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Pesquisadores investigam se coronavírus se infiltra no cérebro através do nariz

Várias autópsias mostram como o vírus se espalha pelo sistema nervoso da mucosa olfativa

Pedaço de célula da mucosa olfativa observada ao microscópio, com as partículas do coronavírus destacadas em vermelho (a cor não é real).
Pedaço de célula da mucosa olfativa observada ao microscópio, com as partículas do coronavírus destacadas em vermelho (a cor não é real).Servicio Ilustrado (Automático) (Europa Press)
Miguel Ángel Criado

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O coronavírus chega ao cérebro subindo pelo nariz. Essa é a possibilidade defendida por um grupo de cientistas alemães que analisou tecidos de mais de 30 pessoas mortas pela covid-19. Em sua autópsia, encontraram rastros do vírus desde a mucosa olfativa até a região cerebral.

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FILE - This May 4, 2020, file photo provided by the University of Maryland School of Medicine, shows the first patient enrolled in Pfizer's COVID-19 coronavirus vaccine clinical trial at the University of Maryland School of Medicine in Baltimore.  Pfizer and BioNTech say they've won permission Wednesday, Dec. 2, 2020, for emergency use of their COVID-19 vaccine in Britain, the world’s first coronavirus shot that’s backed by rigorous science -- and a major step toward eventually ending the pandemic. (Courtesy of University of Maryland School of Medicine via AP, File)
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Desde que a pandemia começou, muitos pacientes relatam sintomas de caráter neurológico, como dores musculares de origem nervosa (mialgias), transtornos da consciência ou, os mais conhecidos, a perda de olfato (anosmia) e paladar. Era evidente o impacto no sistema nervoso central, mas não há unanimidade sobre como o coronavírus chega até lá. Para alguns, mais do que por causa do vírus, o dano seria uma reação excessiva do sistema imunológico contra o próprio organismo. Outros encontraram na análise de tecidos cerebrais uma prova de que o mal chega pela ruptura da barreira hematoencefálica, que protege o cérebro de ser levado pela corrente sanguínea.

Os resultados das autópsias de 33 doentes de covid-19 mostram agora outra possibilidade: que a via de entrada do vírus no cérebro seja a nasal. Este trabalho, publicado na Nature Neuroscience, encontrou quantidades significativas do RNA (ácido ribonucleico) e proteínas do SARS-CoV-2 na mucosa olfativa. Esta membrana situada ao final das fossas nasais aloja as células nervosas que permitem ao cérebro traduzir os aromas que entram pelo nariz.

“Estes dados sustentam a ideia de que o SARS-CoV-2 é capaz de usar a mucosa olfativa como porta de entrada do cérebro”, diz em nota o diretor do departamento de neuropatologia do Charité, o hospital universitário de Berlim, Frank Heppner. O sintoma neurológico mais citado é a anosmia, a perda de olfato. Além disso, a proximidade física nesta zona das células da mucosa, dos vasos sanguíneos e das células nervosas reforçava a hipótese. “Uma vez na mucosa olfativa, o vírus parece usar as conexões neuroanatômicas, como o nervo olfatório, para chegar ao cérebro”, acrescenta Heppner.

A mucosa olfativa aparece com a maior carga viral, mas os médicos também acharam seus restos mais adiante. Detectaram também o material genético do vírus em outras partes do sistema do olfato, como o bulbo olfatório, que formalmente é parte do cérebro, e no tubérculo olfatório, o centro de processamento sensorial já abrigado no próprio córtex cerebral. “Em alguns casos, confirmamos a presença do vírus no cérebro visualizando-o mediante o uso de tinturas, que representam proteínas do vírus, validando assim nossas conclusões”, afirma Heppner.

Para Helena Radbruch, sua colega no Charité e coautora do estudo, “o vírus se move de célula nervosa em célula nervosa até chegar ao cérebro”. Entretanto, os cientistas não localizaram seu rastro nas terminações nervosas que, a partir da mucosa e do bulbo, acabam no cérebro. Assim, não descartam outras opções, como a propagação por meio dos vasos sanguíneos. Isso poderia explicar que tenham encontrado restos de coronavírus em outras partes, como o cerebelo, que não intervêm no olfato.

Um dado revelado por esta investigação chama a atenção de David García Azorín, membro da Sociedade Espanhola de Neurologia: “A probabilidade de encontrar o vírus na mucosa olfativa é inversa à duração da doença”. Isso indica que o impacto do coronavírus sobre o sistema nervoso e acontece desde o início. “As cefaleias e a anosmia aparecem nos dois ou três primeiros dias”, acrescenta. Para este neurologista, o trabalho —do qual não participou— indica que o vírus poderia chegar ao sistema nervoso central, mas “falta-lhes demonstrar a segunda parte, encontrá-lo no cérebro”.

É o mesmo ceticismo demonstrado pelo chefe do serviço de neurologia do Hospital Universitário de Albacete (Espanha), Tomás Segura, que também analisou amostras cerebrais de mortos por covid-19. Uma primeira objeção é que a amostra do estudo é muito reduzida e, além disso, de casos tão extremos que seus resultados talvez não se estendam ao restante dos doentes. O especialista observou esses danos nas células endoteliais (que formam a camada interna) dos capilares sanguíneos, o que lhe leva a crer que esta via seja a entrada do vírus no cérebro: “Vemos o cérebro semeado de destruição, no que o vírus destruiu o endotélio cerebral”.

No que estão de acordo com os autores é em prestar a devida atenção ao aspecto neurológico de um vírus que, por definição, é respiratório. Em suas conclusões, os cientistas alemães propõem que a presença do vírus no tronco cerebral, onde entre outras coisas reside o controle da respiração e do ritmo cardíaco, poderia estar influindo nos problemas respiratórios e cardíacos de muitos casos graves. “Em determinados pacientes com curso severo da covid-19, que não obtêm o oxigênio necessário por causa da pneumonia que sofrem, a presença do SARS-CoV-2 na zona cerebral que controla a respiração pode agravar o problema da falta de oxigênio, rebaixando, por exemplo, o impulso automático e normal de respirar adequadamente”, aponta. É apenas uma teoria que exigirá mais provas, mas é inquietante.

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