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Empresários financiaram disparos em massa pró-Bolsonaro no Whatsapp, diz jornal

A prática é considerada ilegal pelo Tribunal Superior Eleitoral. Empresa espanhola foi contratada por brasileiros, afirma 'Folha de S.Paulo'

Bolsonaro no palácio do Planalto no dia 17 de junho.
Bolsonaro no palácio do Planalto no dia 17 de junho.ADRIANO MACHADO (REUTERS)

Empresas brasileiras pagaram uma agência de marketing com sede na Espanha para fazer disparos de mensagens de Whatsapp a favor de Jair Bolsonaro, segundo reportagem da Folha de S.Paulo divulgada nesta terça-feira. Áudios obtidos pelo jornal com uma fonte mantida em sigilo mostram Luis Novoa, diretor da espanhola Enviawhatsapps, afirmar que “empresas, açougues, lavadoras de carros e fábricas” do Brasil financiaram a compra de um software produzido por ele para disparar mensagens em massa durante a campanha. Segundo a reportagem, não existem indícios de que Bolsonaro soubesse das ação, que podem configurar  crime eleitoral. Pela manhã, o presidente comentou o conteúdo da reportagem em um evento em Brasília: “Teve milhões de mensagens a favor da minha campanha e talvez alguns milhões contra também."

As informações publicadas pelo jornal nesta terça trazem novos elementos para uma suspeita trazida pelo jornal em agosto do ano passado, que levaram a abertura de uma investigação no Tribunal Superior Eleitoral. Na ocasião, a Folha revelou que empresas brasileiras fecharam contratos de até 12 milhões de reais para financiar disparos em massa no WhatsApp, a principal rede usada na campanha pelos bolsonaristas. Os destinatários eram usuários da base de dados da própria campanha de Bolsonaro ou de banco de dados vendidos por terceiros (esta segunda modalidade é proibida por lei). Um dos empresários suspeitos de compor o esquema, segundo o jornal, é Luciano Hang, dono da rede Havan. Existem indícios de que apoiadores do PT usaram o mesmo expediente no WhatsApp.

Novoa, dono da Enviawhatsapps, afirmou à Folha que não tinha conhecimento da utilização irregular de seu aplicativo para campanhas até que o Whatsapp suspendeu algumas das linhas de sua empresa. Eles contratavam o software pelo nosso site, fazíamos a instalação e pronto [...] Como eram empresas, achamos normal, temos muitas empresas [que fazem marketing comercial por WhatsApp]”, afirmou o empresário na gravação.“Estávamos tendo muitíssimos cortes, fomos olhar os IPs [endereço de Internet], era tudo do Brasil, olhamos as campanhas, eram campanhas brasileiras”, disse o empresário no áudio.

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Ao EL PAÍS, Novoa afirmou que nunca trabalhou diretamente com partidos políticos no Brasil. "Não me lembro de nenhuma conversa. Desconheço. Seja o que for, a realidade é que é mentira. Não trabalhamos com nenhum partido no Brasil, nunca. Pode ser que algum vendedor possa ter nos gravado, mas simplesmente o fazíamos para atrair clientes." Novoa, de 46 anos, é o fundador da empresa.  De acordo com o currículo que aparece em seu site, ele é formado em Gestão e Administração de Empresas. "Em todas as empresas em que trabalho, sou responsável por desenhar as estratégias para conectar emocionalmente com o cliente", diz ele em seu site. E acrescenta: "As empresas que planejam suas estratégias com o WhatsApp serão líderes de seus setores nos próximos anos".

De acordo com o jornal, brasileiros compraram cerca de 40 licenças de software da agência espanhola, que, em conjunto,permitiam até 20.000 disparos de mensagens de campanha por hora nas últimas eleições. O jornal ainda aponta que a licença para um mês, segundo o site da Enviawhatsapps, custa 89 euros (386 reais), a anual custa 350 euros (1.518 reais), e o WhatsApp Business API, voltado especificamente a empresas, sai por 500 euros ao ano (2.169).

Durante a campanha eleitoral da Espanha, nas eleições municipais e gerais, a empresa colaborou com diferentes partidos políticos. E foi responsável por campanhas de disparos em massa de WhatsApp, diz a Folha. As contas dos partido de esquerda Podemos e PSOE acabaram suspensas pelo aplicativo, por violação das regras de uso, já que o WhatsApp não permite disparos em massa. O mesmo aconteceu no Brasil durante as presidenciais do ano passado.

A campanha de 2018 foi marcada pela disseminação de conteúdo falso nas redes sociais e em grupos de Whatsapp. O candidato derrotado Fernando Haddad (PT) acusou a equipe de Bolsonaro de estar por trás e de não coibir essas práticas. Em algumas mensagens o petista teve seu nome associado à pedofilia e a uma mamadeira com formato de pênis que, segundo o texto, teria sido enviada para creches durante a gestão de Haddad na prefeitura de São Paulo. Por sua vez, simpatizantes do PT espalharam notícias falsas afirmando que o programa Bolsa Família iria acabar caso o candidato do PSL fosse eleito. Inquéritos abertos para apurar irregularidades ainda não tiveram grandes avanços no TSE.

A relação de empresários com mensagens pró-Bolsonaro também já haviam sido apontadas pelo EL PAÍS Brasil em agosto de 2018. Hang, o dono da Havan que meses depois cometeria irregularidades financiando disparos em massa no Whatsapp, pagou para impulsionar mensagens favoráveis ao militar da reserva no Facebook. A prática é ilegal, uma vez que apenas representantes oficiais das campanhas podem contratar impulsionamento de conteúdo eleitoral nas redes. De acordo com o TSE isso seria “terceirização da propaganda”, algo vedado pela nova legislação eleitoral. Após a reportagem, o Tribunal ordenou que Hang removesse o conteúdo de suas páginas, depois que o vídeo postado pelo empresário já tinha alcançado mais de um milhão de pessoas.

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