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As referências de ‘This is America’, o canto antirracista de Childish Gambino

O vídeo do ator e cantor Donald Glover supera 32 milhões de visualizações dois dias após estreia e abre debate sobre mensagens subliminares

Trecho do vídeo ‘This is America’, de Childish Gambino.
Trecho do vídeo ‘This is America’, de Childish Gambino.
Héctor Llanos Martínez

O que Donald Glover está fazendo em seu último vídeo musical? O ator e roteirista, que também grava discos sob o pseudônimo de Childish Gambino, acumulou 33 milhões de visitas no YouTube nas primeiras 48 horas de publicação de This is America. Os estranhos movimentos que se encadeiam nesta gravação de pouco mais de quatro minutos têm uma mensagem específica: compilar um bom número de referências à discriminação racial nos Estados Unidos.

Desde a divulgação do vídeo, na noite de sábado, 5 de maio, vários usuários do Twitter apontaram alguns dos simbolismos que Glover inclui nos planos sequência que compõem o clipe, sobretudo em referência à violência policial e ao racismo nos EUA.

O homem negro que aspira a ser branco

Um violão e uma cadeira dentro de um galpão estão no centro da primeira imagem do vídeo. Em poucos segundos, um homem negro se senta para tocar violão enquanto a figura de Glover aparece ao fundo da imagem.

O músico dança em primeiro plano e faz um gesto estranho com o olho direito, em referência a Tio Ruckus. Este personagem de ficção, o antagonista da história em quadrinhos The Boondocks, é um homem negro que acredita ser branco e que mostra tendências racistas.

As leis que fundamentam a segregação

O homem do violão, o artista Calvin the Second, aparece encapuzado e Donald Glover lhe dá um tiro na nuca enquanto assume uma posição muito peculiar. Com ela imita Jim Crow, outro personagem de ficção muito arraigado na cultura popular norte-americana.

No século XIX, o ator branco Thomas Dartmouth criou um espetáculo blackface no qual cantava e dançava com o rosto pintado de preto, interpretando um escravo negro que possuía todos os estereótipos negativos relacionados com a comunidade negra.

O vaudeville de Darmouth teve tanto sucesso que Jim Crow passou a ser uma forma depreciativa de se referir a um cidadão afro-americano. Embora hoje possa parecer inacreditável, o termo pejorativo também deu nome a um conjunto de leis norte-americanas que promoveram a segregação racial nos Estados Unidos até 1965.

Bailarinos africanos

Depois de entregar a arma a um adolescente, que a pega com o cuidado de quem tem entre as mãos uma joia, Glover dança com um grupo de estudantes negros a Gwara Gwara, uma dança sul-africana que Rihanna popularizou na cerimônia do Grammy em janeiro de 2018.

Massacre de Charleston

Um coral gospel se incorpora à melodia trap de This is America. O ator e músico dispara em todos os seus membros com uma metralhadora, estabelecendo um paralelismo com o massacre de Charleston, na qual Dylann Roof, um branco na faixa dos 20 anos, matou nove pessoas em uma igreja afro-americana dos Estados Unidos em junho de 2015.

Richard Pryor, o pioneiro

A partir desse momento, no galpão onde o vídeo transcorre se inicia uma revolta popular com presença policial. Glover continua dançando e pisca para Richard Pryor, que incluiu durante décadas temas como o racismo e a violência em seus irreverentes monólogos de humor.

A morte de Stephon Clark pela polícia

Os estudantes aparecem como testemunhas do enfrentamento entre manifestantes e a polícia, gravando o que ocorre com seus telefones celulares. This is a celly / That's a tool (Isto é um celular; esta é uma ferramenta), diz nesse momento a letra da canção.

Stephon Clark levou sete tiros da polícia em março de 2018. Os agentes buscavam um suspeito de quebrar vidros de carros. Clark estava no quintal traseiro de sua casa falando por telefone e a polícia confundiu o aparelho com uma arma, disparando contra ele. Ele era negro. O assassinato de Clark pela polícia desatou uma série de novos protestos no país, ainda fortemente marcado pela segregação racial.

O cavaleiro branco do Apocalipse

Ao fundo da cena, um homem com o rosto coberto com um lenço monta em um cavalo branco. No Novo Testamento da Bíblia, o cavalo branco de um dos quatro cavaleiros do Apocalipse representa a morte e a vitória por meio do confronto violento.

A canção estreou no sábado, no programa Saturday Night Live, em que Glover era o apresentador convidado, com uma participação ao vivo que inclui algumas dessas referências.

Os criadores do vídeo

Donald Glover se destacou primeiro como roteirista da série de Tina Fey 30 Rock, onde também aparecia como ator. Foi um dos protagonistas de uma sitcom cultuada, Community, e se consolidou na televisão com Atlanta, que também escreveu.

No cinema acaba de aparecer em Homem-Aranha: De Volta ao Lar e interpreta a Lando Calrissian, um conhecido personagem de Star Wars, no filme sobre Han Solo. Lançou três discos como Childish Gambino e ganhou um Grammy por melhor interpretação de R&B tradicional.

O japonês Hiro Murai dirige o vídeo de This is America. Dirige com Glover alguns dos capítulos da série Atlanta e não é a primeira vez que roda um vídeo musical focado na cultura afro-americana nos Estados Unidos.

Em 2016 gravou Black Man in a White World (Homem negro em um mundo branco) de Michael Kiwanuka, que, com Glover e Aloe Blacc, é uma das grandes vozes negras do momento.

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