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Venezuela dá 72 horas para que embaixador da Espanha deixe o país

Diplomata Jesús Silva Fernández recebeu durante a noite o comunicado oficial em que o regime chavista lhe declara ‘persona non grata’

O embaixador espanhol na Venezuela, Jesús Silva (direita), com o presidente da Assembleia Nacional, Julio Borges.
O embaixador espanhol na Venezuela, Jesús Silva (direita), com o presidente da Assembleia Nacional, Julio Borges.JUAN BARRETO (AFP)
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O Governo da Venezuela deu oficialmente um prazo de 72 horas para que o embaixador espanhol em Caracas deixe o país. Jesús Silva Fernández recebeu na noite desta quinta-feira um comunicado oficial em que é declarado persona non grata e informado sobre a expulsão, segundo fontes do Ministério de Relações Exteriores da Espanha. A decisão do Governo de Nicolás Maduro havia sido anunciada na quinta-feira pelo chanceler venezuelano, Jorge Arreaza, pelo Twitter.

A expulsão do diplomata ocorre dois dias depois de o Executivo venezuelano convocar seu embaixador em Madri, Mario Isea, para consultas relativas à “ingerência e agressão colonialista” do Governo espanhol – uma decisão anunciada também através do Twitter. Além disso, a Venezuela entregou uma “contundente” nota de protesto a diplomatas da União Europeia acreditados no país, em resposta a sanções do bloco europeu contra sete altos funcionários da nação sul-americana.

Caracas acusa a Espanha de ter articulado, junto a outros países, as sanções que a União Europeia impôs nesta segunda-feira a sete altos funcionários do Governo venezuelano, entre eles o ministro do Interior, Nëstor Reverol, o número dois do chavismo, Diosdado Cabello, e a presidenta do poder eleitoral, Tibisay Lucena. A UE os acusa de “menosprezarem a democracia e o Estado de direito”, de cometerem “graves violações dos direitos humanos” e de restringirem as competências do Parlamento de maioria opositora, desmantelado pela nova Assembleia Constituinte.

O presidente venezuelano atribuiu abertamente a crescente pressão internacional ao Governo espanhol, o que Maduro qualificou com um insulto. “A elite, a oligarquia racista, colonialista, que governa a Espanha (...), o Governo mais corrupto que já se conheceu na história da Espanha é presidido por Mariano Rajoy”, afirmou. E ainda provocou: “Fique de quatro, compadre, que este povo vai te dar uma surra.”

No comunicado do chanceler da Venezuela, Jorge Arreaza, o Governo do país expressa “sua rejeição categórica” às declarações feitas por Mariano Rajoy em 24 de janeiro sobre “as medidas restritivas, contrárias aos mais elementares princípios do Direito Internacional, que a UE aplicou de maneira errática e unilateral contra altos funcionários e chefes de poderes públicos venezuelanos.”

Caracas acusa Rajoy de ter recebido “instruções infames” do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, durante o encontro de ambos em 26 de setembro passado em Washington, para desse modo “se submeter aos seus desígnios com respeito à Venezuela, comprometendo-se a assumir a liderança da conspiração na Europa”.

Em Davos, onde participava da reunião anual do Fórum Econômico Mundial, o chanceler espanhol, Alfonso Dastis, afirmou que seu país responderá “com proporcionalidade e reciprocidade” à decisão da Venezuela e rejeitou as acusações de “ingerência”. Dastis salientou ainda que desde o começo da crise o único interesse de Madri é “ajudar no processo” de diálogo entre o Governo de Nicolás Maduro e a oposição.

Maduro há meses avança numa direção que isola o país – atingido por uma duríssima crise econômica e uma gestão nefasta – ante a comunidade internacional. O chavismo, que convocou eleições presidenciais para antes de 30 de abril, aproveitando a fraqueza da oposição em relação ao regime, recorre constantemente à retórica do inimigo externo para tentar justificar seus rumos e poder culpar, assim, os Governos que criticam a situação atravessada pela Venezuela.

A nota do Ministério das Relações Exteriores venezuelano define assim a situação da Espanha: “Lamentavelmente, o Reino da Espanha é um dos países mais desiguais da Europa: são incontáveis os despejos diários, que negam o direito de moradia a dezenas de milhares de famílias humildes, para favorecer os bancos e as empresas imobiliárias; possui as taxas de desemprego mais alarmantes da Europa, entre as mais altas do mundo, especialmente no que se refere ao emprego juvenil, o que se traduz em desesperança para as novas gerações espanholas; foram descobertos escandalosos casos de corrupção de membros do partido governista, incluindo bonificações e benefícios descarados acordados pelas costas dos cidadãos.”

A nota de expulsão do embaixador afirma também que “foi mundialmente difundido o uso da repressão policial para sequestrar o direito de decidir do povo da Catalunha [sic], assim como a judicialização da política para perseguir e prender os que pensam diferente da posição oficial, fechando qualquer opção de diálogo civilizada com seus adversários; sem falar do desmoronamento estrutural dos serviços de saúde e seguridade social.”

Pelo contrário, acrescenta, “a Venezuela não tem que sofrer as sequelas de tais políticas de Estado”, já que “o presidente Nicolás Maduro ampliou os investimentos sociais”. Segundo essa singular visão do país, na Venezuela o direito à moradia não tem “comparação no mundo”, a educação e a saúde são “direitos universais”, a taxa de desemprego registra “mínimos históricos”, combate-se a corrupção com eficácia e “o direito de decidir é exercido constantemente, sem obstáculos, com altos níveis de participação, mediante um seguro e transparente sistema eleitoral automatizado”.

A Venezuela e a Espanha têm mantido tensas relações desde que a autodenominada Revolução Bolivariana tomou o poder em 1999, sobretudo durante as gestões dos presidentes de Governo José María Aznar e Mariano Rajoy, ambos do Partido Popular. Ciclicamente, são gerados incidentes que motivam trocas de acusações e, às vezes, a chamada de seus respectivos embaixadores. O presidente Rajoy defendeu a posição europeia de rechaço à Assembleia Constituinte da situação, que em 30 de julho passado desmantelou o Parlamento de maioria opositora, eleito em dezembro de 2015.

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