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Edson Fachin defende inquérito das ‘fake news’: "O antídoto à intolerância é a legalidade democrática”

Após o voto do relator do caso, STF adia para o dia 17 a decisão sobre legalidade de apuração sobre ameaças à Corte; tendência é dar continuidade à investigação que atinge bolsonaristas

O ministro Edson Fachin, em 11 de março, no plenário do Supremo Tribunal Federal.
O ministro Edson Fachin, em 11 de março, no plenário do Supremo Tribunal Federal.Rosinei Coutinho/SCO/STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) adiou para o próximo dia 17 o julgamento da ação que pede o arquivamento do inquérito das fake news, que apura a disseminação de boatos e ameaças em redes sociais contra membros da Corte. Nesta quarta-feira, apenas o relator Edson Fachin votou, para defender a legalidade do inquérito. Faltam outros dez ministros para votar.

No entendimento de Fachin, a apuração tem de ser acompanhada pelo Ministério Público e devem ser investigadas apenas as manifestações que denotem riscos ao funcionamento do poder Judiciário, assim como o dos outros poderes, Executivo e Legislativo. “Atentar contra um dos poderes, incitando o seu fechamento, incitando a morte, incitando a prisão de seus membros, incitando a desobediência civil, o vazamento de informações sigilosas não são manifestações protegidas pela liberdade de expressão na Constituição”.

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Seguiu o ministro em seu extenso voto, que foi lido por quase três horas: “O dissenso é inerente à democracia. O dissenso intolerável pela Constituição é justamente aquele que visa impor com violência um suposto consenso”. Na visão de Fachin, parte dos ataques à Corte representavam um abuso por parte dos investigados. “Não há direito no abuso de direito. O antídoto à intolerância é a legalidade democrática”.

O inquérito, até o momento, teve como alvos 29 apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) contra quem foram cumpridos mandados de busca e apreensão no mês passado. É uma das principais preocupações do Palácio do Planalto, já que, conforme o andamento das apurações, pode influenciar em ao menos quatro das oito ações que tramitam no Tribunal Superior Eleitoral e que pedem a cassação da chapa presidencial. A suspeita é que um grupo de empresários, parte deles com os sigilos fiscal e bancário quebrados, financiava o disparo de mensagens falsas em benefício de Bolsonaro. Essa atitude ocorreria desde a eleição de 2018, quando Bolsonaro e Hamilton Mourão foram eleitos presidente e vice.

A ação foi proposta pelo partido Rede Sustentabilidade. Conforme interlocutores do Judiciário, a tendência é que o STF entenda que o inquérito é válido, mas podem ser estabelecidos limites a ele, como abrangência, objeto e tempo de investigação. A apuração foi aberta depois que foram intensificadas nas redes sociais críticas a ministros da Corte, boa parte delas feita por bolsonaristas. Os ataques perpassaram o ambiente virtual e passaram a ser frequentes nas manifestações de apoio ao Governo Bolsonaro, em que é comum notar pedidos de fechamento do Supremo e do Congresso Nacional.

Na primeira etapa do julgamento, a Advocacia-Geral da União e a Procuradoria-Geral da República defenderam a validade do inquérito. Também solicitaram a delimitação de parâmetros mais transparentes para a investigação. O procurador Augusto Aras destacou que defendia a suspensão do inquérito não para que fosse arquivado, mas para que o Ministério Público passasse a participar de todas as etapas dele. “Concordamos com o inquérito porque nós queremos ter o direito de participar, sobre atos e diligências previamente”.

Já o advogado-geral da União, José Levi Mello do Amaral Júnior, que é subordinado a Bolsonaro, surpreendeu ao defender a continuidade das apurações. No entanto, ele disse que haveria dificuldade em delimitar o que é fake news e defendeu a liberdade de expressão. “A democracia exige fontes alternativas e independentes de informação para que os cidadãos tenham a necessária compreensão esclarecida dos negócios públicos”.

Em sua fala, Levi também fez uma alusão ao ato institucional número 5 ―aquele da ditadura militar que fechou poderes e cassou mandatos políticos― e defendeu a participação de outros poderes no processo. O advogado ponderou que, caso isso não ocorresse, poderia parecer que o Supremo teria interesse em ser ao mesmo tempo o acusador e o julgador, o que é ilegal. “A própria Suprema Corte estaria a editar mecanismo de exceção análogo ao famigerado AI-5. Dispondo de ferramental para intimidar livremente, como juiz e parte a um só tempo, todo aquele que ousar questionar a adequação moral dos atos de seus membros. Não faço nesse momento, juízo de valor.”

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