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Piñera aposta em nova Constituição no Chile e garante que vai punir violência policial nas ruas

Após um mês de protestos, país registra 23 mortos e 217 pessoas atingidas nos olhos por disparos, sob denúncias de excessos da polícia e das Forças Armadas

Manifestantes usam tapa-olhos em protesto em Santiago.
Manifestantes usam tapa-olhos em protesto em Santiago.IVAN ALVARADO (REUTERS)
Rocío Montes
Santiago do Chile -
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O presidente Sebastián Piñera fez na noite deste domingo um pronunciamento oficial no Palácio de La Moneda para avaliar o acordo político da madrugada de sexta-feira, envolvendo quase todas as forças políticas do país, para a realização de um plebiscito em abril de 2020 que defina o futuro da Constituição de 1980. “Se a população assim decidir, avançaremos para uma Constituição, a primeira elaborada em plena democracia e aceita e respeitada por todos”, afirmou o mandatário sobre o esforço conjunto tanto do Governo como de boa parte da oposição parlamentar para restabelecer a ordem pública e controlar a eclosão social, que nesta segunda-feira completa um mês. “Será o grande marco que dará unidade, legitimidade e estabilidade a nossa democracia e convivência social e nos permitirá processar e resolver as legítimas diferenças que surgirem em nossa sociedade”, afirmou Piñera, que deixou transcorrerem quase três dias antes de mencionar o fato mais importante da história política recente do Chile.

O presidente Piñera se referiu neste domingo também às acusações de violações dos direitos humanos contra as Forças Armadas e da Ordem neste mês de protestos, onde gigantescas manifestações pacíficas se conjugaram com a ação de grupos violentos que causaram estragos que somam 4,5 bilhões de dólares (18,9 bilhões de reais) só em itens de infraestrutura.

É uma das maiores complexidades que seu Governo enfrenta há semanas. “Em alguns casos não se respeitaram os protocolos, houve uso excessivo da força, foram cometidos abusos ou delitos e não se respeitaram os direitos de todos”, reconheceu o presidente sobre a ação policial. “Quero expressar minha solidariedade e condolências com as vítimas desta violência, com os que sofreram lesões, e muito especialmente com os familiares daqueles que perderam suas vidas”, acrescentou, em referência às 23 pessoas que morreram desde que a crise estourou, em 18 de outubro – inicialmente como um protesto contra o aumento nas passagens de metrô da capital.

“Não haverá impunidade e nosso Governo fará todos os esforços para assistir às vítimas em sua recuperação e para que o Ministério Público e a Justiça cumpram sua missão de investigar e fazer justiça”, comprometeu-se Piñera.

Os Carabineiros, instituição encarregada de controlar a ordem pública e a segurança no Chile, enfrentam um cenário delicado: nesta crise, ficaram claras as deficiências em seus protocolos e a necessidade de modernização. O Instituto Nacional de Direitos Humanos (INDH) informou que 217 pessoas sofrem ferimentos oculares devido ao uso de balas de borracha. Como nem o protesto nem a violência se extinguiram com o acordo político por uma nova Constituição, na noite de sexta-feira houve um novo incidente na praça Baquedano, o epicentro das concentrações em Santiago. Um jovem morreu de ataque cardíaco durante a manifestação, um fato que ainda está sendo investigado. Segundo denunciou o Serviço de Atendimento Médico de Urgências (SAMU), a equipe médica que o socorria recebeu disparos de balas de borracha e bombas lacrimogêneas dos Carabineiros enquanto tentavam salvar a vida do rapaz.

Mas, além de antecipar que o próximo acordo de seu Governo estará focado na previdência, o presidente fez um resumo dos difíceis dias que a democracia chilena vem enfrentando. “O desenlace final destas quatro semanas ainda não está escrito”, reconheceu o presidente. “Depende de nós construirmos e percorrermos os caminhos que conduzam nosso país a um bom porto.”

Na terça-feira passada, o Chile viveu horas delicadas. Logo depois de uma jornada de paralisação nacional promovida pela Mesa de Unidade Social – composta por 200 organizações sindicais, de direitos humanos, ambientais e de povos nativos, entre outras –, as concentrações derivaram em uma das mais graves jornadas de violência desde o início dos protestos, há um mês. Além de saques a lojas e ataques a edifícios residenciais, comitês de partidos políticos e até sedes diplomáticas – foram pelo menos 30 incêndios em todo o país –, houve tentativas de invasão de pelo menos 20 quartéis policiais, segundo a informação oficial do Ministério do Interior, sendo a maioria na capital.

Nesse contexto, o presidente cogitou devolver os militares às ruas para tentar recuperar a ordem pública, o que teria interrompido os diálogos políticos entre o Governo e a oposição no Parlamento, que em meio à crise possibilitou acordos em questões fundamentais como a reforma tributária. Mas o presidente, nas horas de maior complexidade desde o retorno à democracia em 1990, decidiu finalmente fazer uma conclamação transversal à paz. Nas horas seguintes, seu apelo foi acolhido pela maior parte do espectro político e, após 48 horas de intensas negociações no Congresso, chegou-se ao histórico acordo de convocação do plebiscito de abril que decidirá se os cidadãos querem substituir a carta fundamental de 1980. Como parece evidente que se optará por isso – 8 em cada 10 chilenos assim desejam, segundo as pesquisas –, os chilenos definiriam paralelamente o mecanismo para sua substituição: se uma “convenção constitucional” com membros completamente novos, que funcione paralelamente ao Congresso com funções constituintes, ou uma “convenção mista” composta por 50% de parlamentares e outros 50% de delegados.

O acordo político pelo plebiscito para alterar a Constituição no Chile não acalma os setores radicais. Para esta segunda-feira está convocada uma nova concentração para celebrar um mês da revolta, e a Mesa de Unidade Social – que rejeita os termos em que o novo caminho constituinte foi negociado – marcou mais jornadas de protestos e uma nova greve geral. Neste domingo, uma das principais líderes da Frente Ampla de esquerda, Beatriz Sánchez, foi insultada no centro do Santiago por grupos de manifestantes que recriminaram o apoio de boa parte de seu grupo político ao acordo por uma nova Constituição, que consideram insuficiente.

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