Babu Santana: “Não devemos cancelar as pessoas, devemos educar”
Integrante do último BBB, artista nascido no Morro do Vidigal falou sobre o racismo, a importância do diálogo na luta contra o preconceito e disse sentir orgulho de estrelar uma campanha de Dia dos Pais com Thammy Miranda
Enquanto tenta surfar na visibilidade que ganhou no Big Brother Brasil em plena pandemia, o ator e cantor Babu Santana tem mergulhado fundo nas redes sociais e se diz assustado com a moda do cancelamento virtual ― quando grupos de pessoas se unem para criticar (e cancelar) alguém de quem discordam. “Não devemos cancelar as pessoas, devemos educar”, disse o ator, que pautou sutilmente o racismo no reality show de maior audiência da TV brasileira, em conversa ao EL PAÍS nesta terça-feira (28). “Essa política de cancelamento eu estou descobrindo isso agora. O que é isso? São pessoas que se juntam e se aproveitam que não estão perto de você e começam a te detonar”, critica.
Babu conta que, dentro e fora do programa, sentiu na pele como uma pessoa negra tem mais dificuldade de ter seus méritos reconhecidos que uma pessoa branca. De uma forma muito sutil, foi pautando questões sobre o preconceito racial na televisão. Sua estratégia era questionar os próprios colegas de confinamento quando sentia que era tratado de forma diferente. “Quando eu faço eles se questionarem, faço muitas pessoas se questionarem também”, analisa. “Uma coisa que eu também prego é que eu não posso colocar a pessoa na cruz e crucificar ela. Eu posso muito bem fazer com que ela chegue a uma conclusão e que a gente possa conviver em paz sem diferenças”, defende.
O ator acredita que o combate ao preconceito deve passar pelo diálogo ―e ficar longe do cancelamento. “É um fato que o racismo hoje está sendo filmado. O que aconteceu com Floyd [o homem negro morto por um policial nos Estados Unidos] não é a terça parte do que acontecia há anos atrás. (...) É que agora as pessoas estão se confrontando de frente com o seu próprio racismo”, avalia.
Babu conta que sempre viu BBB e que, na edição anterior à sua, se frustrou ao ver uma pessoa com declarações discriminatórias vencer o programa. Entrou no reality para tentar refazer a vida quando as dívidas se acumulavam e ficou feliz quando viu que havia outra participante negra, a médica Thelma Assis, que venceu o programa. “O público foi muito injusto na edição 19. Quando caiu o muro e eu vi a Thelminha, falei que eu ia tentar ganhar, mas se eu não ganhasse ela devia ganhar. A sociedade deve essa para a gente”, lembra.
Babu iniciou a carreira no teatro após se formar em um projeto social do Morro do Vidigal, no Rio de Janeiro. Ao longo da trajetória como artista, atuou em novelas da Globo e, em 2014, ganhou o prêmio de melhor ator do ano no cinema brasileiro pela interpretação de Tim Maia, em filme sobre a vida do músico. No reality show, ele costumava evocar com orgulho suas origens e também se destacou pelo engajamento antirracista. Acabou por definir o programa como o “BBB das bandeiras [identitárias]”. Apelidado de Paizão dentro da casa, Babu virou exemplo para milhares de crianças negras, mas diz que seu papel não é militar. “Eu não queria estar num papel de militante, mas estava pronto para um papel de referência”, brada o ator.
Babu está com uma agenda atribulada em meio à muitas lives, comerciais e projetos mesmo durante a pandemia. Em um desses trabalhos, viu críticas chegarem a uma peça publicitária de Dia dos Pais que participou junto com Thammy Miranda, que é trans. “O Thammy é uma pessoa maravilhosa. É um cara muito gente fina. Eu vejo com tristeza quem comete esse ato discriminatório. E vejo com muita felicidade as marcas buscarem essa diversidade. Nós somos plurais, então eu tenho um orgulho imenso em estar protagonizando ou fazendo parte de uma campanha publicitária com o Thammy ou qualquer pessoa transgênero. Eu não tenho nenhum problema com o ser humano. Somos todos iguais”, afirmou.
A conversa do ator com o EL PAÍS faz parte da série de programas do jornal com analistas, políticos e personalidades de diferentes áreas sobre o Brasil e a pandemia de coronavírus, com transmissão multiplataforma. É possível acompanhar a live no site do EL PAÍS, na página do Facebook e no canal do YouTube. Anteriormente, a série do EL PAÍS conversou, entre outros, com os ex-presidentes do Brasil Dilma Rousseff, Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso, o pesquisador Marcos Nobre, a pneumologista da Fiocruz Margareth Dalcolmo e o diretor médico do Instituto Butantan, Ricardo Palacios.