armada, demonstrou sua vontade de cancelar toda a dívida se reconhecesse um desconto de 40%. “É claro que nós não aceitamos. Que estabeleçam um cronograma de pagamento”, explicou. É a mesma fórmula utilizada pela estatal Petróleos de Venezuela com seus fornecedores e sócios entre 2008 e 2009 quando caiu o preço do barril de petróleo a 35 dólares pela crise financeira mundial. Aquela vez saíram do atoleiro. Desta vez o assunto não parece tão simples.

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo

¿Quieres añadir otro usuario a tu suscripción?

Si continúas leyendo en este dispositivo, no se podrá leer en el otro.

¿Por qué estás viendo esto?

Flecha

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo y solo puedes acceder a EL PAÍS desde un dispositivo a la vez.

Si quieres compartir tu cuenta, cambia tu suscripción a la modalidad Premium, así podrás añadir otro usuario. Cada uno accederá con su propia cuenta de email, lo que os permitirá personalizar vuestra experiencia en EL PAÍS.

En el caso de no saber quién está usando tu cuenta, te recomendamos cambiar tu contraseña aquí.

Si decides continuar compartiendo tu cuenta, este mensaje se mostrará en tu dispositivo y en el de la otra persona que está usando tu cuenta de forma indefinida, afectando a tu experiencia de lectura. Puedes consultar aquí los términos y condiciones de la suscripción digital.

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_