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O epicentro do desastre no terremoto do México

Roma e Condesa, dois dos bairros mais antigos e povoados da capital, sofrem os piores efeitos do sismo

Jacobo García
Voluntários fazem busca em um edifício que desmoronou no bairro de Roma.
Voluntários fazem busca em um edifício que desmoronou no bairro de Roma.Eduardo Verdugo (AP)

De um lado para o outro, feito gelatina. De repente, todos os veículos começaram a saltar, as árvores se agitaram, e os postes ficaram tão retorcidos que os cabos se soltaram como chicotes.

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Entre todos os bairros que ocupam a área do antigo lago de Tenochitlán, Roma e Condesa são os mais pantanosos, razão pela qual acabaram sendo os mais afetados pelo terremoto que sacudiu o México nesta terça-feira. Exatamente 32 anos antes, no grande sismo de 1985, esses dois bairros já haviam se transformado em um gigantesco necrotério a céu aberto. Nesta terça, sensações parecidas percorreram os corpos de veteranos e recém-chegados.

Mas, diante da sensação provocada por um tremor de magnitude 7,1 não importa a história nem a localização do epicentro. "Foi sentido como sendo o pior", conta um sobrevivente de todos os anteriores. Eram cerca de 13h20 (15h20 em Brasília) de um dia ensolarado quando a terra começou a se mexer de um lado para o outro na Cidade do México. Em poucos segundos, olhares para confirmar as sensações, e gritos que não se sabia de onde vinham nem sobre o que alertavam.

Os vitrais da igreja de Fátima, na rua Chiapas, caíam como espadas sobre as calçadas, enquanto os transeuntes se refugiavam sob edifícios, dos quais também se desprendiam entulhos. Na rua Oaxaca, um edifício que ocupa meia quadra desabou sobre si mesmo. Na rua Jalapa, esquina com San Luis, também no bairro Roma, um edifício de cinco andares tremia feito uma vara de bambu, enquanto os vizinhos saíam com o pânico estampado nos rostos.

Cem segundos que foram cem horas e, depois da brutal agitação, o silêncio. Poeira no ambiente, cheiro de gás, sirenes soando. No final da rua, se ouviam os primeiros desmoronamentos.

Na rua Coahuila, um edifício parece um enorme V, caído sobre si mesmo; na rua Chihuahua, a torre de uma escola infantil veio abaixo, mas por sorte atingiu apenas o muro exterior. Àquela hora, com o local cheio de pais e crianças, a desgraça poderia ter sido enorme.

Um pouco adiante, na esquina das ruas Medellín e San Luis Potosí, os cinco andares de uma grande construção se amontoavam como um sanduíche, sem que até o momento se saiba o número de vítimas. Uma senhora em cadeira de rodas chora. "Tinha gente dentro", diz.

Em ambos os casos, não haviam transcorrido nem cinco minutos depois do terremoto e as pessoas já começavam a se organizar: um motorista parou o carro, com uma corda; uma pessoa isolava provisoriamente a área; outras procuravam crianças eventualmente retidas entre os escombros. Em caso de terremoto, os mexicanos trazem no DNA a necessidade de ajudar e de saber o que fazer.

As cenas heroicas também se sucedem. Centenas de pessoas começam a retirar ruidosamente os escombros, mas os tremores secundários paralisam a todos.

No meio do caos, repentinamente uma voz pede água, e dezenas de jovens carregam pesados garrafões para jogar sobre os escombros, na esperança de que o líquido escorra pelo entulho. Uma jovem faz uma lista dos medicamentos necessários e recita: "Água, álcool, derivados de penicilina...". Duas horas depois, presa a um poste de luz, se vê uma lista com nomes de sobreviventes. Hoje, como em 1985, a organização popular chega antes de qualquer serviço de emergência.

Do alto de uma montanha de entulhos, os bombeiros pedem silêncio aos voluntários para poderem escutar eventuais vozes sob os escombros.

Diante da catástrofe, os velhos usam o rádio, e os jovens olham o celular, cujo serviço vai e vem. Os primeiros conseguem cantar os dados antes de qualquer um: "Foi de [magnitude] 7,1, epicentro em Puebla, já são 42 mortos. Vinte edifícios danificados..." "Vinte edifícios danificados? Impossível, só no eixo Roma-Condesa tem muitos mais", respondem.

A rua Álvaro Obregón, geralmente um agitado coração de bares e locais de lazer, virou um hospital de campanha, onde os doentes em macas, atados a frascos de soro, esperavam o fim dos tremores secundários. Nesta terça o alarme sísmico, outras vezes eficaz, começou a soar quando a cidade de quase 20 milhões de habitantes já estava tremendo.

Dália Perlasca, de 38 anos, vive num terceiro andar da rua Puebla. "Começou a se mexer e fui para a porta, mas a casa ia de um lado para o outro e eu não conseguia colocar as chaves. Costumo fechá-la com várias trancas por razões de segurança, mas tudo balançava os lados e eu não conseguia pôr a chave, só repetia 'Vou morrer'", recorda "Não foi como outros [terremotos], que parecem uma dança, [desta vez] notou-se um impacto duro."

Sua vizinha, paralisada pelo pânico, rezava sob o batente porta em frente: "Jesus Cristo Redentor, nos dê luz e nos salve desta catástrofe...".

Dezenas de edifícios foram desocupados, e seus moradores foram proibidos de passarem a noite dentro deles. Por isso, pernoitariam ao relento, alguns vigiando os escombros de suas moradias, com medo de saques.

Diante de cada edifício derrubado e de cada desgraça há um velho que canta os dados que vai escutando pelo rádio: "Já são 100 mortos, 30 na Cidade do México, 50 em Puebla, 60 em Morelos...". O número nesta quarta já passava de 210.

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