Presidente da ANS cede a pressão e promete à CPI intervir na Prevent Senior
Paulo Rebello Filho diz em depoimento que a Agência Nacional de Saúde só soube das denúncias contra a operadora pela CPI da Pandemia. Ele foi assessor do deputado Ricardo Barros, um dos alvos da comissão
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O diretor-presidente da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), Paulo Roberto Rebello Filho, afirmou nesta quarta-feira, na CPI da Pandemia, que a agência vai acompanhar de perto os processos referentes à Prevent Senior sobre o enfrentamento do coronavírus. A operadora é investigada pela comissão sob suspeita de prescrever indiscriminadamente a seus beneficiários o kit covid, que contém drogas que não funcionam contra o vírus, e de omitir a doença como causa de morte de atestados de óbitos. Segundo ele, a ANS enviará um diretor técnico para acompanhar os fluxos e processos da rede privada de saúde “a partir do dia 14″ próximo. “Ele vai estar lá na operadora solicitando informações, corrigindo fluxos, estabelecendo metas junto à operadora e acompanhando esses indícios de irregularidades apontados pela CPI e apontando todas essas informações à ANS”, explicou Rebello aos senadores.
Em uma sessão esvaziada e ironizada pelo presidente da comissão, o senador Omar Aziz (PSD-AM), que afirmou que Rebello “está só”, e que os governistas só enchiam a sala quando o convidado era o empresário Luciano Hang, os senadores suspeitavam que a Prevent Senior havia sido blindada pela ANS. De fato, Rebello diz que só tomou conhecimento das denúncias envolvendo a operadora por meio da CPI e que, por isso, não abriu investigação antes. Mas a história não colou. “Vossa senhoria deve ter dentro de sua estrutura uma assessoria de imprensa muito boa. Não me convence que só tenha tomado conhecimento depois da CPI, porque blogs e jornais já denunciavam a Prevent Senior desde março”, disse o senador Otto Alencar (PSD-BA), ao afirmar que não ficou “convencido” com as explicações de Rebello.
A resposta do servidor, que está na ANS desde julho deste ano, foi técnica. Rebello disse que a agência trabalha “sob demanda”, ou seja, a partir de denúncias feitas. “Importante reiterar que a ANS teve conhecimento das graves acusações contidas em dossiê contra a Prevent Senior pela CPI da Covid, e tais situações nunca foram denunciadas diretamente à agência e não apareceram nos monitoramentos feitos periodicamente pela ANS”, disse o diretor. Novamente, a versão do diretor não convenceu os senadores. “Me perdoe a ironia, mas só o senhor e a diretoria da ANS que não estavam sabendo do assunto da Prevent Senior no Brasil”, disse o senador Humberto Costa (PT-PE).
Mais tarde, Rebello confessou que a ANS investiga a Prevent Senior desde março do ano passado, quando houve uma primeira fiscalização. Ele não informou o que a agência foi fiscalizar naquela época, mas disse que, até o momento, seis processos já foram abertos dentro da ANS envolvendo a operadora. Em dois desses processos foram lavrados autos de infração, segundo Rebello, que não informou o que exatamente foi infringido pela operadora.
A desconfiança em relação ao comando de Rebello e às ações da ANS se reforçou por seu histórico. Ele foi chefe de gabinete do atual líder do Governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), de 2016 a 2018, quando Barros atuou como ministro da Saúde. O líder do Governo é um dos principais alvos da CPI da Pandemia, pela suspeita de ter atuado pela comprada vacina Covaxin. Rebello assumiu a ANS após o Senado aprovar seu nome. Na ocasião, o presidente Jair Bolsonaro chegou a retirar sua indicação para o cargo, numa decisão publicada no Diário Oficial, mas recuou uma segunda vez, permitindo a votação e consequente aprovação de Rebello para a ANS. Nesta quarta, o diretor-presidente da ANS negou que Barros tenha atuado por sua indicação, mas o contexto político da escolha põe em questão a condução da agência.
Ajuste de conduta
A partir de agora, a fiscalização da ANS ganha uma nova cor, depois de se tornar pública. A partir do envio de um diretor da ANS para acompanhar de perto a conduta da operadora, a Prevent Senior terá, segundo Rebello, que mostrar um ajuste de conduta. “A operadora precisa demonstrar que houve conserto do atendimento prestado”, disse. “E no fim da linha pode inclusive ocorrer a liquidação da operadora”, disse, ressalvando que isso não está “nem de longe” próximo de ocorrer.
Por meio de nota, a Prevent Senior informou que ainda não foi notificada oficialmente sobre a medida. “A empresa passou por uma fiscalização in loco por técnicos da agência. Na ocasião, a operadora apresentou diversos documentos que ainda deverão ser analisados pela agência”, diz a nota. “A empresa corrigirá eventuais problemas ocorridos nos momentos mais críticos da pandemia apontados pela agência”, diz. E afirma também que “as denúncias que sofreu são infundadas. A verdade dos fatos será restabelecida por investigações técnicas como as realizadas pela ANS”.
Reta final
Na reta final dos trabalhos da comissão, que se encerrarão no próximo dia 20, o relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB-AL), fez um balanço dos trabalhos. “Teremos mais de 40 pessoas responsabilizadas pelo que fizeram no enfrentamento da pandemia e 36 investigados formalmente”, afirmou.
Como já apontado pelo EL PAÍS, a CPI deixará nas mãos do Ministério Público Federal (MPF) e da Procuradoria-geral da República (PGR) a conclusão de investigações. Nesta quarta-feira, Renan Calheiros confirmou a informação. “Vamos mandar para a PGR aqueles cujo foro diz respeito à Procuradoria Geral da República, e vamos mandar às escalas inferiores, para o Ministério Público Federal e para o Tribunal de Contas da União, aqueles que não têm foro privilegiado”, disse a jornalistas pouco antes do início da sessão.
O senador afirmou também que os parlamentares pretendem criar uma pensão especial para os órfãos do coronavírus e incluir a covid-19 dentre as doenças que permitem a perícia para a aposentadoria por invalidez.
A previsão do presidente da comissão, Omar Aziz, é de que o relatório de Renan seja lido no dia 19 e votado no dia 20, encerrando os trabalhos da CPI. Após a eventual aprovação, o documento é encaminhado ao Ministério Público, a quem cabe decidir sobre os indiciamentos.
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