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Hong Kong se prepara para eleições locais que medirão o apoio popular aos protestos

Novos candidatos se apresentam nas primeiras eleições depois das manifestações pró-democracia

Macarena Vidal Liy
Manifestantes durante um protesto pró-democracia em um shopping center em Hong Kong, nesta quinta-feira.
Manifestantes durante um protesto pró-democracia em um shopping center em Hong Kong, nesta quinta-feira.ADNAN ABIDI (REUTERS)
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“É a vez dos jovens em Hong Kong", insiste Lee Chun Wai. Até meados deste ano, esse fotógrafo magro de 25 anos e aficionado por cães não possuía nenhuma experiência política. As mobilizações em massa pró-democracia e contra o Governo mudaram tudo. Agora ele é um dos candidatos do bloco democrata pelo distrito de Yuen Long, perto da divisa com o restante da China, nas eleições municipais deste domingo, em Hong Kong. Eleições que servirão como referendo do apoio da população aos protestos que abalam a antiga colônia há cinco meses.

“Acho que os jovens podem contribuir com muitas coisas, mudar a maneira usual de fazer política em Hong Kong. Queremos mostrar que pode ser feita de um modo diferente, deixar nossa marca”, diz Lee enquanto distribui propaganda eleitoral em frente a uma rodoviária, acompanhado por seu cachorro Chai Chai, um shiba inquieto que o segue em todos os atos da campanha.

O jovem é um exemplo dos novos candidatos nestas eleições. Não é filiado a nenhum partido e, teoricamente, sua candidatura é independente, mas ele faz parte do bloco pandemocrata de oposição, Poder da Democracia. Seu programa inclui preocupações locais tradicionais, como a melhoria do transporte, mas também —além da defesa da democracia— os direitos dos animais, “algo que até agora não foi levado muito em conta em Hong Kong".

As eleições do próximo domingo despertaram enormes expectativas na ex-colônia britânica. Embora tradicionalmente as eleições distritais se concentrem em questões extremamente locais, desta vez são realizadas à sombra dos protestos em massa. Essa votação, a única em que é adotada a fórmula do sufrágio universal pleno —empregá-lo também para eleger o chefe do Governo autônomo é uma das principais demandas dos manifestantes—, servirá para verificar até que ponto a população em geral apoia os manifestantes. Ou se, como dizem os partidos pró-chineses, o sistema atual conta com o apoio de uma maioria silenciosa que não se pronuncia nas ruas, mas nas urnas.

Até agora, tudo sugere que os partidos pró-Pequim sofrerão uma forte derrota nessas eleições, nas quais serão escolhidos 452 vereadores em 18 distritos. Os protestos mobilizaram um setor da população, a juventude, muito desencantado com a política. Para esta eleição se registraram este ano para votar 386.000 pessoas a mais, de acordo com o South China Morning Post, o que deixou o número de potenciais eleitores em 4,13 milhões, o mais alto da história de uma Hong Kong de 7 milhões de habitantes. A maioria dos novos eleitores registrados tem entre 18 e 35 anos.

Se nas últimas eleições locais, há quatro anos, os partidos pró-Pequim que tradicionalmente dominam a política de Hong Kong, concorreram sozinhos em 60 distritos eleitorais, desta vez o bloco democrata apresenta candidatos em todos. O único candidato rejeitado foi o ex-líder estudantil Joshua Wong, que no final do mês recebeu o "não" definitivo da junta eleitoral, com o argumento de que ele não havia demonstrado de forma convincente que não apoiava ideias independentistas. Em outubro, uma pesquisa publicada pelo jornal Mingpao constatou que 44,5% dos eleitores se declararam pró-democratas, 17% a mais do que em março passado. Apenas 6% se declararam abertamente a favor dos partidos pró-Pequim.

À primeira vista, as eleições distritais têm um caráter menor, mas um triunfo nelas teria consequências significativas. Os representantes distritais ocupam 11 das 70 cadeiras no Legislativo autônomo, que realizará eleições no próximo ano. E em 2022 haverá eleições para o cargo de chefe do Governo local, nas quais apenas 1.200 membros de um comitê de notáveis podem votar. Os vereadores apontam 120 desses membros, 10% não desprezíveis, já que os pró-democratas já nomeiam outros 400.

“Detectamos grande interesse. As pessoas querem se expressar nessas eleições”, diz Lee. Ele só decidiu se apresentar à disputa em 4 de outubro, apenas três semanas antes do término do prazo para a aprovação das candidaturas. Os protestos, explica, foram a motivação decisiva. “Percebi que queria contribuir de algum jeito, e uma maneira era me apresentar como candidato”, explica o político embrionário.

As eleições ocorrem após uma campanha cheia de incidentes, o endurecimento da política da China em relação à ex-colônia e alguns dos confrontos mais violentos entre a polícia e os manifestantes nos cinco meses de protestos. Nesta quinta-feira ainda havia dezenas de jovens cercados em condições precárias na Universidade Politécnica, onde no início da semana cerca de mil estavam entrincheirados para impedir a entrada das forças de segurança. Em Yuen Long, o distrito em que Lee concorre, a polícia prendeu várias pessoas depois de uma vigília em um shopping center para relembrar os quatro meses do ataque de supostos grupos de tríades contra manifestantes.

No entanto, os últimos dias transcorreram em relativa calma. Os manifestantes, explicam, não querem dar desculpas para que o Governo autônomo, como insinuou no início desta semana, possa cancelar as eleições. O próprio Governo autônomo –com o apoio de Pequim– parece ter chegado ao cálculo de que alterar o calendário eleitoral significaria mais danos à imagem do que benefícios. O secretário de Assuntos Constitucionais, Patrick Nip, que afirmara na segunda-feira que os incidentes na Politécnica reduziam a possibilidade de realizar as eleições, insistia nesta quarta-feira: “Não queremos ver o adiamento ou a suspensão das eleições, a menos que seja absolutamente necessário. Portanto, estamos fazendo tudo ao nosso alcance, desenvolvendo planos e arranjos de contingência para atingir esse objetivo”.

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