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STF restringe foro de parlamentares, mas não se manifesta sobre outras 54.400 autoridades

Em decisão unânime, Supremo entendeu que deputados e senadores só podem ser julgados por delitos cometidos durante o mandato ou em função dele

O plenário do Supremo nesta quarta-feira.
O plenário do Supremo nesta quarta-feira.Carlos Moura (SCO/STF)

O Supremo Tribunal Federal decidiu nesta quinta-feira restringir a prerrogativa de foro privilegiado aos 594 deputados federais e senadores brasileiros. A decisão, tomada por unanimidade, excluiu outras 54.400 autoridades que têm a prerrogativa de serem julgadas por tribunais, ao invés de terem seus casos analisados em primeira instância. Os ministros decidiram sobre um processo envolvendo um ex-deputado federal do Rio de Janeiro e, por essa razão, entenderam que não era o momento de se debruçar sobre os privilegiados que não são congressistas.

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Entre os que ainda permanecem com foro privilegiado nas esferas estadual ou federal estão presidente e vice-presidente da República, ministros de Estado, juízes, membros do Ministério Público, deputados estaduais, governadores, prefeitos, comandantes das Forças Armadas, entre outros.

Apesar de não estar oficialmente em debate, a ampliação da restrição do foro foi discutida intensamente entre os magistrados nas últimas duas sessões do plenário, na quarta e na quinta-feira. “Não dá para fazer distinção. Por que parlamentar não terá mais foro, mas promotor de Justiça que fez concurso público terá? Se isso valerá para deputado, valerá para juízes e comandante do Exército?”, questionou o ministro Gilmar Mendes o último a votar.

Em maio do ano passado, os senadores aprovaram uma proposta de emenda constitucional (PEC) que reduzia a prerrogativa de foro apenas ao presidente e vice-presidente da República, aos presidentes do Supremo Tribunal Federal, do Senado e da Câmara dos Deputados. Todos os demais, em caso de cometimento de crimes, seriam julgados por um juiz de primeira instância. A PEC não foi analisada pelos deputados e não a será neste ano porque, com a intervenção federal do Rio de Janeiro, nenhuma alteração constitucional pode ser feita. “Talvez provocado por nós, o Congresso aprovou uma tábua rasa de todas as considerações feitas na Constituição de 1988”, criticou o ministro Ricardo Lewandovski.

A decisão desagradou até deputados que defendem o fim do foro privilegiado, como Daniel Vilela (MDB-GO), presidente da Comissão de Constituição e Justiça. “Tem que ser para todo mundo. Senão, faremos uma carta para os privilegiados. E a ideia é justamente o contrário”, reclamou.

Independentemente das críticas dos magistrados e de parte dos legisladores, a partir de agora os parlamentares só responderão aos crimes no STF caso tenham cometido o delito durante o mandato. Por exemplo, se um deputado empossado em 2019 estiver sendo processado por estelionato cometido em 2018, enquanto ainda não era parlamentar, ele será julgado no primeiro grau.

Apesar de os ministros terem sido unânimes nessa restrição do foro, houve divergências sobre um trecho do relatório do ministro Luís Roberto Barroso. O relator entendeu que os deputados federais e senadores só poderão responder a processos no Supremo caso tenham cometidos delitos relacionados à função. Esta tese prevaleceu pela votação de 6 a 5. Um caso hipotético: um congressista pode ser julgado no STF caso tenha recebido propina para aprovar um projeto de lei. No caso de cometer delitos considerados “comuns”, como o de ter se envolvido em um acidente de trânsito, responderá na primeira instância. Até a data do julgamento, todos os delitos envolvendo deputados e senadores eram julgados na Corte suprema.

“Lenda urbana”

Um dos principais críticos desse trecho do relatório de Barroso foi o ministro Dias Toffoli. Ele refutou a tese de que a prerrogativa de foro seja um benefício aos legisladores. “Não se trata, ao meu ver, uma questão de privilégio. Pelo contrário. Os que detêm a prerrogativa tem diminuídos as instâncias recursais e a redução da possibilidade de prescrição, já que o trânsito em julgado cabe ao Supremo”.

Em seu voto, Toffoli quis acabar com o que ele chamou de “lenda urbana”, que é o senso comum de que o Judiciário era conivente com o crime de corrupção. Segundo ele, apenas em 2001, após uma mudança legislativa, o STF teve condições de julgar diretamente os deputados e senadores. Antes, para qualquer processo tramitar na Corte era necessária a aprovação dos próprios legisladores, algo que jamais ocorrera.

Um levantamento feito junto ao STF mostra que entre 2002 e abril de 2018, entraram na casa 661 ações penais contra políticos. Em uma pesquisa menos ampla, que analisou o período entre 2006 e 2016, uma equipe do projeto Supremo em Números, da Fundação Getúlio Vargas, constatou que 95% dos casos envolvendo esses políticos com foro poderiam ser julgados em primeira instância, se a regra aprovada nesta quinta-feira já estivesse em vigor.

A mesma pesquisa da FGV concluiu também que, caso os processos desses políticos tramitassem em primeira instância, sua conclusão seria mais célere e as chances de prescrição dos crimes seriam menores. Em média, uma denúncia é analisada pelo STF em 591 dias, quando na primeira instância o prazo é de uma semana.

Ainda que o foro tenha sido restringido, nenhum dos casos que hoje tramitam no judiciário seguirá automaticamente para o juiz de primeiro grau. Cada processo será analisado individualmente.

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