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Fernández apresenta uma ambiciosa reforma para superar suposta politização da Justiça argentina

Oposição considera que o projeto busca blindar judicialmente a ex-presidenta Cristina Kirchner

O presidente da Argentina, Alberto Fernández, apresenta um projeto de reforma da Justiça, na Casa Rosada.
O presidente da Argentina, Alberto Fernández, apresenta um projeto de reforma da Justiça, na Casa Rosada.Reuters
Federico Rivas Molina
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Com toda a pompa, Alberto Fernández usou o Salão Branco da Casa de Governo, um amplo espaço de estilo francês reservado a grandes cerimônias, para apresentar uma ambiciosa reforma do sistema judicial argentino. O projeto, a ser enviado nesta semana ao Congresso, aponta sobretudo contra o poder acumulado pelos juízes federais encarregados das ações de combate à corrupção, além de crimes como narcotráfico e terrorismo. Fernández considera que os 12 atuais integrantes do Tribunal Regional Federal da capital se “politizaram” e cederam sua independência ao poder da vez. Se o projeto prosperar, o número de juízes dessa corte subirá para 46, por causa da fusão com outros tribunais. A oposição alega que o único objetivo do projeto é blindar a vice-presidenta Cristina Kirchner das ações que enfrenta por supostos crimes de corrupção.

A Justiça não tem boa imagem na Argentina. Fernández, advogado de profissão e professor de direito na Universidade de Buenos Aires, atribui a maior parte dos males aos magistrados do tribunal federal da avenida Comodoro Py, encarregados de julgar as ações de corrupção política. São apenas 12, e seu poder é enorme. Nesses gabinetes tramitam as ações contra Cristina Kirchner e outros ex-funcionários graduados do seu Governo. Mas também as que Mauricio Macri e alguns ex-ministros passaram a enfrentar nos últimos tempos.

Para Fernández, os juízes dessa instância há anos atuam conforme a tendência política da vez na Casa Rosada. O novo projeto, disse ele, “busca superar o fato de que o poder decisório se concentre em um reduzido número de magistrados e magistradas, que têm o poder de decidir na totalidade das causas com relevância institucional e consequentemente midiáticas”. Esta concentração de causas de alto impacto em tão poucas mãos “tem sido determinante para que este fórum tenha se politizado”, disse o presidente argentino.

Junto com a fusão de tribunais, o projeto cria um conselho consultivo de 11 juristas que levará ao Executivo recomendações para outras mudanças estruturais na Justiça. Suas propostas, não vinculantes, poderão se transformar em projetos de lei. O conselho tem entre seus membros figuras críticas ao Governo, mas também o advogado de Cristina Kirchner, e pôs a oposição macrista em alerta.

Na semana anterior à apresentação desta quarta-feira, a imprensa argentina repercutiu um suposto projeto da comissão para elevar de cinco para nove o número de juízes da Corte Suprema, uma reforma que pode abrir a porta a uma maioria afinada com o oficialismo. O Governo nega. “As pessoas ouvem falar em ‘Corte’ e já acham que vamos atrás da Corte. Não é assim. Tudo o que fará essa comissão, que é muito plural, será sobre questões estruturais”, diz ao EL PAÍS a ministra da Justiça, Marcela Losardo, logo depois da apresentação do projeto de lei na Casa Rosada. Losardo insistiu também na necessidade de mudanças no tribunal federal, onde “temos uma ação, como a do atentado terrorista contra a [entidade judaica] AMIA sem resultados há 26 anos”. A demora, diz, “muitas vezes se deve a que a Justiça ficou olhando e esperando o que diga o poder [Executivo]. A Justiça precisa estar fora dessas pressões políticas, corporativas, midiáticas e empresariais”.

A oposição já adiantou que rejeitará a reforma. Vê por trás a mão de Cristina Kirchner, desejosa, segundo sua leitura, de acabar com os juízes federais que a investigam. “Este não é o projeto que conviria a Cristina, porque continuará sendo julgada pelos mesmos juízes. O projeto respeita o juiz natural de todos os processos. Não vejo de onde isso pode beneficiar Cristina”, responde Losardo.

O macrismo se somou às suspeitas de um avanço contra a Corte Suprema, onde tramitam os pedidos de nulidade processual apresentados pelos advogados da ex-presidenta. Em um documento que leva a assinatura do ex-presidente Mauricio Macri e de outras referências do seu partido, a oposição disse também que uma reforma estrutural da Justiça não é agora um tema premente para uma sociedade “preocupada com angústias e carências evidentes em matéria econômica, social e de segurança”, derivadas da pandemia de coronavírus. Sobre a Corte, advertiu que “a estabilidade no tempo do máximo tribunal é um valor em si mesmo, que resguarda a independência do Poder Judiciário”.

O projeto do Executivo chegará nesta semana ao Congresso pelo Senado, onde o Governo tem maioria. Já na Câmara os votos não estão assegurados. O macrismo prometeu ir à luta.

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