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Cuba elimina a palavra “comunismo” no anteprojeto de reforma constitucional

O novo texto só menciona o “socialismo” e suprime o objetivo do “avanço rumo à sociedade comunista”, que figura na atual Constituição de 1976

Miguel Díaz-Canel e Raúl Castro, presidente e ex-presidente de Cuba.
Miguel Díaz-Canel e Raúl Castro, presidente e ex-presidente de Cuba.Reuters
Pablo de Llano Neira

O regime cubano decidiu dizer adeus formalmente ao comunismo. O conceito foi eliminado no anteprojeto de reforma constitucional em andamento, segundo informaram neste sábado os veículos oficiais da ilha. Imerso num processo de liberalização controlada do modelo econômico, o Governo de Cuba inclui no novo texto o reconhecimento da propriedade privada e se desprende da referência à ideologia comunista, embora enfatize que o socialismo continue sendo política de Estado.

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A Constituição vigente, promulgada em 1976 e redigida à imagem e semelhança das Cartas do bloco socialista, prevê, em seu artigo 5, o objetivo do “avanço rumo à sociedade comunista”. Com a reforma constitucional, essa ideia desapareceria. Uma mudança de enorme importância histórica, que o Governo apresenta como mera adaptação da linguagem à nova fase de continuidade revolucionária. “Não quer dizer que vamos abrir mão das nossas ideias, e sim que, em nossa visão, pensamos num país socialista, soberano, independente, próspero e sustentável”, disse na sexta-feira o presidente da Assembleia Nacional, Esteban Lazo.

O Parlamento unicameral cubano abriu neste sábado uma sessão que se estende até segunda-feira e na qual os deputados debaterão o texto da reforma, para que seja depois submetido a consulta popular. Ideologicamente, Cuba ficará na paradoxal situação de se apartar da ideia do comunismo em sua Constituição sem deixar de reconhecer o Partido Comunista como máximo órgão de direção do país. O anteprojeto de reforma, segundo o jornal oficial Granma, “ratifica o caráter socialista da Revolução e o papel dirigente do Partido”, além da “irrevogabilidade do modelo político e econômico”.

O Governo começou a remodelar o modelo econômico – e a contenção da narrativa comunista – em 2011, com a elaboração das chamadas Diretrizes da Política Econômica e Social do VI Congresso do Partido Comunista de Cuba. Os 313 pontos do documento refletiam a ordem de Raúl Castro de iniciar uma guinada do sistema que permitisse dinamizar a raquítica economia cubana, dando maior espaço ao trabalho por conta própria e abrindo o país aos investimentos estrangeiros. O raulismo marcou uma mudança rumo a um maior pragmatismo em relação à linha imposta durante décadas por Fidel Castro, muito refratário à abertura ao mercado e aferrado até sua saída do poder (por doença) à narrativa marxista-leninista.

Um gabinete de continuidade

Cuba caminha rumo à era pós-Castro sob a égide da continuidade. O presidente Miguel Díaz-Canel, de 58 anos, nascido depois da revolução de 1959 e a quem Raúl Castro, 87, cedeu o cargo em abril, após prepará-lo durante anos como leal sucessor, formou um Conselho de Ministros que mantém os desígnios de seu mentor. A Assembleia deu sua aprovação neste sábado ao novo Gabinete, que conserva 20 dos 34 ministros do general. Castro permanecerá até 2021 como secretário-geral do PC cubano, máxima autoridade da ilha, acima do Executivo.

A principal novidade no Gabinete foi a nomeação de outro ministro da Economia, Alejandro Gil, até agora vice-ministro. Desde que assumiu o comando, em 2008, Raúl iniciou uma lenta adaptação do sistema socialista ao mercado e aos investimentos estrangeiros, que Díaz-Canel terá que acelerar se quiser tirar o país de sua perpétua situação de carestia e reverter os índices quase nulos de crescimento. Gil terá a missão de agitar o complicado coquetel de estatismo e liberação. Membro da nova geração da alta burocracia cubana, o novo ministro da Economia substitui um funcionário da velha guarda, Ricardo Cabrisas, 81, que será um dos quatro vice-presidentes do Conselho de Ministros – onde permanece Ramiro Valdés, 86, do núcleo duro histórico.

Quando assumiu a presidência, em abril, Díaz-Canel – um tecnocrata com reputação pró-abertura mas que há dois anos adotou um discurso cada vez mais rígido e conservador – deixou claro que seu norte era a “continuidade”, hoje conceito-chave do status quo cubano. Em sua equipe seguirão ao seu lado pesos-pesados do sistema, como o chanceler e cérebro das relações com os Estados Unidos Bruno Rodríguez, 60; Leopoldo Cintra, 77, militar do círculo mais próximo de Raúl Castro, como ministro das Forças Armadas; e o vice-almirante Julio Césa Gandarilla, 75, responsável pelo poderoso Ministério do Interior. Os Ministérios do Comércio e Investimentos Estrangeiros e do Turismo, duas pastas de especial relevância pela necessidade urgente de Cuba de atrair capital, continuarão nas mãos de Rodrigo Malmierca e Manuel Marrero. O Gabinete, com uma média de idade de 60 anos, é formado por 26 homens e oito mulheres.

Sinal verde para o casamento gay

O texto da nova Constituição abre a possibilidade de legalização do casamento homossexual em Cuba. Segundo afirmou na Assembleia Nacional Homero Costa, secretário do Conselho de Estado, o artigo 68 define o casamento como a união “entre duas pessoas (...) e não diz de qual sexo”. A atual Constituição, de 1976, só contempla a união matrimonial entre homem e mulher. A legalização do casamento homossexual é uma reivindicação cada vez mais imperiosa da comunidade LGBT cubana. É defendida por Mariela Castro, filha de Raúl e diretora do Centro Nacional de Educação Sexual de Cuba. Grupos evangélicos se manifestaram na ilha, nos últimos dias, ante a perspectiva da mudança legal.

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