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Intelectuais cubanos lançam um manifesto contra o regime: “Urge recuperar o poder político que nos usurparam”

Documento pede à sociedade cubana que exija liberdades políticas, econômicas e a legalização de veículos de comunicação independentes

Carlos S. Maldonado
Cubanos presenciam do telhado a passagem dos restos mortais do ex-presidente Fidel Castro, em Santa Clara, Cuba, em dezembro de 2016.
Cubanos presenciam do telhado a passagem dos restos mortais do ex-presidente Fidel Castro, em Santa Clara, Cuba, em dezembro de 2016.Chip Somodevilla

Um novo manifesto político contra o regime de Havana foi publicado por centenas de intelectuais, artistas e jornalistas, principalmente jovens impulsionados pela saturação com o Estado policial e a perseguição política na ilha caribenha. Batizado como 27N, este novo movimento se formou para exigir ao Governo cubano a garantia de liberdades civis, mas principalmente com um pedido contundente à sociedade cubana: recuperar o poder político que, dizem, o regime “usurpou”.

“Queremos um país inclusivo, democrático, soberano, próspero, equitativo e transnacional”, alegam os assinantes do manifesto, publicado em 12 de abril. Este novo movimento se formou com a onda de renovação que desde o final do ano passado foi criada por novos artistas que com coragem desafiaram o Governo, que mantém uma política de perseguição às vozes dissidentes. Os integrantes do 27N explicam que criaram a iniciativa a partir de um protesto de 27 de novembro diante da sede do Ministério da Cultura, em que exigiram o reconhecimento das liberdades civis e dos direitos dos cubanos. Nesse dia, além disso, se manifestaram contra a decisão das autoridades cubanas de invadir na noite de 26 de novembro a sede do Movimento San Isidro e prender durante horas quinze pessoas, entre elas Carlos Manuel Álvarez, jornalista e escritor, diretor da revista El Estornudo e colaborador do EL PAÍS.

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O manifesto eleva a temperatura do debate político em Havana, onde o regime viu com espanto e irritação como esses jovens exigem a necessidade de um diálogo na ilha que inclua temas como a liberdade de expressão e a tolerância política. Em seu manifesto os assinantes lançam argumentos demolidores: “Desejamos uma nação onde se expressar livremente não seja um ato de coragem, e sim uma consequência natural do pensamento autônomo. Onde não exista o ódio político, a violência policial, a repressão, a censura, a manipulação midiática, a violação da privacidade, os atos de repúdio; enfim, as práticas abusivas de poder exercidas por uma direção política centralizada, militar e partidária, que discrimina e anula os dissidentes, violando seus direitos humanos”.

O texto pede a permissão da discrepância e do exercício da crítica para “evitar a imobilidade, a corrupção e a ação maléfica dos funcionários e qualquer outro ente da sociedade que atente contra seu desenvolvimento”. Um dos pontos mais desafiantes é o que exige “sanar os danos que a doutrinação causou; substituir as mentiras e maus hábitos aprendidos, pela vontade e o compromisso de resgatar a honestidade e o amor à verdade como princípio”.

A parte mais eloquente, entretanto, é a mensagem que enviam à sociedade cubana, a quem pedem para “descentralizar e recuperar o poder político que nos usurparam”, em um desafio direto ao poder absoluto exercido pelo Partido Comunista, amo e senhor da ilha, que controla com mão de ferro a vida dos cubanos desde a vitória da revolução, em 1959. Os assinantes do manifesto, pensando em uma possível mudança em seu país, afirmam que esperam que a Cuba do futuro “seja criada a partir das necessidades e desejos de toda a população cubana, com direitos iguais para participar de sua criação, além de sua ideologia, filiação política e o lugar onde moram”.

O documento centra as demandas ao regime na garantia das liberdades políticas, incluindo liberdade de expressão, de criação, de protesto e manifestação pacífica; as liberdades econômicas, relacionadas “ao direito de todo cidadão às diversas formas de participação econômica, de propriedade e gestão”; a legalização de veículos de comunicação independentes e o direito de associação.

O trecho final é um pedido de rebeldia aos cubanos: “Com a convicção de que ganhar estes direitos começa pela vontade de defendê-los com coragem, solicitamos a todos os cubanos, dentro e fora de Cuba, à união, à paz, ao entendimento e à comunicação, à procura da verdade, expressando o que pensamos e sentimos, defendendo solidariamente os que são reprimidos e difamados por se expressar livremente”.


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