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3.000 crianças no limbo de Trump

Caos administrativo atrasa cumprimento da ordem judicial para reagrupar crianças separadas de seus pais imigrantes pela política de tolerância zero

Pablo de Llano Neira

É um momento muito triste para os EUA. Dale Robertson, 64 anos, símbolo do Superman na viseira do boné, lamentava-se neste domingo na cidade fronteiriça de McAllen (Texas) pela crise decorrente da separação de milhares de pais imigrantes indocumentados de seus filhos menores de idade. Tinha ido a um centro religioso de ajuda a imigrantes para saber como poderia dar uma mão. Tinha em mente levar cachorros-quentes para animar os jogos da semifinal da Copa. É indecente o que fizeram com as crianças. Meu país não isso, protestou.

Imigrantes indocumentados em liberdade vigiada no Texas.
Imigrantes indocumentados em liberdade vigiada no Texas.REUTERS
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Enquanto isso, a administração dos EUA procurava com ímpeto alguma maneira de retificar a ofensa causada pela política trumpista de tolerância zero contra a imigração. A aplicação da diretriz de separar pais e filhos imigrantes e o posterior recuo do Governo diante da avalanche de críticas atirou a administração federal num turbilhão caótico na hora de reagrupá-los. Um juiz de San Diego ordenou que todos os menores de cinco anos estivessem com seus progenitores até esta terça, 10 de julho, quando o Departamento de Justiça informou que esse objetivo só poderia ser cumprido no caso de metade das aproximadamente cem crianças dessas idades que foram separadas das suas famílias em maio e junho. O juiz aceitou o pedido do Governo para prorrogar o prazo para essas crianças. A data limite para reagrupar os menores de idade que superam os cinco anos é 26 de julho. Segundo dados do Governo dos EUA, a cifra total de menores separados de seus pais está em torno dos 3.000.

Por todo o país, advogados voluntários trabalham para tentar acelerar as reagrupações, perplexos com a falta de transparência na situação, com os funcionários em alguns casos improvisando exames de DNA para confirmar a relação entre pais e filhos. Suponho que a polícia fronteiriça separou a famílias sem registrar suas relações. Os pais, como adultos, de um lado, e as crianças de outro, como se vinha fazendo com menores que chegavam sem companhia. Mas estas crianças chegaram em família. Acredito que seja um problema de desordem administrativa criada por uma ordem imprevista. Não estavam preparados para isso, não tinham um plano, diz por telefone, de San Antonio (Texas), o advogado Manoj Govindaiah, da ONG Raízes, que dá assistência gratuita aos migrantes.

O presidente deu a ordem de um dia para outro e se iniciou um processo de separação para o qual os diversos órgãos públicos envolvidos não estavam preparados. Criou-se do nada uma situação de emergência, afirma de Nova York o advogado José Xavier Orochena, que representa a guatemalteca Yeni González, separada de seus três filhos de 11, 9 e 6 anos, que permanecem com uma família de acolhida.

No caso dela, detalha, pudemos saber onde estavam seus filhos porque Yeni, ao ver que seriam separados, disse ao mais velho para decorar o telefone de um tio que está na Carolina do Norte. Se não, não sei como teríamos descoberto onde estavam. González estava presa num centro de detenção em Eloy (Arizona). Um grupo de mães norte-americanas que soube da sua situação reuniu os 7.500 dólares de sua fiança e organizou uma caravana para, revezando-se ao volante, levá-la em carro de lá até Nova York, a 4.000 quilômetros de distância.

A advogada Ofelia Calderón, no Estado da Virgínia, representa outra mãe detida em um centro do Texas, cujo nome mantém no anonimato. Tenta reuni-la à sua filha de cinco anos, que está com uma família de acolhida. No último mês pôde falar com ela por telefone cinco vezes. Diz que se frustra porque não é capaz de explicar à menina o que está acontecendo. A pequena só chora do outro lado da linha. Não entende nada. Não havia um plano por trás da política de tolerância zero. O único plano era castigar a imigração.

A médica Marsha Griffin, da Academia Americana de Pediatras, adverte a este jornal sobre os riscos desta situação para as crianças: As separações liberam uma carga de estresse à qual seus corpos em desenvolvimento não estão acostumados e que pode causar alterações em sua estrutura cerebral, com danos em longo prazo. E tudo isso por obra do Governo. É muito preocupante o trauma que está sendo causado a milhares de crianças.

O caos administrativo já gerou situações kafkianas. Em um tribunal de Phoenix (Arizona), um menino hondurenho de um ano, separado do pai na fronteira, foi apresentado na semana passada perante um juiz. Segundo a agência Associated Press, o magistrado fez constar que estava envergonhado pela cena.

"Não tenho medo de Trump. Tenho medo do meu país, Honduras"

P. DE LLANO, McAllen (Texas)

Na cidade de McAllen, na zona de maior intensidade migratória na fronteira dos EUA com o México, o fluxo de recém-chegados continua. No domingo, meia centena de imigrantes foram postos em liberdade vigiada – com um localizador eletrônico no tornozelo – na rodoviária. Muitos adultos estavam com seus filhos menores de idade. Miriam, uma hondurenha de 38 anos, segurava sua pequena Vanesa, de um ano. "Quando vinha pelo México, vi na televisão a questão das separações das crianças, mas decidi continuar até aqui", disse. "Não tenho medo de Trump. Tenho medo do meu país."

Uma mãe guatemalteca que preferiu manter o anonimato, acompanhada de Álex, uma voluntária que voou de Los Angeles para ajudar os imigrantes em um refúgio de McAllen, esperava minutos antes o ônibus que a levaria com seu menino de quatro anos a outra cidade dos EUA, onde um familiar a aguarda. "Minha situação não é boa. Uso esta tornozeleira e não tenho permissão para trabalhar, mas vou pedir asilo", disse, acrescentando que seu marido, que segundo ela não tinha reconhecido o menino ao nascer, a ameaçou de morte em seu país se não lhe entregasse a criança. "Se me mandarem para lá, sei que ele vai tentar."

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