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Apoio à democracia na América Latina cai pelo quinto ano consecutivo, de acordo com o Latinobarômetro

Crescimento econômico não compensa desconfiança regional na política; apoio no Brasil é de 43%

Federico Rivas Molina
Um protesto contra o presidente Michel Temer, na última quarta-feira, em São Paulo
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Os latino-americanos estão cada vez menos satisfeitos com a saúde de suas democracias e, o que é pior, também acreditam menos nela como a melhor forma de governo. De acordo com o último Latinobarômetro, uma prestigiosa pesquisa regional que analisa 20.000 entrevistas realizadas em 18 países, o apoio caiu de 54% em 2016 para 53% este ano, a quinta queda consecutiva desde 2010, quando atingiu um pico de 61%. O relatório conclui que o declínio da democracia é lento e invisível “como o diabetes”. “Existem países que não são doentes terminais, mas sofrem de um diabetes democrático generalizado. Você não vê o mal, não há sintomas que chamem a atenção; mas se você não o tratar, acabará te matando”, diz a chilena Marta Lagos, diretora do Latinobarômetro, durante a apresentação do relatório na sede do BID em Buenos Aires.

Este ano, a pesquisa foi atrasada pela crise na Venezuela. Lagos comemora a oportunidade de analisar um país “quando está com febre alta”, mas advertiu que a situação em Caracas “fez muito mal para a região pelos problemas que esconde em outros países”. “Desde 2010, o apoio à democracia caiu oito pontos em média e os indiferentes aumentaram de 23% para 25% em apenas um ano. As pessoas se afastam dos governos e das ideologias. Também vemos uma enorme variação regional, porque temos 18 países, não uma região homogênea”, diz Lagos.

Entre os cidadãos que menos apoiam a democracia como sistema de governo estão os brasileiros (43%) e os mexicanos (38%). No topo da lista, mas positivamente, estão os venezuelanos, com 78% de apoio. Como se explica isso? “Entendemos que é uma questão de aspiração. Os venezuelanos estão em crise, mas defendem a democracia como a melhor opção”, explica Lagos. Quando se trata de avaliar a saúde do sistema atual, os números se invertem: apenas 22% dos venezuelanos se declaram “muito satisfeitos” ou “satisfeitos” com a situação política e social. A curva de satisfação dos venezuelanos não parou de cair desde 2010, quando atingiu 57% de opiniões positivas, mas, apesar do que se possa acreditar, a Venezuela é mais otimista do que o Brasil e o México. Este ano, apenas 13% dos brasileiros se declararam satisfeitos, alinhados com os mexicanos, que mal alcançaram 18%.

Somente em três países as pessoas estão satisfeitas com a democracia: Uruguai (57%), Nicarágua (52%) e Equador (51%). A Argentina é a quinta depois da Costa Rica, com 38%. Mas “vistos em conjunto, os indicadores revelam a deterioração sistemática e crescente das democracias da região. Os governos sofrem a mesma sorte, a cada ano os latino-americanos os aprovam menos. O que hoje é a média, antes era o mínimo. Não há indicadores de consolidação, mas indicadores de desconsolidação”, adverte o estudo. A desconfiança no governo atinge 92% dos brasileiros e 85% dos mexicanos.

O relatório destaca um cenário que pode parecer contraditório à primeira vista: a queda dos indicadores políticos e sociais coincide com um aumento generalizado dos econômicos. Cerca de 54% dos latino-americanos disseram aos pesquisadores do Latinobarômetro que seu dinheiro é suficiente para chegar ao fim do mês, dois pontos a mais do que em 2016. No topo estão os brasileiros, com 68% e, no último lugar, os venezuelanos, com 21%. A conclusão do estudo é que existe “uma dissociação entre dois mundos, o mundo da economia e o mundo do poder político”. “A economia vai bem para um lado e a democracia para outro. Não há relação entre elas, porque, embora metade da população tenha se beneficiado, a outra metade está apenas assistindo. A região é bipolar: há sucesso econômico e pobreza, o aspecto econômico avança e os valores despencam”, diz Lagos, para quem hoje, mais do que nunca, “a democracia não tem nada a ver com a economia”.

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