Hospitais particulares de São Paulo têm aumento de internações por covid-19 e dão alerta para segunda onda
Unidades da rede pública ainda não mostram crescimento similar, o que pode indicar que a doença está se espalhando em focos relacionados ao poder aquisitivo
Entre outubro e novembro, hospitais particulares da cidade de São Paulo registraram aumento de internações por covid-19. Só neste mês, o Hospital Sírio-Libanês realizou 120 internações, 30% delas em unidades de terapia intensivas (UTIs). “Nossa média era de 85 a 110 internações. Temos entre 130 e 140 leitos e a ocupação desta semana está próxima à do pico da pandemia em abril”, diz Felipe Duarte Silva, coordenador de Práticas Médicas do Sírio. O Hospital do Coração (HCor) registrou 36 internações entre 1 e 10 de novembro, em um ritmo que pode superar o total de 67 hospitalizações em outubro e 82 em setembro. No mês passado, as internações em UTI no HCor foram cinco. Nos dez primeiros dias de novembro, já são sete.
No Hospital Israelita Albert Einstein, a média de internações por covid-19 em abril foi de 111 hospitalizações e, até o dia 9 de novembro, a média para este mês já é de 55 internações. Estaria a maior cidade do país, epicentro da pandemia de coronavírus, na iminência de uma segunda onda, como já acontece na Europa? Para o pesquisador Vitor Mori, membro do Observatório Covid-19 BR, ainda é cedo para dizer. “Ainda não há um aumento consistente do número de casos. A gente só sabe da segunda onda quando já estamos nela. Mas, sem dúvida, o aumento de internações nos hospitais particulares é um sinal para se prestar atenção”, afirma.
Uma evidência de que esse aumento consistente de casos ainda não acontece é o número de internações nos hospitais públicos da cidade. O Hospital das Clínicas informa, em nota, que a ocupação média das últimas semanas tem se mantido em torno dos 30%, “o que corrobora a tendência de queda em comparação ao auge da epidemia entre os meses de abril e junho, em que o HC chegou a ter uma ocupação de mais de 90% dos leitos de UTI destinados à covid-19”.
De acordo com a Secretaria Municipal de Saúde, a taxa de ocupação de UTI covid-19 de todos os hospitais municipais é 37% (8/11), abaixo daquelas registradas em abril (56%), maio (92%) e junho (59%). No Hospital Municipal Tide Setúbal, um dos referenciados para atendimento de pacientes com covid-19 e que possui 70 leitos de UTI e 40 leitos de enfermaria disponíveis, a taxa de ocupação de UTI foi de 39% em outubro, em comparação com 52,9% em abril.
Vitor Mori explica que essa diferença de ocupação entre hospitais privados e público pode dever-se ao fato de que o novo coronavírus espalha-se em focos —ou clusters (agrupamentos, em inglês), como a comunidade científica prefere chamá-los—. “Pode ter relação com o verão europeu, com as classes mais altas, que têm acesso à saúde privada, viajando para lá”, diz ele. “O que vemos agora pode ser um cluster entre as classes mais abastadas que, em um primeiro momento, estavam trabalhando de casa, conseguiram se proteger mais e agora estão mais suscetíveis ao vírus”, acrescenta.
Apagão de dados
Em todo estado de São Paulo, enquanto a média móvel de mortes por covid-19 vem caindo —no dia 27 de outubro, ficou em um patamar abaixo de 100 novas mortes diárias primeira vez em seis meses—, a média de novos casos vem subindo. No dia 28 de outubro, ela ficou acima de 4,3 mil casos registrados em um dia. Cinco dias depois, o Ministério da Saúde registrou um “incidente” em seus sistemas de informação que impediu a atualização dos números de algumas secretarias estaduais de Saúde, como a de São Paulo —um problema que foi solucionado na noite de terça-feira. Os últimos números oficiais dão conta de 39.907 óbitos e 1.150.872 casos do novo coronavírus no Estado. No entanto, desde esse apagão na quinta-feira (05/11), a Prefeitura da capital paulista, que usa outra fonte de dados, já registrou mais de 900 mortes pelo novo coronavírus, óbitos esses que ainda não entraram nas estatísticas gerais.
Vitor Mori acredita que “em algum momento, os casos voltarão a aumentar” não apenas em São Paulo, mas no resto do país. “Pelo próprio ciclo da doença, há um atraso entre o número de casos e o número de óbitos, porque leva um tempo até a infecção ser detectada, se agravar e levar a uma possível hospitalização e um possível óbito”, explica.
O especialista não acredita, no entanto, que uma quarentena mais restrita, como ocorreu em algumas cidades em março e abril, seja possível, segundo ele, pela própria necessidade de preservação da saúde mental das pessoas. “O que se deve fazer, então, é incentivar a realização de atividades ao ar livre e em espaços bem ventilados”, diz.
Para o médico Felipe Duarte Silva, do Hospital Sírio-Libanês, um dos desafios deste momento de novo aumento de casos é comportar também o atendimento do que ele chama de pacientes não-covid. “Já sabemos como converter leitos para atender pacientes com covid-19, por exemplo. Mas o problema é acomodar os pacientes não-covid, cuja gravidade aumentou desde abril, porque as pessoas tiveram medo de ir ao hospital e se contaminar e ficaram piorando em casa”, lamenta ele, que diz que a procura por atendimento no pronto-socorro aumentou no último mês.
Para dar conta da situação, o coordenador de Práticas Médicas do Sírio-Libanês aposta no atendimento por fluxos, como praticamente todas as unidades de saúde adotaram na pandemia, com áreas separadas entre os pacientes com covid-19 e os demais, além de zonas de transição. E para conter uma eventual segunda onda, ele tem apenas uma receita: “É preciso manter o distanciamento social. Afinal, a pandemia não acabou”.
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