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G7 fracassa em tentativa de fazer Biden estender prazo de retirada do Afeganistão

Presidente dos Estados Unidos mantém data limite em 31 de agosto, enquanto aliados ocidentais pedem ao Talibã que permita a saída após o final do mês

O primeiro-ministro britânico Boris Johnson presidindo a reunião virtual do G7 sobre o Afeganistão, na terça-feira.
O primeiro-ministro britânico Boris Johnson presidindo a reunião virtual do G7 sobre o Afeganistão, na terça-feira.DPA vía Europa Press (Europa Press)
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DEH AFGHAN, AFGHANISTAN - JUNE 22:  American soldiers from the 10th Mountain Division deploy to fight Taliban fighters as part of Operation Mountain Thrust to a U.S. base near the village of Deh Afghan on June 22, 2006 in the Zabul province of Afghanistan. The US military announced today that four American soldiers were killed in fighting after coalition forces attacked enemy extremists in north-eastern Afghanistan.  The anti-Taliban operation, mainly by American, British and Canadian forces, entered it's second week across a vast area in southern Afghanistan.  (Photo by John Moore/Getty Images)
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KABUL, AFGHANISTAN - AUGUST 23: Soldiers of Turkish Task Force in Afghanistan are on duty in and around Hamid Karzai International Airport to help people who are waiting for evacuation, in Kabul, Afghanistan on August 23, 2021. The soldiers are also working on the coordination of the evacuation in a headquarters building named "Ankara". (Photo by Aykut Karadag/Anadolu Agency via Getty Images)
Talibã alerta contra a presença de tropas dos EUA no Afeganistão após 31 de agosto

A reunião extraordinária realizada nesta terça-feira pelo G7 foi uma tentativa desesperada de salvar a retirada em curso de milhares de estrangeiros e afegãos em situação vulnerável no Afeganistão. Os líderes dos sete países mais ricos do mundo (Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, França, Alemanha, Itália e Japão) têm tentado chegar a um acordo para uma posição comum sobre a repatriação, impossível por causa da insistência de Washington em manter a data-limite da saída em 31 agosto, como também por conta dos percalços da própria crise afegã —o primeiro deles sobre como será o diálogo do mundo com o Talibã e a nova crise migratória que está apenas começando.

Os eventos acontecem em forma de cascata. Além disso, o que até segunda-feira era uma data-limite, ou um prazo operacional, tornou-se um ultimato depois que o Talibã avisou que não permitiria mais partidas do aeroporto de Cabul após 31 de agosto. Os membros do G7 não chegaram a um acordo, exceto na fórmula diplomática de pedir ao Talibã que garanta a saída após essa data. A bola, agora, está com as novas autoridades em Cabul, enquanto o grupo mais poderoso do mundo deixa à mostra seus próprios desentendimentos.

Os europeus, resignados com a insistência dos Estados Unidos em manter seus planos, estão, portanto, tentando transferir a pressão para os talibãs: os rebeldes terão que garantir a saída dos afegãos solicitantes por meio de terceiros países se por acaso quiserem receber ajuda humanitária —esta coordenada pela ONU—, além de se comprometerem a respeitar os direitos humanos antes mesmo de considerar a legitimidade de seu Governo perante a comunidade internacional. O G7 diz estar disposto a trabalhar no Afeganistão com seus aliados e com outros países, por meio da ONU e do G20, mas não conseguiu convencer Joe Biden a estender o prazo de saída. Para o democrata, ceder aos parceiros do G7 seria o mesmo que apelar ao Talibã, levando a uma imagem de humilhação.

“O presidente Biden decidiu, em consulta com sua equipe de segurança nacional, cumprir o prazo de 31 de agosto para retirar as tropas do Afeganistão”, disse um alto funcionário do Governo dos EUA à CNN, nesta terça-feira. “Biden tomou esta decisão ciente dos riscos de segurança que existem agora” em Cabul, acrescentou a fonte, ponderando, contudo, que ele pediu ao Pentágono “planos de contingência” para uma possível ampliação do prazo de retirada, caso o Talibã não coopere.

A solução, insuficiente para países que, como Reino Unido, França e Alemanha solicitaram uma prorrogação, foi apresentada pelo primeiro-ministro britânico e anfitrião da reunião, Boris Johnson, alertando o Talibã de suas obrigações de “garantir a passagem com segurança” de todos aqueles que quiserem abandonar o país depois do dia 31 de agosto. Para reforçar o clima de fiasco da cúpula, seu homólogo italiano, Mario Draghi, destacou que os países europeus não têm uma posição comum sobre o novo fluxo migratório causado pelo colapso do Afeganistão, mas que, nos demais assuntos, o bloco espera contar com a ajuda de potências regionais (Rússia, China, Arábia Saudita e Índia), além da Turquia, que pretende gerenciar o aeroporto de Cabul e não está fechada a uma colaboração com o novo regime. A chanceler alemã, Angela Merkel, propôs uma retirada “por via civil” para evitar mais caos no aeroporto de Cabul após 31 de agosto. O canadense Justin Trudeau confirmou o propósito do G7 de “salvar o maior número de pessoas possível” no Afeganistão.

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Mesmo assim, Johnson apresentou os resultados da reunião como uma conquista. “O que fizemos hoje, o G7, é que... concordamos não apenas em uma abordagem conjunta para lidar com a retirada, como também em um roteiro para nosso relacionamento futuro com o Talibã”, disse ele, segundo informou a agência Reuters.

A data que Biden havia previsto para a retirada das tropas —isso de forma antecipada, já que, em princípio, a saída terminaria em 11 de setembro— acabou se tornando uma corda no pescoço de Governos ocidentais. Países com presença no Afeganistão removeram cerca de 60.000 pessoas nos últimos dez dias, mas ainda há milhares no aeroporto esperando para sair. Em meio a movimentos frenéticos no local e uma escalada crescente de violência, o risco concreto de a repatriação descarrilar se o Ocidente e o Talibã não conseguirem chegar a um acordo aumenta a cada hora que passa. Biden, alvo de críticas por sua atuação à frente da retirada do Afeganistão, mais uma vez se viu encurralado entre as demandas dos parceiros do G7 (para alongar o cronograma) e o ultimato do Talibã. Agradar a seus aliados sem ter que se humilhar diante dos fundamentalistas afegãos é a difícil escolha que hoje divide o democrata.

As dúvidas e as diferentes demandas em torno do calendário hoje causaram uma enxurrada de mensagens contraditórias. O Pentágono indicou que continua considerando 31 de agosto como a data máxima para concluir a partida de suas tropas e a remoção de todos os norte-americanos e de seus colaboradores afegãos. Fontes da OTAN seguem a mesma linha: de acordo com um funcionário da Aliança citado pela Reuters, “cada membro das forças estrangeiras está trabalhando em marchas forçadas para cumprir o prazo”.

Outros, no entanto, como o democrata Adam Schiff, que preside o Comitê de Inteligência da Câmara dos Representantes, expressaram dúvidas sobre a conclusão dos planos de retirada na data marcada por Washington. “É possível, mas acho altamente improvável, dado o número de americanos que ainda não foram retirados”, disse Schiff. O também democrata Jason Crow, veterano do Afeganistão, defendeu a conveniência de estender o limite: “Se não estamos dispostos a usar o Exército para proteger os cidadãos dos Estados Unidos, nossos parceiros e amigos, então, para que vamos usá-lo?”. A oposição republicana se expressou em termos semelhantes. Seu líder no Senado, Mitch McConnell, recomendou Biden a “esquecer” o prazo e “ampliar o perímetro de segurança ao redor do aeroporto de Cabul para retirar todos os cidadãos americanos”. Tud sem sucesso, como o suposto consenso dentro do G7.

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