_
_
_
_

Após protestos, Macron aceita revisar a polêmica lei de segurança

Presidente promoverá mudanças na polícia depois das recentes imagens de violência

"França, o mundo está te observando", diz um cartaz na manifestação de sábado em Paris contra a lei de segurança, de Macron.
"França, o mundo está te observando", diz um cartaz na manifestação de sábado em Paris contra a lei de segurança, de Macron.CHRISTIAN HARTMANN (Reuters)
Marc Bassets
Mais informações
People lights candle outside the Notre-Dame de l'Assomption Basilica in Nice on October 29, 2020 in tribute to the three victims of a knife attacker, cutting the throat of at least one woman, inside the church of the French Riviera city. (Photo by Valery HACHE / AFP)
França ativa alerta máximo de terrorismo após ataque que matou uma brasileira
Un hombre sostiene un póster con una caricatura de Emmanuel Macron como el diablo, durante una protesta contra Francia en Estambuel, el 30 de octubre.
Macron lança ofensiva internacional para defender seu plano contra o radicalismo islâmico
Saint-etienne (France), 07/11/2020.- French Prime Minister Jean Castex, wearing a face mask, talks with an emergency responder (SAMU) at the CHU - Hopital Nord (North Hospital) in Saint-Etienne, France, 07 November 2020, as France is facing a second wave of the Covid-19 pandemic caused by the novel coronavirus. (Francia) EFE/EPA/JEAN-PHILIPPE KSIAZEK / POOL MAXPPP OUT
Casos de coronavírus na Europa sobem 150% em 20 dias

O presidente francês, Emmanuel Macron, busca uma saída da confusão que ele mesmo, seus ministros e seus deputados causaram com a chamada lei de segurança global. Macron quer uma revisão da lei e de seu artigo mais polêmico, o 24, que limita a divulgação de imagens de policiais e gendarmes (policiais militares) e que viola a liberdade de informação, segundo denunciaram no sábado dezenas de milhares de franceses que se manifestaram por toda a França. Macron tenta evitar que o mal-estar social se sedimente e acabe causando uma crise política em meio a uma crise econômica e de saúde. Ele pretende introduzir mudanças nos métodos de formação e liderança das forças de segurança em razão de repetidos episódios de violência, conhecidos justamente graças aos vídeos cuja divulgação o artigo 24 busca restringir.

Diante dos protestos maciços, Macron tenta limitar os danos e evitar uma crise política que se somaria à crise econômica e de saúde que a França atravessa e que, ao contrário destas duas últimas, é produto de erro de cálculo e gestão do próprio presidente e seu Governo. Macron convocou nesta segunda-feira para uma reunião no Palácio do Eliseu o primeiro-ministro Jean Castex, os ministros do Interior e da Justiça, Gérald Darmanin e Éric Dupond-Moretti, e os líderes da maioria presidencial na Assembleia Nacional, para passar-lhes um sermão e pôr em ordem a uma situação que ameaça escapar ao seu controle.

“Vamos propor uma nova redação completa para o artigo 24”, disse Christophe Castaner, líder do A República em Marcha (LREM), partido de Macron, após o encontro. O artigo prevê um ano de prisão e multa de 45.000 euros (290.000 reais) a quem divulgar, “com o objetivo de atentar contra a integridade física ou mental”, imagens do rosto de agentes das forças da ordem. O temor é que a ambiguidade na hora de interpretar se as imagens publicadas têm intenção maléfica possa levar a uma restrição do direito de documentar abusos cometidos por policiais.

As palavras de Castaner não significam que o artigo será suprimido, como pede parte da oposição, mas são uma admissão de responsabilidade: os mesmos deputados que agora o reescreverão o apoiaram em 21 de novembro por esmagadora maioria. E esta não seria a primeira revisão do texto.

Em 19 de novembro ―quando desde sindicatos de jornalistas à Defensoria Pública alertaram para os perigos da lei para a liberdade de expressão―, o premiê Castex pactuou com os deputados uma emenda que visa a garantir a preservação do direito à informação. A primeira revisão não adiantou muito.

O texto, depois de aprovado na Assembleia Nacional, foi para o Senado, que o analisará em janeiro. Mas o clamor contra o Artigo 24 continuou a crescer. Ganhou corpo depois da remoção violenta, na noite de segunda-feira, dia 23, de um acampamento de imigrantes na Place de la République, região central de Paris. E explodiu depois que na quinta-feira, dia 26, veio a público um vídeo no qual três policiais são vistos espancando sem motivo um produtor de música negro, Michel Zecler, em seu estúdio parisiense. “As imagens que todos vimos da agressão a Michel Zecler são inaceitáveis. Envergonham a todos nós”, escreveu Macron no Facebook. A indignação era transversal e chegou ao próprio Eliseu.

Anos de denúncias

Os episódios de violência policial funcionaram como um eletrochoque de duplo efeito. Primeiro, pelas ações violentas e arbitrárias das forças da ordem, denunciadas durante anos, mas raramente documentadas com a dureza da semana passada. E em segundo lugar, pela evidência de que muitas dessas ações jamais seriam conhecidas, e os responsáveis não seriam punidos, se não fosse pelas câmeras e pelo direito de veicular as imagens.

Castex disse que criaria uma comissão independente “encarregada de propor uma nova redação para o Artigo 24”. Era a segunda revisão anunciada em uma semana, mas teve vida curta. Os líderes do LREM e os aliados de Macron na Assembleia Nacional se sublevaram contra o que consideravam uma interferência do Poder Executivo no Legislativo.

O descontentamento dos deputados macronistas, que raramente criticam o Governo em público, era cada vez mais evidente. Acusavam Castex de desprezá-los e o ministro do Interior por ter semeado a confusão sobre a lei que ele próprio havia promovido, ao declarar, por exemplo, que está proibido gravar a polícia ―algo que ele não disse― e que obrigaria os jornalistas a se credenciarem para cobrir as manifestações.

Os enormes protestos no sábado ―em sua maioria pacíficos, mas que resultaram em 88 policiais feridos— deixaram em evidência que a lei pode se tornar um problema grave para Macron. Um problema legislativo, mas também social, se a desconfiança entre uma parte da população e a polícia se instalar de forma duradoura.

A primeira resposta é a vontade dos deputados macronistas de “reescrever completamente” o artigo 24, a terceira revisão anunciada em menos de 15 dias. Castaner não revelou em que consistirão as mudanças. A segunda resposta de Macron consistiu em encarregar Darmanin, debilitado por seus excessos retóricos, de baixar o tom e propor reformas nas forças da ordem.

Perante a Comissão de Assuntos Judiciais da Assembleia Nacional, o ministro do Interior apontou deficiências na formação de polícias e gendarmes, falta de equipamentos e erros de comando. Durante anos, as autoridades francesas se recusaram a reconhecer que a “violência policial” era uma realidade: tratava-se de casos isolados, maçãs podres, de forma alguma um problema sistêmico. Darmanin admitiu nesta segunda-feira a existência de “problemas estruturais”.

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo

¿Quieres añadir otro usuario a tu suscripción?

Si continúas leyendo en este dispositivo, no se podrá leer en el otro.

¿Por qué estás viendo esto?

Flecha

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo y solo puedes acceder a EL PAÍS desde un dispositivo a la vez.

Si quieres compartir tu cuenta, cambia tu suscripción a la modalidad Premium, así podrás añadir otro usuario. Cada uno accederá con su propia cuenta de email, lo que os permitirá personalizar vuestra experiencia en EL PAÍS.

En el caso de no saber quién está usando tu cuenta, te recomendamos cambiar tu contraseña aquí.

Si decides continuar compartiendo tu cuenta, este mensaje se mostrará en tu dispositivo y en el de la otra persona que está usando tu cuenta de forma indefinida, afectando a tu experiencia de lectura. Puedes consultar aquí los términos y condiciones de la suscripción digital.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_