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Pouco a comemorar na América Latina, onde ser LGBTQIA+ é ser alvo

No Dia do Orgulho Gay, entidades lembram que entre 2014 e 2020 pelo menos 3.514 pessoas LGBTQIA+ foram assassinadas na região e no Caribe

Una persona sostiene un retrato de Andrea González, activista de la comunidad LGBTI asesinada el pasado 11 de junio en Guatemala. En video, las cifras de agresiones homofóbicas en América Latina y el Caribe.Foto: AFP | Video: Reuters | Vídeo: Johan ORDONEZ
Sally Palomino

Não há nada que impeça os ataques à população LGBTQIA+ se a impunidade continua sendo uma aliada dos agressores. Samantha, uma mulher trans de 23 anos, foi baleada em uma rua de Mariquita, uma cidadezinha da Colômbia, em janeiro passado, e sua família ainda aguarda justiça. Sammy, como a chamavam os que a conheciam por seu trabalho como estilista, foi morta a tiros por homens em uma motocicleta, e seu assassinato deu início à cifra, que já chega a 14 casos, de mulheres transexuais assassinadas este ano no país, de acordo com a organização Colômbia Diversa, que enfatiza haver subnotificação de casos. Podem ser mais. A última vítima foi Luciana Moscoso, também estilista. O corpo foi encontrado no início de junho em seu apartamento, dois dias depois do crime, de acordo com o exame forense. Quem as matou? Seus parentes e amigos perguntam, mas ninguém responde.

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Sem Violência LGBTI, entidade que reúne organizações de direitos humanos de onze países da região, alerta para essa violência incontrolável e incompreensível. O que emerge de seu relatório feito por ocasião do dia do orgulho gay, comemorado neste 28 de junho, deixa pouco a festejar. Entre 2014 e 2020, pelo menos 3.514 pessoas LGBTQIA+ foram assassinadas na América Latina e no Caribe, das quais 1.401 delas por motivos relacionados ao preconceito contra sua orientação sexual ou identidade de gênero. Só em 2019 foram registrados 327 casos e, em 2020, em meio à pandemia do coronavírus, foram 351 vítimas.

Embora em todos os países da região a situação seja dramática, em alguns é pior: Colômbia, México e Honduras concentraram 87% do total de vítimas em 2019 e 89% no ano passado. “Uma das hipóteses que estudamos como causa da maior mortalidade nesses países é que há uma maior presença de grupos armados e da força pública, que exercem violência sobre essa população, além de serem locais com corredores migratórios que também têm um efeito nesse tipo de crime “, afirma Marlon Acuña, coordenador da rede regional Sem Violência LGBTI.

O Brasil é um caso à parte. Segundo a mesma entidade, não há dados sólidos sobre os atos de violência ocorridos em 2020 no país contra homossexuais, lésbicas e transexuais. “O que está acontecendo no Brasil é preocupante, nossas organizações parceiras no país não têm informações suficientes para acompanhar os casos e não é possível estabelecer uma cifra”, diz Acuña. A Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) denunciou em janeiro que no ano passado ocorreram 175 assassinatos de transexuais no Brasil.

O ano de 2020 foi duplamente letal para a comunidade LGBTQIA+. Além de ter que lidar, como o restante do mundo, com uma pandemia, continuaram sendo vítimas da violência. A rua deixou de ser o palco dos crimes contra eles. Transferiram-se para as casas, como aconteceu no caso de Luciana Moscoso, encontrada assassinada em seu apartamento. Em 43% dos casos registrados no ano passado, não se sabe onde ocorreram.

“Medidas como toques de recolher, limitação de acesso aos serviços —com base no documento de identidade ou no gênero—, bem como o envio de forças policiais e militares para garantir o cumprimento das restrições, aumentaram os riscos de violência não letal por parte de agentes do Estado e indivíduos em razão do preconceito contra a orientação sexual ou identidade de gênero das vítimas”, diz o relatório da organização Sem Violência LGBTI, que também indica que a crise de saúde teve consequências no registro de mortes violentas de que foram vítimas. “A gestão da pandemia também impôs desafios que ameaçaram sobrecarregar a capacidade judicial e forense dos Estados. As entidades também enfrentaram dificuldades que podem resultar em intermitências nos registros”, destaca a organização.

Andrea González, uma mulher trans e ativista da Guatemala, foi morta a tiros em 11 de junho. Tinha 28 anos, era líder política e representante legal da Otrans, uma organização comunitária que trabalha pelas pessoas LGBTQIA+. “Foi morta por balas de ódio, pelo patriarcado e a ausência do Estado”, afirmam suas amigas. Dois dias antes, também na Guatemala, a vítima foi Cecy Caricia Ixpatá. Foi encontrada agonizante depois de ter sido espancada em um mercado onde vendia frutas e vegetais. Não conseguiu se recuperar dos golpes e morreu no hospital. Era vendedora e integrante da Redtrans desde 2012. Em nenhum dos dois casos há presos. A justiça não busca os responsáveis por esses assassinatos.

“Quando matam os líderes, estão enviando uma mensagem para uma comunidade inteira. Com essas mortes, desaparecem aqueles que trabalham para dar visibilidade e garantir justiça e inclusão”, afirma Acuña, da Sem Violência LGBTI. Para esta organização é evidente a falta de ações dos Estados para prevenir, atender às pessoas e punir esta violência, que continua a ceifar vidas na total impunidade.

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