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Trump declara guerra ao processo de ‘impeachment’

Casa Branca informa ao Congresso por carta que considera a investigação inconstitucional e Nancy Pelosi o acusa de cometer "obstrução"

Yolanda Monge
Gordon Sondland.
Gordon Sondland.DANIEL MIHAILESCU (AFP)

A Casa Branca anunciou nesta terça-feira à tarde que não vai cooperar com o processo de investigação para o impeachment –ou julgamento político do presidente–, o que implica uma autêntica declaração de guerra contra o Poder Legislativo representado no Congresso. O Governo de Donald Trump alega em uma devastadora carta de oito páginas que o processo iniciado é "partidário" e "viola a Constituição", e por essa razão nem o presidente nem o Executivo participarão dele. Horas antes, Trump já havia decidido impedir a declaração de Gordon Sondland, embaixador dos EUA na União Europeia e figura central na investigação conduzida após o escândalo da Ucrânia: as manobras do republicano para que o Governo ucraniano investigasse seu rival político Joe Biden.

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A carta desta terça-feira, enviada pelo advogado da Casa Branca, Pat Cipollone, à presidenta da Câmara dos Deputados, a democrata Nancy Pelosi, argumenta que a investigação "carece de qualquer base constitucional legítima". "Para cumprir suas obrigações com os americanos, a Constituição, o Poder Executivo e todos os futuros ocupantes da Presidência, o presidente Trump e sua Administração não podem participar de sua investigação partidária e inconstitucional nessas circunstâncias", afirma.

"Para dizer de forma clara, vocês procuram reverter os resultados das eleições de 2016 e privar o povo americano do presidente que elegeu livremente", assinala mais adiante. Foi a confirmação oficial de que Trump resistirá o máximo possível a esta investigação que, se encontrar supostos crimes graves, levaria a uma votação no Senado sobre a destituição do presidente.

Pelosi declarou à noite em um comunicado que "os esforços contínuos para esconder a verdade sobre o abuso de poder do presidente contra os americanos serão considerados como novas provas de obstrução". A presidenta da Câmara acusou Trump de querer transformar a ilegalidade "em virtude". "Sr. Presidente, o senhor não está acima da lei. Prestará contas", disse ela.

Horas antes a Casa Branca já havia demonstrado sua decisão de lutar, não tanto para defender a inocência do republicano, mas para torpedear a investigação em si, impedindo a declaração de Sondland. A Administração republicana quis firmar um precedente ao mandar a mensagem de que não está disposta a cooperar com o que Trump chamou de “uma corte tendenciosa” (a Kangaroo court, no original). As consequências de tal ato de guerra, porém, podem ser nefastas para o presidente.

A decisão da Casa Branca de não permitir que seu homem em Bruxelas exponha o que sabia sobre as supostas manobras presidenciais para pressionar um Governo estrangeiro a investigar um dos seus mais importantes rivais políticos pode ter sérias consequências para Trump e para o próprio impeachment. Se o presidente insistir no caminho da obstrução, o processo de impeachment poderá se basear nesse procedimento.

A reação democrática não demorou. Adam Schiff, líder do Comitê de Inteligência da Câmara dos Representantes e chefe de fato da investigação, afirmou que a ordem do Departamento de Estado para que Sondland não dessa declarações era uma "forte prova adicional" de obstrução ao Congresso. Os democratas anunciaram sua intenção de chamar Sondland para depor por meio de uma convocação formal.

“O embaixador Sondland tinha concordado em comparecer voluntariamente, sem a necessidade de uma intimação, para responder às perguntas dos Comitês", afirmou em um comunicado o escritório de advocacia que representa Sondland. "Mas, como embaixador na ativa, o embaixador Sondland tem de acatar as ordens do Departamento de Estado", continua Robert Luskin, advogado de Sondland, no mesmo comunicado. O documento define Sondland, importante doador da campanha de Trump, como "profundamente decepcionado" por ter viajado de Bruxelas para Washington e não poder conversar com os comitês responsáveis pela investigação para o impeachment.

Por meio de sua conta no Twitter, Trump disse que adoraria que Sondland testemunhasse, mas que estaria fazendo isso perante “uma corte tendenciosa, em que os republicanos foram despojados de seus direitos e não se permite que os fatos venham à luz pública".

Os democratas consideram Sondland —um empresário do setor de hotéis que foi agraciado com a Embaixada da UE após a chegada dos republicanos ao poder— uma testemunha fundamental no contexto do polêmico telefonema que o presidente Trump fez ao presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, em 25 de julho. Nessa conversa, Trump pedia a seu homólogo "o favor" de incumbir o Procurador Geral da Ucrânia de investigar Hunter Biden (filho do ex-vice-presidente Joe Biden) por seu papel como conselheiro na empresa de gás Burisma. Embora a Ucrânia não faça parte da UE, Trump pediu a Sondland que se encarregasse das relações entre Washington e Kiev.

As mensagens de texto entregues ao Congresso na semana passada pelo ex-enviado especial dos EUA para a Ucrânia Kurt Volker deixaram evidente que Sondland estava envolvido na pressão sobre a Ucrânia para que iniciasse uma investigação sobre Biden e, em particular, na redação de uma declaração que altos funcionários norte-americanos queriam que Zelenski tornasse pública para se comprometer a investigar Biden.

De acordo com trocas de mensagens eletrônicas entre Sondland e outros diplomatas dos EUA na Ucrânia, alguns altos funcionários do Departamento de Estado expressaram a preocupação de que Trump pudesse ter retido mais de 390 milhões de dólares (1,6 bilhão de reais) em ajuda militar à Ucrânia para pressionar o Governo desse país a investigar Biden e seu filho.

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