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STJ apela ao regimento interno para abrir inquérito contra força-tarefa da Lava Jato

Decisão do ministro Humberto Martins visa apurar suposta tentativa de procuradores de “investigar e intimidar” ministros da Corte, a exemplo do que fez o STF no inquérito das ‘fake news’

O presidente do STJ, Humberto Martins, durante abertura do ano judiciário.
O presidente do STJ, Humberto Martins, durante abertura do ano judiciário.STJ
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Former Brazil's President Luiz Inacio Lula da Silva puts on a face mask after voting at a polling station during the municipal elections in Sao Bernardo do Campo, Brazil, November 15, 2020. REUTERS/Amanda Perobelli
Defesa de Lula se arma para usar mensagens vazadas da Lava Jato e anular até ações não julgadas por Moro

O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Humberto Martins, determinou nesta sexta-feira a abertura de um inquérito para apurar suposta tentativa da força-tarefa da Operação Lava Jato de “investigar e intimidar ministros do STJ por meio de procedimentos apuratórios ilegais e sem autorização do Supremo Tribunal Federal”. A exemplo do controverso inquérito da fake news aberto pelo Supremo Tribunal Federal sem a iniciativa do Ministério Público para apurar ameaças aos ministros, Martins justificou sua decisão com base no regimento interno da Corte, que determina que, “ocorrendo infração à lei penal na sede ou dependências do tribunal”, o presidente poderá instaurar uma investigação.

A decisão do STJ foi provocada pela troca de mensagens entre procuradores da Lava Jato e o ex-juiz Sergio Moro que vem sendo divulgada na imprensa desde que a defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve acesso aos diálogos apreendidos pela Operação Spoofing, que prendeu os hackers que obtiveram as comunicações entre as autoridades. As conversas foram liberadas à defesa inicialmente pelo ministro Ricardo Lewandowski e depois por um julgamento da Segunda Turma do STF, que considerou válido o pedido de acesso feito pelo petista. A determinação do STJ coloca o problema da validação dos diálogos como prova no centro do debate. Se para o STF isso era questão para um novo julgamento, uma vez que não era esse o pedido dos advogados de Lula, no STJ a veracidade ou não das mensagens é fundamental para o desenrolar da investigação.

Manifestação da defesa de Lula ao STF, com base em relatórios sobre as mensagens produzido por um perito contratado pelo ex-presidente, já havia apontado que a força-tarefa planejou o “levantamento patrimonial” dos ministros do STJ por meio da Receita Federal. Em outra manifestação recente, a defesa do petista afirma que a Lava Jato “engendrou e implementou ataques” ao ministro do STJ Ribeiro Dantas. “O objetivo era o de enfraquecê-lo e de retirá-lo da relatoria da Lava Jato —o que efetivamente veio a ocorrer. Diálogos mostram que a Lava Jato queria, ainda, colocar o STJ ‘contra a parede’”, afirma a defesa do ex-presidente Lula.

Mensagens reveladas pelo El PAÍS na investigação Vaza Jato, realizada em parceria com o The Intercept Brasil, já haviam mostrado que a Lava Jato planejou por meses buscar na Suíça provas contra o ministro do STF Gilmar Mendes, por considerá-lo um crítico da operação. A defesa de Lula também destaca as conversas que mostram que os procuradores também colocaram na mira os ministros do STF Dias Toffoli e Alexandre de Moraes.

No dia 5 de fevereiro, o presidente do STJ encaminhou um ofício à Procuradoria-Geral da República cobrando uma investigação sobre a conduta dos procuradores, além de uma apuração no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), segundo informou o Estadão. O material ainda estaria sendo avaliado. Mesmo assim, o presidente do STJ decidiu abrir o inquérito, que correrá em sigilo de justiça e será conduzido por ele mesmo. Na decisão, o ministro Martins afirma que instaurou o “inquérito para apurar os fatos e as infrações, em tese delituosos, relacionados às tentativas de violação da independência jurisdicional e de intimidação de ministros do Superior Tribunal de Justiça, bem como de outros do mesmo gênero eventualmente cometidos e cujas práticas sejam reveladas no curso da investigação”.

A força-tarefa da Lava Jato enviou em 8 de fevereiro um ofício ao STJ no qual “reiteram que jamais praticaram qualquer ato de investigação sobre condutas de autoridades detentoras de foro por prerrogativa de função, sejam ministros do STJ, seja qualquer outra autoridade”. Os procuradores seguem: “Em todos os casos em que foram identificados elementos de informação concretos relacionados a autoridades com prerrogativa de foro, foram feitas as devidas comunicações às autoridades competentes ―sem exceção”.

Inquérito das fake news e Daniel Silveira

Em junho de 2020, o plenário do STF, por dez votos a um, declarou a legalidade e a constitucionalidade do inquérito das fake news, instaurado com o objetivo de investigar a existência de notícias falsas, calúnias e ameaças contra a Corte, seus ministros e familiares. A maioria dos ministros seguiu o entendimento do relator, Edson Fachin, “diante de incitamento ao fechamento do STF, de ameaça de morte ou de prisão de seus membros e de apregoada desobediência a decisões judiciais”. Na época, o ministro Alexandre de Moraes afirmou em seu voto que 72 inquéritos já haviam sido enviados à primeira instância, onde cidadãos sem prerrogativa de foro —ou seja, que não são parlamentares, presidente ou ministros— serão processados.

No julgamento, foi vencido o ministro Marco Aurélio, que considera que o artigo 43 do regimento interno do STF, que embasou a instauração do inquérito, não é compatível com a Constituição de 1988. Para o ministro, houve violação do sistema penal acusatório constitucional, pois o procedimento investigativo não foi provocado pelo procurador-geral da República. Nesta semana, o inquérito das fake news foi a base para que o ministro Alexandre de Moraes ordenasse a prisão em flagrante do deputado bolsonarista Daniel Silveira sob acusação de ameaças à Corte e à democracia. A prisão de Silveira foi ratificada pela Câmara nesta sexta.

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