Witzel, rachadinha e o leilão “quem dá mais” pela vaga no STF
Escolha por procurador que investigará Flávio Bolsonaro no Rio está na conta política do afastamento do governador fluminense
Nos bastidores, o afastamento de Wilson Witzel (PSC) do Governo do Rio de Janeiro envolve ao menos dois movimentos políticos centrais para o Planalto. Um é a disputa para ver quem agrada mais o presidente Jair Bolsonaro e consegue a indicação dele para uma das duas vagas que serão abertas no Supremo Tribunal Federal até o fim de seu mandato. O outro é sobre quem conduzirá a investigação contra o primogênito do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) investigado pela suposta rachadinha, que é a apropriação ilegal de recursos de seus assessores.
Três fontes ouvidas pelo EL PAÍS disseram que, na esfera federal, o procurador-geral da República, Augusto Aras, a procuradora Lindôra Araújo e o ministro Benedito Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça, fizeram acenos ao presidente Bolsonaro com os desdobramentos que encurralaram Witzel, desafeto de Bolsonaro. Decidiram participar de uma espécie de leilão. Aras e Benedito tentam se cacifar para uma indicação ao Supremo e tem como concorrentes os ministros João Otávio de Noronha e Humberto Martins, do STJ, e os ministros da Justiça, André Mendonça, e da Secretaria-Geral, Jorge Oliveira. (Após a publicação deste texto, a assessoria do STJ informou que Benedito não poderia ocupar uma vaga no STF por ter 66 anos de idade. O limite para ocupar o cargo é 65 anos).
Já Lindôra, que segundo essas fontes, tem proximidade com o senador Flávio Bolsonaro, quer substituir Aras, caso o PGR consiga ir para o STF. Foi esta procuradora quem apresentou os pedidos de afastamento de Witzel e de que ele fosse proibido de indicar o novo procurador-geral de Justiça do Rio.
“Bolsonaro tem jogado politicamente com essa vaga no STF. Isso faz com que vários atores entendam que possam se candidatar a ela, inclusive o Aras e o Benedito”, disse uma das fontes com trânsito no Judiciário, que não quis analisar se Witzel é culpado ou inocente de participar de um esquema ilegal na coordenação do combate à pandemia de coronavírus no Rio.
A importância de indicar o futuro PGJ toca diretamente Flávio Bolsonaro. Seu caso se tornou uma dor de cabeça para o presidente, já que os supostos desvios de recursos de funcionários teriam irrigado as contas da atual primeira-dama do Brasil, Michelle Bolsonaro, conforme apontam as investigações do Ministério Público. Como o Tribunal de Justiça do Rio já decidiu que cabe a esse tribunal, e não a um juiz de primeira instância julgar Flávio, seria o novo PGJ o responsável por apresentar conduzir as investigações que tramitarem na corte.
Witzel rompeu com o bolsonarismo e havia um temor na família presidencial que ele indicasse um PGJ que pudesse perseguir o senador. Agora, há um certo alívio. Até segunda ordem, quem escolherá o chefe do Ministério Público Estadual fluminense será o governador em exercício Cláudio Castro (PSC).
Eleito vereador em 2016, Castro tinha como principais feitos coordenar a Arquidiocese do Rio de Janeiro e atuar como cantor gospel. Ele também é investigado no mesmo esquema do qual Witzel é suspeito. Foi indicado para compor a chapa ao governo pelo presidente de seu partido, pastor Everaldo Dias Pereira, que foi preso na operação desta sexta-feira.
Independentemente da gravidade da denúncia, é seu subtexto político que tem se sobressaído. Como observou uma das fontes com acesso ao Judiciário: “As investigações contra o Flávio pouco evoluem, ele ganha tempo nas cortes e ainda segue senador. Agora, contra o Witzel, já foi jogado ao fogo do inferno”. Resta saber o quão chamuscado ele sairá desta fogueira.